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Marcelo Lordello
Maria Luiza Tavares
Eles Voltam
Eles Voltam
Um dos vencedores do Festival de Brasília deste ano, Eles Voltam é um filme de espera e encontros inesperados. Já começa de uma forma instigante com dois irmãos sendo deixados em uma estrada e poucas explicações. Aos poucos, vamos conhecendo partes daquela história ao acompanhar Cris, a garotinha de apenas doze anos que tem que encontrar uma forma de voltar para casa.
Bastante sensorial, os quinze primeiros minutos nos transportam para aquela estrada, os dois irmãos, um iPhone, carros passando. A sensação de desespero. A fotografia bem trabalhada, em determinado momento, a profundidade de campo baixíssima destaca apenas o rosto da garota, quase como um presságio do que está para acontecer. Seu irmão sai em busca de um posto de gasolina, deixando-a ali, sozinha, o dia inteiro. Ela grava o por do sol e tudo fica escuro. A construção de seu choro em pleno breu e as luzes dos poucos carros que passam nos fazendo vê-la ali encolhida é muito bem feito.
Ao amanhecer, Cris percebe que está mesmo só e começa sua jornada de volta para casa em uma construção bem próxima da jornada do herói. Ela terá mentores, aliados, opositores e desafios que a farão ir em busca de sua própria essência. Cada passo é um aprendizado, uma descoberta, uma superação. Interessante como o diretor Marcelo Lordello brinca com nossos próprios medos, preconceitos e referências a cada passo da garota. Desde o rapaz na bicicleta, passando pelo próprio MST, a dona Fátima, a polícia e a vizinha. Situação que vemos até em um comentário posterior “a gente não sabe se ela disse tudo o que aconteceu”.
A angústia inicial do porquê aqueles dois foram deixados na estrada, vai se modificando para o como essa menina vai conseguir sobreviver. E tudo em uma construção bastante realista. Os diálogos que ela trava com cada pessoa que encontra são muito naturais, verossímeis. Isso é um dos pontos mais positivos do roteiro. Não há fala onde não deve ter, não há explicações desnecessárias para os personagens. Eles falam, não o diretor por sua boca, ou mesmo a nossa necessidade de explicações que eles não tem.
O silêncio é explorado de uma maneira muito perspicaz. Como na cena em que o garoto e a mãe observam Cris comendo. É possível se sentir dentro daquela cena. Compreender os limites da curiosidade e da generosidade. O trabalho da atriz mirim Maria Luiza Tavares é digno de palmas. Ela parece um bichinho acuado, totalmente lacônica, nos dando uma angústia crescente e nos tornando próximos a ela de uma maneira ímpar. Os três atores da família MST também nos dão uma naturalidade incrível. O que não acontece tanto com a a família de Fátima, que em alguns momentos nos dá a impressão de cenas armadas.
Mesmo assim, essa família também traz momentos interessantes como a crítica irônica às telenovelas e seus resumos. Ou na conversa na beira da piscina entre Cris e a menina que fala de sua vida, a partir de coisas simples como uma calça jeans. São nesses pequenos encontros que o filme ganha força, até por isso, a parte final cai um pouco. É possível compreender a intenção de Lordello no caminho de volta, na transformação da personagem, mas, tudo se alonga muito, seria melhor não mostrar tantas coisas.
Ainda assim, há o mérito da não explicação em excesso. Há coisas que não precisamos saber, fica em nossa interpretação, por isso, apesar de uma passagem que perde o ritmo, a retomada da cena final é o fecho perfeito. Uma espécie de retorno cíclico e transformado. Um sinal real de aprendizado. Tudo o que precisávamos saber para continuar a história dentro de nós, fazendo de Eles Voltam uma bela viagem interior, onde podemos também rever nossos valores.
Filme visto na 8ª Mostra de Cinema de Vitória da Conquista.
