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Menos Que Nada
Menos Que Nada
Diretor experiente, Carlos Gerbase fugiu ao comum há muito tempo no cenário do cinema nacional. Seus filmes sempre abordam questões humanas, fantasias, mas sempre de uma maneira peculiar, sem estruturas clássicas, inclusive em sua comercialização. Não por acaso, Menos Que Nada acaba de estrear na internet, no cinema, na televisão e no DVD ao mesmo tempo. Menos Que Nada é um filme, no mínimo, digno de ser conhecido.
O foco principal da trama é a mente humana. Dante, o protagonista, está recluso em um hospital psiquiátrico há dez anos, esquecido pelos familiares e desenganado pelos médicos. Psicótico, apresenta quadro de delírio constante e não se comunica com ninguém. Seu cotidiano é bastante esquemático. Cava um buraco o dia inteiro, sem um objetivo claro. Em determinados momentos, realiza um ritual estranho com rugidos, simulação sexual, briga corporal e morte. Retornando depois de um tempo a cavar. O quadro instiga a residente Dra. Paula que irá investigar seu caso, tentando descobrir o que aconteceu e como poderá ajudá-lo.
O roteiro instiga, até porque o quadro construído para o protagonista não é impossível, principalmente depois de todas as explicações. Tudo se fecha de uma forma criativa e interessante, ainda que não tão surpreendente assim, já que o caminho nos faz tirar as conclusões quase óbvias. É interessante também ver que a construção dos personagens, não nos dá margem para muitos estereótipos, tendo até uma leve compreensão da linha que afirma ser a esquizofrenia algo genético. Basta prestar atenção no efeito escolhido por Gerbase para nos apresentar a confusão mental, na primeira cena com a mãe e depois em vários momentos com Dante.
Outra questão inteligente do roteiro é forma como a história nos vai sendo contada. A investigação da Dra. Paula, com suas entrevistas e gravações é uma solução criativa para expor os fatos ao espectador, sem que essa exposição saia da concepção dramática da trama. Fica orgânico, em um formato quase documental, do personagem falando diretamente para à câmera. Só que para a câmera da Dra. Paula e não de Carlos Gerbase. E assim tudo flui de uma maneira mais envolvente. Esse tom investigativo dá um ritmo próprio ao filme, não o tornando didático.
O mistério também instiga quando nos é apresentada a situação. A princípio são três pilares: o pai, a ex-professora e a amiga de infância. Depois surge o ponto-chave da pesquisadora arqueológica René, vivida por Rosanne Mulholland. Apesar do roteiro nos conduzir com elementos óbvios de manipulação, fazendo com que René nos pareça a vilã inconteste, há uma nuança no desenrolar que o torna interessante, mantendo a curiosidade e o jogo do que é ou não revelado. Mérito também para os atores que defendem em seus personagens, principalmente Felipe Kannenberg que nos dá um Dante incrivelmente real. Seu olhar nos dá medo de tão profundo. Ponto negativo apenas para Alexandre Vargas, como um caricato Ciro.
Mas, se o roteiro é bem elaborado e os atores fazem jus aos personagens bem construídos. A técnica que se apresenta empobrece a produção. Visivelmente por falta de verba, não por falta de talento, já que a câmera de Carlos Gerbase é bem cuidada, com planos e movimentos pensados, fotografia condizente com os estados das coisas e personagens, além de uma montagem correta. Mas, muitas composições de cena soam amadoras, como as expedições ou a cena da delegacia. Isso sem falar na lamentável cena onde uma computação gráfica malfeita assusta o espectador.
Ainda assim, Menos Que Nada consegue cumprir o seu papel de contar uma boa história. É competente ao trazer o drama psiquiátrico para discussão, seja pelo despreparo dos hospitais públicos ou pelo descaso dos envolvidos por uma descrença de possibilidade de cura. É honesto em seus questionamento e cria uma trama plausível para isso, mesmo que soe um pouco fantasiosa, ainda que pesquisas arqueológicas semelhantes existam de fato no Rio Grande do Sul. E é hábil em conduzir tudo isso pelo viés investigativo, pois, além de justificar a técnica quase documental, ainda envolve o espectador pela curiosidade natural de todo ser humano.
Um bom filme, com ótimas intenções, pouca verba e alguns deslizes.
