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Psicose

PsicoseTalvez Psicose seja o filme mais conhecido de Alfred Hitchcock. Mesmo que a pessoa nunca tenha assistido por inteiro, já viu algo sobre a famosa cena do banheiro que já analisei aqui no site. Ainda assim, há sempre um desavisado que não o conhece, vide que aqui mesmo um leitor certa vez reclamou que eu falei da morte no banheiro, como se fosse um spoiler.

Mesmo tendo tantos anos, tenho preferido, então, falar dos filmes de Hitchcock nessa leva pós-Panorama de Cinema, tentando evitar spoilers, pois mais tolo que isso possa parecer para alguns. Dou aula e sei a quantidade de jovens que não conhecem a obra e acho que se os instigá-los a ir em busca dos filmes, é interessante que não saibam o seu final. Principalmente deste, que o mestre fez tanta questão de esconder, proibindo as pessoas de entrarem durante o filme, fazendo campanha para que ninguém revelasse o final e até mesmo comprando todos os exemplares da obra de Robert Bloch em que o filme foi baseado.

PsicosePara falar de Psicose é preciso falar também de outro conceito que envolve Hitchcock, a sua predileção pelo suspense ao horror. Como ele mesmo explicou para Truffaut em suas famosas entrevistas que viraram livro: no horror, o público toma susto junto com o personagem, enquanto que no suspense, o espectador sabe de algo e fica na expectativa do seu desenrolar. Deu até um exemplo de uma bomba embaixo de uma mesa, se a gente não sabe que ela está lá e de repente explode, é horror. Se a gente sabe e vai sendo construída a expectativa da explosão, é suspense.

Hitchcock gostava disso, de criar essa expectativa, de brincar com o público. Tanto que só utilizou uma única vez o recurso conhecido como "quem matou?" tão utilizado em narrativas policiais. Foi em Assassinato, filme ainda de sua fase inglesa, onde um bairro é atingido por um assassinato misterioso que envolve uma trupe de teatro e apenas no final ficamos sabendo quem foi o assassino.

Por que todas essas explicações, antes do filme em si? Porque Psicose nos traz um pouco de cada uma dessas questões. É um filme difícil para Hitchcock, onde ele precisava provar que ainda era capaz de surpreender, de trazer algo novo e conquistar novas plateias. Por isso, investiu tanta energia em sua divulgação, criando o manual para se assistir Psicose. E, no filme, ele brinca com essa questão do horror e do suspense. Nos deixando cúmplices e ao mesmo tempo nos enganado e surpreendendo.

PsicoseComeçamos o filme acompanhando Marion, somos cúmplices dela no desfalque, em sua fuga desorientada, no arrependimento e tentativa de retorno, até que somos surpreendidos por sua morte a um terço do filme. Ok, eu prometi sem spoilers, mas esse não é tão grave, conforme já explicitei, a cena do chuveiro é mais famosa que o próprio filme. A partir daí, somos cúmplices de Norman Bates, esse rapaz tímido que cuida da mãe doente e encobre suas barbaridades. Sabemos mais que os personagens, ainda que não saibamos tudo e que ainda sejamos surpreendidos no final.

Nesse jogo de suspense e símbolos, Hitchcock brinca em cena. Desde o princípio, quando abre a cena com Marion e o noivo Sam em um motel seminus. As cenas na estrada também são muito bem construídas, com elipses pautadas pelas luzes dos faróis dos carros que ditam o ritmo dos cortes, além das vozes overs da imaginação de Marion sobre o que que aconteceria quando encontrasse o noivo, ou sobre o que estaria acontecendo no escritório. Ficar em um plano próximo, olhando apenas o rosto preocupado da atriz, enquanto isso tudo acontece, cria efeitos de angustia na plateia, ajudando na imersão da trama.

Temos ainda a figura do policial da estrada, que em nenhum momento tira os óculos escuros, se tornando ainda mais ameaçador para a protagonista. É interessante como um simples objeto pode simbolizar tanto. Da mesma forma que os pássaros no Motel Bates simbolizam muito da personalidade do jovem rapaz. A conversa de Bates e Marion no escritório tendo atrás dela um quadro de uma flor, e atrás deles os vários pássaros empalhados demonstra o predador que é o personagem, ao mesmo tempo ameaçador, mas empalhado, tolhido pela mãe.

PsicoseÉ notável também a forma como o mistério em torno da Sra. Bates é construído. Ouvimos sua voz, mas não a vemos, a não ser por sombras. Em determinado momento, quando tem que levá-la para o porão, por exemplo, a câmera se posiciona em um plongée aguardando a passagem dos personagens, sem que possamos distingui-la completamente. Isso também cria um efeito, além do motivo imaginado após o final, que é o mesmo dos óculos do guarda da estrada. Tememos o que não conhecemos, a Sra. Bates é uma sombra para nós, assim como é para o seu filho que a venera e teme.

Dentro de toda a concepção cênica, não podemos deixar de destacar ainda a atuação de Anthony Perkins como Normam Bates. Muito do fascínio deste personagem se deve também à alma que ele empregou, em suas atitudes minuciosas, no olhar perdido e até ingênuo, muitas vezes, e, claro, no descontrole na parte final. Ao contrário de John Gavin, que parece estar sempre posando para a câmera.

São todos esses pequenos detalhes que ajudaram a construir a aura de Psicose. Muitos amam, outros nem tanto. Um crítico amigo meu disse antes da sessão que considerava uma bobagem criada apenas para publicidade que, vista pela segunda vez, perde o sentido. Não concordo, apesar de também concordar hoje que não seja a obra-prima do diretor. Mas, é um filme que continua fascinante e que não me canso de redescobrir desde a primeira vez que vi, com apenas 10 anos de idade.



Psicose (Psycho, 1960 / EUA)
Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Joseph Stefano
Com: Anthony Perkins, Janet Leigh, Vera Miles
Duração: 109 min.

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