118 Dias
118 Dias. Enquanto o título original traz significados mais poéticos com o seu Rosewater, uma espécie de "água de rosas", utilizada em rituais religiosos islâmicos, o título brasileiro deixa claro o que vamos ver, o suplício de um homem preso por cento e dezoito dias na solitária, acusado de espionagem.
Maziar Bahari retornou ao seu país natal, o Irã, para cobrir as Eleições de 2009. Correspondente da revista norte-americana Newsweek, ele vive em Londres com sua esposa, que está grávida, e não tem grandes convicções políticas como seu pai, preso por ser comunista, e sua irmã, presa por participar de manifestações. Mas, ao chegar lá, ele acaba observando de perto as pessoas e a oposição. Quando o resultado parece ser uma fraude, as manifestações pipocam nas ruas e Bahari acaba preso, acusado de ser um espião internacional, por trás das manifestações.
O comediante Jon Stewart estreia na direção cinematográfica de maneira muito feliz. O filme é bem feito e possui ritmo próprio, mesmo passando boa parte da trama trancado na solitária junto com Bahari. Recursos narrativos como os diálogos com o pai e a irmã ajudam, mas, no geral, o filme possui uma câmera instigante que sempre brinca com o espectador, criando expectativa para algo antes de mostrar de fato. Tem ainda a utilização criativa de caracteres, como quando mostra a propagação da hashtag pela cidade.
Interessante que Stewart, que também assina o roteiro, escolhe começar a trama pelo momento da prisão, só então, retornando alguns dias. Isso segue a tendência das narrativas atuais, onde tudo é muito ágil e já precisa começar fisgando a atenção do público, que parece não ter mais paciência para dedicar atenção a um primeiro ato de apresentação para, só então, entender para que o filme veio.
Gael García Bernal, que interpreta o jornalista, consegue uma boa performance, principalmente, nas cenas em que está só, tendo que lidar com a situação em que se encontra. A tortura psicológica pela qual passa é muito mais cruel que a física. O próprio chefe do torturado avisa: "Não deve tirar apenas o seu sangue, mas a sua esperança". E é por isso, que a virada se torna tão genial, porque tudo também é psicológico, em um grande jogo de paciência e estudo do adversário, tal qual um jogo de xadrez.
A utilização dos diálogos com o pai e a irmã na cadeia, também acaba sendo bastante funcional. Uma forma de compreendermos os pensamentos de Bahari, suas memórias, suas crenças e aprendizados. Ao optar por nos deixar ali, presos com o jornalista em vez de acompanhar o que está acontecendo do lado de fora, ele precisa trazer algo mais do que um personagem na solitária ou sendo torturado. E essa acaba sendo uma boa solução.
É interessante perceber ainda que o filme seja norte-americano, dirigido por um norte-americano que foi um dos pivôs do problema que levou Bahari à cadeia. Ou seja, independente dos direitos humanos do jornalista realmente não ter nada a ver com o início das manifestações, isentar completamente os Estados Unidos do que acontece por lá pode ser encarado como uma construção "chapa branca". Ainda que, em determinado momento, a intervenção ianque no local em busca por petróleo tenha sido citada, frisa que foi em "outra época". É bom lembrar que Jon Stewart sempre foi um dos maiores críticos do governo Bush.
De qualquer maneira, 118 Dias é um filme bem feito que consegue contar uma história de maneira coesa e clara, expondo a questão política mesmo para completos leigos no tema. Nos envolve também com o tema dos direitos humanos, reforçando os inúmeros outros presos políticos que não tiveram a sorte dos holofotes internacionais e nos fazendo pensar em nossas próprias situações.
118 Dias (Rosewater, 2014 / EUA)
Direção: Jon Stewart
Roteiro: Jon Stewart
Com: Gael García Bernal, Kim Bodnia, Dimitri Leonidas
Duração: 103 min.
Maziar Bahari retornou ao seu país natal, o Irã, para cobrir as Eleições de 2009. Correspondente da revista norte-americana Newsweek, ele vive em Londres com sua esposa, que está grávida, e não tem grandes convicções políticas como seu pai, preso por ser comunista, e sua irmã, presa por participar de manifestações. Mas, ao chegar lá, ele acaba observando de perto as pessoas e a oposição. Quando o resultado parece ser uma fraude, as manifestações pipocam nas ruas e Bahari acaba preso, acusado de ser um espião internacional, por trás das manifestações.
O comediante Jon Stewart estreia na direção cinematográfica de maneira muito feliz. O filme é bem feito e possui ritmo próprio, mesmo passando boa parte da trama trancado na solitária junto com Bahari. Recursos narrativos como os diálogos com o pai e a irmã ajudam, mas, no geral, o filme possui uma câmera instigante que sempre brinca com o espectador, criando expectativa para algo antes de mostrar de fato. Tem ainda a utilização criativa de caracteres, como quando mostra a propagação da hashtag pela cidade.
Interessante que Stewart, que também assina o roteiro, escolhe começar a trama pelo momento da prisão, só então, retornando alguns dias. Isso segue a tendência das narrativas atuais, onde tudo é muito ágil e já precisa começar fisgando a atenção do público, que parece não ter mais paciência para dedicar atenção a um primeiro ato de apresentação para, só então, entender para que o filme veio.
Gael García Bernal, que interpreta o jornalista, consegue uma boa performance, principalmente, nas cenas em que está só, tendo que lidar com a situação em que se encontra. A tortura psicológica pela qual passa é muito mais cruel que a física. O próprio chefe do torturado avisa: "Não deve tirar apenas o seu sangue, mas a sua esperança". E é por isso, que a virada se torna tão genial, porque tudo também é psicológico, em um grande jogo de paciência e estudo do adversário, tal qual um jogo de xadrez.
A utilização dos diálogos com o pai e a irmã na cadeia, também acaba sendo bastante funcional. Uma forma de compreendermos os pensamentos de Bahari, suas memórias, suas crenças e aprendizados. Ao optar por nos deixar ali, presos com o jornalista em vez de acompanhar o que está acontecendo do lado de fora, ele precisa trazer algo mais do que um personagem na solitária ou sendo torturado. E essa acaba sendo uma boa solução.
É interessante perceber ainda que o filme seja norte-americano, dirigido por um norte-americano que foi um dos pivôs do problema que levou Bahari à cadeia. Ou seja, independente dos direitos humanos do jornalista realmente não ter nada a ver com o início das manifestações, isentar completamente os Estados Unidos do que acontece por lá pode ser encarado como uma construção "chapa branca". Ainda que, em determinado momento, a intervenção ianque no local em busca por petróleo tenha sido citada, frisa que foi em "outra época". É bom lembrar que Jon Stewart sempre foi um dos maiores críticos do governo Bush.
De qualquer maneira, 118 Dias é um filme bem feito que consegue contar uma história de maneira coesa e clara, expondo a questão política mesmo para completos leigos no tema. Nos envolve também com o tema dos direitos humanos, reforçando os inúmeros outros presos políticos que não tiveram a sorte dos holofotes internacionais e nos fazendo pensar em nossas próprias situações.
118 Dias (Rosewater, 2014 / EUA)
Direção: Jon Stewart
Roteiro: Jon Stewart
Com: Gael García Bernal, Kim Bodnia, Dimitri Leonidas
Duração: 103 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
118 Dias
2015-03-04T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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