Menos Que Nada (Menos Que Nada, 2012 / Brasil)
Direção: Carlos Gerbase
Roteiro: Carlos Gerbase
Com: Felipe Kannenberg, Rosanne Mulholland, Maria Manoella, Branca Messina
Duração: 105 min.
O foco principal da trama é a mente humana. Dante, o protagonista, está recluso em um hospital psiquiátrico há dez anos, esquecido pelos familiares e desenganado pelos médicos. Psicótico, apresenta quadro de delírio constante e não se comunica com ninguém. Seu cotidiano é bastante esquemático. Cava um buraco o dia inteiro, sem um objetivo claro. Em determinados momentos, realiza um ritual estranho com rugidos, simulação sexual, briga corporal e morte. Retornando depois de um tempo a cavar. O quadro instiga a residente Dra. Paula que irá investigar seu caso, tentando descobrir o que aconteceu e como poderá ajudá-lo.
O roteiro instiga, até porque o quadro construído para o protagonista não é impossível, principalmente depois de todas as explicações. Tudo se fecha de uma forma criativa e interessante, ainda que não tão surpreendente assim, já que o caminho nos faz tirar as conclusões quase óbvias. É interessante também ver que a construção dos personagens, não nos dá margem para muitos estereótipos, tendo até uma leve compreensão da linha que afirma ser a esquizofrenia algo genético. Basta prestar atenção no efeito escolhido por Gerbase para nos apresentar a confusão mental, na primeira cena com a mãe e depois em vários momentos com Dante.
Outra questão inteligente do roteiro é forma como a história nos vai sendo contada. A investigação da Dra. Paula, com suas entrevistas e gravações é uma solução criativa para expor os fatos ao espectador, sem que essa exposição saia da concepção dramática da trama. Fica orgânico, em um formato quase documental, do personagem falando diretamente para à câmera. Só que para a câmera da Dra. Paula e não de Carlos Gerbase. E assim tudo flui de uma maneira mais envolvente. Esse tom investigativo dá um ritmo próprio ao filme, não o tornando didático.
O mistério também instiga quando nos é apresentada a situação. A princípio são três pilares: o pai, a ex-professora e a amiga de infância. Depois surge o ponto-chave da pesquisadora arqueológica René, vivida por Rosanne Mulholland. Apesar do roteiro nos conduzir com elementos óbvios de manipulação, fazendo com que René nos pareça a vilã inconteste, há uma nuança no desenrolar que o torna interessante, mantendo a curiosidade e o jogo do que é ou não revelado. Mérito também para os atores que defendem em seus personagens, principalmente Felipe Kannenberg que nos dá um Dante incrivelmente real. Seu olhar nos dá medo de tão profundo. Ponto negativo apenas para Alexandre Vargas, como um caricato Ciro.
Mas, se o roteiro é bem elaborado e os atores fazem jus aos personagens bem construídos. A técnica que se apresenta empobrece a produção. Visivelmente por falta de verba, não por falta de talento, já que a câmera de Carlos Gerbase é bem cuidada, com planos e movimentos pensados, fotografia condizente com os estados das coisas e personagens, além de uma montagem correta. Mas, muitas composições de cena soam amadoras, como as expedições ou a cena da delegacia. Isso sem falar na lamentável cena onde uma computação gráfica malfeita assusta o espectador.
Ainda assim, Menos Que Nada consegue cumprir o seu papel de contar uma boa história. É competente ao trazer o drama psiquiátrico para discussão, seja pelo despreparo dos hospitais públicos ou pelo descaso dos envolvidos por uma descrença de possibilidade de cura. É honesto em seus questionamento e cria uma trama plausível para isso, mesmo que soe um pouco fantasiosa, ainda que pesquisas arqueológicas semelhantes existam de fato no Rio Grande do Sul. E é hábil em conduzir tudo isso pelo viés investigativo, pois, além de justificar a técnica quase documental, ainda envolve o espectador pela curiosidade natural de todo ser humano.
Um bom filme, com ótimas intenções, pouca verba e alguns deslizes.
Menos Que Nada (Menos Que Nada, 2012 / Brasil)
Direção: Carlos Gerbase
Roteiro: Carlos Gerbase
Com: Felipe Kannenberg, Rosanne Mulholland, Maria Manoella, Branca Messina
Duração: 105 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Menos Que Nada
2012-07-23T08:00:00-03:00
Amanda Aouad
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