Após sofrer muito, Bella consegue realizar seu maior sonho: casar com Edward, apesar de continuar amando também Jacob. A cena dos dois dançando no jardim mostra bem isso. E, apesar do eterno triângulo, é impressionante como o lobo, forte, másculo e quente é preterido por um vampiro frio, sem graça e, pior, que representa a morte para a moça. Isso sempre em incomodou na Saga Crepúsculo. A torcida das adolescentes para que a protagonista morra e viva uma existência amaldiçoada como se fosse a coisa mais interessante do mundo. Acredito que nem ela acha isso, já que segue para o altar com um ar sofrido, que vai além do nervosismo próprio de uma noiva. Apesar do lamentável diálogo na ilha brasileira, a empregada local disse tudo ao chamar Edward de demônio. Ele é, de fato, amaldiçoado e irá amaldiçoar sua esposa de uma forma ou de outra.
É possível, no entanto, comprar a idéia de Bella e seu príncipe encantado, apesar de não conseguir compreender uma escolha tão masoquista. Mas, quem é que manda no coração? A escolha de perder a virgindade como um ser humano também é compreensível, apesar dos alertas, afinal, ela queria ter sensações humanas antes do inevitável. Mas, isso é apenas mais uma amostra do que falei. Tornar-se vampira é mesmo uma maldição. Já a escolha de manter uma gravidez que não se sabe nem ao certo o que será, assusta. Tudo bem, há o instinto materno e tal, mas como manter dentro de si uma espécie de monstro que vai te devorando aos poucos, te deixando completamente esquelética? É impressionante como Bella suporta todo e qualquer sofrimento sem questionar. Aliás, eu que sempre critiquei Kristen Stewart, devo dizer que ela me impressionou em alguns momentos desse filme, principalmente na parte final, onde é possível acreditar na dor de sua personagem. Nesse ponto não posso deixar de elogiar a maquiagem e computação gráfica que fizeram a atriz definhar aos nossos olhos. Já Robert Pattinson e, principalmente, Taylor Lautner, não conseguem convencer de quase nada.
Mas, o que realmente incomoda em Amanhecer é o tom repetitivo e arrastado do roteiro. Temos a eterna briga entre lobisomens e vampiros, com Bella no meio. Temos Bella sofrendo por Edward mesmo depois de casada, já que ele não quer continuar a consumar o casamento após a primeira noite. Temos Jacob revoltado com as escolhas da amada. Diante dessa enxurrada de repetições aparece um novo conceito da idéia de imprinting. E aqui está o maior problema do filme. Nos outros três, não há explicações para isso. Tudo bem que os lobos não são os protagonistas, mas era preciso uma preparação maior para um assunto tão importante. Porque ao final dessa primeira parte não há como conter a decepção e sensação de Deus ex-machina. Não por existir o imprinting, muito menos por como isso acontece, a cena é até bem orquestrada, mas a consequência disso faz cair por terra toda a tensão que foi sendo construída durante a projeção, nos dando mais uma sensação de perda de tempo e muito barulho por nada.
Devo alertar que as observações são diante do que vemos em tela. Pode ser que o livro explique isso de uma forma mais harmônica, pode ser que os fãs da Saga já estivessem preparados para o acontecimento e não percebam o quão mal colocado isso foi no filme. Mas, o fato é que precisamos analisar o que nos é passado ali. Um filme que precisa do suporte do livro para explicar situações tão básicas, não pode ser considerado uma boa adaptação. E na Saga Crepúsculo, isso parece acontecer diversas vezes, já que a cada crítica à história, um fã vem com o argumento de que no livro explica uma determinada coisa ou outra. Em Amanhecer nos sentimos sendo "cozinhados em banho-maria", para depois nos revelarem algo que precisaria estar explícito há muito tempo.
Mas, apesar de todos os furos do roteiro de Melissa Rosenberg, é preciso elogiar Bill Condon em alguns pontos. Ele consegue construir imagens muito boas, um suspense crescente com o cerco dos lobos à casa dos Cullen, e brilha no ato final, com o parto. A forma como ele é sutil em sua câmera nos passando a angústia exata da cena, sem ser explícito, e assim, não chocar o público é louvável. Há soluções simples que nos levam a resultados interessantes como o líquido ser bebido em copo de refrigerante com canudo. Vemos o sangue subindo, mas é tudo de uma forma bem limpa, por exemplo. Ouvimos o dente de Edward batendo, mas não vemos o que ele faz, apenas imaginamos. Sentimos o frenesi crescente, mas não é preciso dizer muita coisa. E a cena de Jacob também possui um ritmo bom, empolgante até a forma como se ajoelha diante do destino. Esses pontos positivos quase nos fazem perdoar coisas lamentáveis como aquela conversa dos lobos, ou toda a sequência no Brasil.
Aliás, ainda está mal explicada essa situação da viagem. Afinal, a noite em Amanhecer dura quantas horas? Mais uma vez não vale a explicação de que no livro teve isso ou aquilo. O que vemos em tela é Edward e Bella casando ao entardecer, a festa acontecendo, eles saindo para o aeroporto, chegando ao Brasil, passeando em algum bairro, pegando a lancha até a ilha e ainda dá tempo de tomarem banho de mar ao luar. Só o vôo dos Estados Unidos para o Brasil dá oito horas. Mas, não vamos ser chatos com esses detalhes. Só não entendi porque Edward não brilhou em nenhum momento na ilha, quando estava a sós com Bella em plena luz do dia. Por outro lado, gostei muito da metáfora do xadrez, que aliás é a capa original do último livro. A batalha psicológica do casal é muito bem representada por esse tabuleiro.
Amanhecer é daqueles filmes que se você não é fã da Saga vai sair odiando. O filme não tem ritmo, é lento, cansativo e com pouco sentido. A parte final dá uma virada interessante, mas tudo acaba desaguando em uma frustração com a forma como é resolvido. De qualquer forma, tem seus momentos e cria certa curiosidade em relação à parte final. Ah, e claro, a cena pós primeiros créditos ajuda a imaginar o que vem por aí, apesar de que o diálogo também não é dos melhores. Só nos resta aguardar 2012 para ver se o mundo não acaba e Stephenie Meyer consegue convencer os incrédulos de que sua trama tem mesmo sentido de existir.
Amanhecer - Parte 1 (The Twilight Saga: Breaking Dawn - Part 1: 2011 / EUA)
Direção: Bill Condon
Roteiro: Melissa Rosenberg
Com: Robert Pattinson, Kristen Stewart, Taylor Lautner, Dakota Fanning.
Duração: 117 min.