Inspirado na peça "La Ronde”de Arthur Schnitzler, o novo filme de Fernando Meirelles mostra pessoas espalhadas por diversas partes do mundo que estão diante de escolhas de vida. Temos a moça que decide começar a se prostituir, o empresário que viaja muito e "precisa" de prostitutas. A mulher casada que tem um caso com um fotógrafo mais jovem. A moça que cansou de viver uma sub-vida em Londres e quer voltar para sua terra. O senhor que não cansa de procurar a filha sumida. O muçulmano apaixonado pela funcionária casada. Outra mulher casada que cansa das relações profissionais erradas do marido.
Vidas que circulam em nossa tela de maneira orgânica, pelo bom texto de Peter Morgan, pela criativa montagem de Daniel Rezende e pelas, claro, escolhas de Fernando Meirelles. Não é simplesmente mais um filme com várias historinhas que se cruzam em determinado momento. Apesar de picotadas nas diversas tramas e personagens, há uma unidade fílmica maior, que nos conduz nessas escolhas diversas. A forma como nossa atenção passa de um núcleo para outro é muito orgânica, a começar pela passagem da prostituta no bar, para o empresário.
É tudo construído de uma maneira única. Mesmo as já bastante usadas divisões de tela, aqui ganham o novo frescor ao continuar as ações de uma maneira planejada, às vezes com três, outras com quatro situações paralelas. Há também as inserções como o avião que "passeia" pelo consultório da terapeuta. Ou o carro que dá um zoom out e nos vemos dentro do ônibus com outros personagens. Isso sem falar de momentos mágicos como todos os personagens desligando o abajur de seus quartos, no ritmo da música.
Interessante também como o roteiro nos conduz à construção clássica de apresentação de personagens, complicações, tensões altas, clímax e resolução sem uma unidade de ação aparente. Afinal, quem é o protagonista de 360? Poderíamos pensar que o protagonista seria as escolhas humanas e o antagonista, o destino. O que Fernando Meirelles conduz em tela é um grande balé da vida. E de uma maneira hábil que nos faz imergir em todas as tramas e realmente pensá-las como uma só. Talvez por isso, alguns personagens simplesmente vão ficando pelo caminho.
Nisso, temos o mérito também do elenco reunido pelo diretor. Destaque para o incrível Anthony Hopkins que emociona em tela. Porém, cada ator consegue dar o melhor de si para o seu personagem. Não há brigas de egos ou necessidades de quem aparece mais. Pelo menos, não que transpareça em tela. Impossível não falar da participação dos brasileiros, ambos com bom destaque, principalmente Maria Flor que é um dos pilares das tramas e protagoniza uma das cenas mais tensas do filme, se saindo muito bem. Juliano Cazarré acaba mantendo o estereótipo de garotão objeto sexual, mas também se sai bem.
O texto chama ainda atenção pelas mensagens subliminares, pelo jogo de camadas que nos envolve de maneira inteligente. As cenas de Maria Flor e Ben Foster, por exemplo, possuem diálogos primorosos, com uma ironia dramática incrível, já que sabemos a verdade sobre o personagem de Foster, coisa que a personagem de Maria Flor nem sonha. Já o diálogo entre a personagem de Gabriela Marcinkova, a irmã da prostituta, e o personagem de Vladimir Vdovichenkov, apesar de quase inverossímil, tem também nuanças naturais interessantes (- Que tipo de negócios? - Negócios). Isso sem falar na frase de efeito curiosa "livros são para pobres sonhadores".
360 é, então, um passeio pelo mundo, pelas mentes das pessoas, por vidas que estão em cheque, por escolhas. Conquista por essa simplicidade de histórias, sem grandes acontecimentos, mas que são muito bem conduzidas. Principalmente, pela busca pela unidade, através da direção precisa com uma ótima montagem e um belo roteiro.
360 (360, 2012 / EUA)
Direção: Fernando Meirelles
Roteiro: Peter Morgan
Com: Rachel Weisz, Jude Law, Anthony Hopkins, Maria Flor, Juliano Cazarré, Lucia Siposová e Gabriela Marcinkova
Duração: 110 min.