
Uma pena quando uma boa idéia é desperdiçada em situações óbvias. Houve um tempo em que
ficção científica era uma forma também de se discutir questões humanas. Hoje, parece que tudo é apenas pretexto para muitas cenas de ação. É o caso de
Substitutos que até levanta algumas questões, mas as deixa no ar em nome de cenas diversas de
Bruce Willis correndo, atirando e detonando o mundo.
A história se passa em um futuro distante, quando os seres humanos não saem mais às ruas. Usam máquinas
andróides, os chamados
Substitutos, que parece os proteger de todos os males do mundo. O problema é quando um incidente em um beco, mata não apenas o substituto, como o original que estava aparentemente seguro em casa. É quando entra em cena o personagem de
Bruce Willis, um policial, que para variar tem problemas familiares, como a perda de um filho e a relação difícil com a esposa. E aquilo que poderia ser bastante interessante, se torna mais um roteiro clichê.

Nesse futuro fictício, não existem mais doenças, preconceitos e violência, mas tudo fica mais artificial. Este é um ponto que poderia ser bem explorado. Há várias simbologias aí, a começar pelo nosso mundo atual, onde as pessoas se comunicam cada vez mais pela tela de um computador e menos com relações pessoais. Quantas pessoas trabalham em uma mesma sala e conversam pelo MSN, por exemplo? Além disso, temos também uma relação ainda mais profunda ao perceber os
substitutos que usamos em nosso dia a dia, ao sair de casa com máscaras que não mostram nossa essência. Os substitutos são jovens e atléticos, nós nos maqueamos, usamos posturas joviais, atuamos em grupo e incorporamos idéias e estereótipos que muitas vezes não são os nossos, apenas para sermos aceitos.

O problema é que o roteiro de Michael Ferris e John D. Brancato não aprofunda isso. Há apenas um vislumbre na conversa de
Bruce Willis com a esposa, mas fica mais focado a questão da relação dos dois com o filho e desgaste do casamento. A trama acaba mesmo se centrando na ação, na perseguição a quem está com a tal arma que destrói susbstituto e original com apenas um disparo. E as cenas de ação acabam sendo boas, já que os substitutos podem fazer coisas sobre-humanas, com pulos incríveis e mais agilidade. A perseguição na comunidade
Rastafari também é um destaque, criando uma boa tensão. Mas, fica pouco, principalmente para um filme que começou tão bem, construindo a trajetória evolutiva da ciência a partir de notícias reais de nossa vida. Tudo começa com a busca pela cura de doenças. Passa pelo individualismo das guerras até chegar ao mundo totalmente virtual.

Outro momento interessante, é quando o personagem de
Bruce Willis perde seu susbstituto e tem que sair as ruas com seu corpo já desacostumado a sair do quarto. O primeiro sentido que sente é a audição, acostumada ao
silêncio, percebe cada ruído como se fosse um estrondo. A visão também desacostumada ao sol, fica irritada. E há o psicológico. A sensação de desproteção. Ele tem medo de se esbarrar, tocar nas coisas e pessoas. Isso demonstra o quanto estamos frágeis diante da
tecnologia. Quem hoje não se sente desprotegido se sai de casa sem o celular, por exemplo? Mas, não podemos também ser radicais no extremo oposto. A comunidade Rastafari do filme, por exemplo, a resistência local, não utiliza nenhum tipo de máquina. Andam de carroça, aram a terra com enxadas, e não possuem computadores. Não precisa chegar a tanto.
Utilizar a tecnologia ao nosso favor, sem nos tornar escravos dela. Esse é o ponto que ainda estamos longe de compreender por inteiro. Daria um ótimo filme, se fosse focado nisso. O problema de
Substitutos é lançar essas idéias sem desenvolvê-las, e concentrar na ação. Na eterna luta de bem contra o mal. Na briga física inútil. Na correria que nos deixa cada vez menos atentos ao que acontece internamente conosco.
Substitutos (Surrogates: 2009 / EUA)
Direção: Jonathan Mostow
Roteiro: Michael Ferris e John D. Brancato
Com: Bruce Willis, Radha Mitchell, Rosamund Pike, Boris Kodjoe.
Duração: 88 min