Eles Voltam (Eles Voltam, 2011)
Direção: Marcelo Lordello
Roteiro: Marcelo Lordello
Com: Maria Luiza Tavares, Georgio Kokkosi, Elayne de Moura, Mauricéia Conceição, Jéssica Silva, Irma Brown, Clara Oliveira, Germano Haiut e Teresa Costa Rêgo
Duração: 100 min.
Bastante sensorial, os quinze primeiros minutos nos transportam para aquela estrada, os dois irmãos, um iPhone, carros passando. A sensação de desespero. A fotografia bem trabalhada, em determinado momento, a profundidade de campo baixíssima destaca apenas o rosto da garota, quase como um presságio do que está para acontecer. Seu irmão sai em busca de um posto de gasolina, deixando-a ali, sozinha, o dia inteiro. Ela grava o por do sol e tudo fica escuro. A construção de seu choro em pleno breu e as luzes dos poucos carros que passam nos fazendo vê-la ali encolhida é muito bem feito.
Ao amanhecer, Cris percebe que está mesmo só e começa sua jornada de volta para casa em uma construção bem próxima da jornada do herói. Ela terá mentores, aliados, opositores e desafios que a farão ir em busca de sua própria essência. Cada passo é um aprendizado, uma descoberta, uma superação. Interessante como o diretor Marcelo Lordello brinca com nossos próprios medos, preconceitos e referências a cada passo da garota. Desde o rapaz na bicicleta, passando pelo próprio MST, a dona Fátima, a polícia e a vizinha. Situação que vemos até em um comentário posterior “a gente não sabe se ela disse tudo o que aconteceu”.
A angústia inicial do porquê aqueles dois foram deixados na estrada, vai se modificando para o como essa menina vai conseguir sobreviver. E tudo em uma construção bastante realista. Os diálogos que ela trava com cada pessoa que encontra são muito naturais, verossímeis. Isso é um dos pontos mais positivos do roteiro. Não há fala onde não deve ter, não há explicações desnecessárias para os personagens. Eles falam, não o diretor por sua boca, ou mesmo a nossa necessidade de explicações que eles não tem.
O silêncio é explorado de uma maneira muito perspicaz. Como na cena em que o garoto e a mãe observam Cris comendo. É possível se sentir dentro daquela cena. Compreender os limites da curiosidade e da generosidade. O trabalho da atriz mirim Maria Luiza Tavares é digno de palmas. Ela parece um bichinho acuado, totalmente lacônica, nos dando uma angústia crescente e nos tornando próximos a ela de uma maneira ímpar. Os três atores da família MST também nos dão uma naturalidade incrível. O que não acontece tanto com a a família de Fátima, que em alguns momentos nos dá a impressão de cenas armadas.
Mesmo assim, essa família também traz momentos interessantes como a crítica irônica às telenovelas e seus resumos. Ou na conversa na beira da piscina entre Cris e a menina que fala de sua vida, a partir de coisas simples como uma calça jeans. São nesses pequenos encontros que o filme ganha força, até por isso, a parte final cai um pouco. É possível compreender a intenção de Lordello no caminho de volta, na transformação da personagem, mas, tudo se alonga muito, seria melhor não mostrar tantas coisas.
Ainda assim, há o mérito da não explicação em excesso. Há coisas que não precisamos saber, fica em nossa interpretação, por isso, apesar de uma passagem que perde o ritmo, a retomada da cena final é o fecho perfeito. Uma espécie de retorno cíclico e transformado. Um sinal real de aprendizado. Tudo o que precisávamos saber para continuar a história dentro de nós, fazendo de Eles Voltam uma bela viagem interior, onde podemos também rever nossos valores.
Filme visto na 8ª Mostra de Cinema de Vitória da Conquista.
Eles Voltam (Eles Voltam, 2011)
Direção: Marcelo Lordello
Roteiro: Marcelo Lordello
Com: Maria Luiza Tavares, Georgio Kokkosi, Elayne de Moura, Mauricéia Conceição, Jéssica Silva, Irma Brown, Clara Oliveira, Germano Haiut e Teresa Costa Rêgo
Duração: 100 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Eles Voltam
2012-11-11T14:39:00-03:00
Amanda Aouad
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