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Uma Segunda Chance para Amar

Uma Segunda Chance para Amar - filme

Uma Segunda Chance para Amar
parece, à primeira vista, apenas mais uma comédia romântica natalina, mas revela, nos seus detalhes, que o filme de Paul Feig se arrisca em uma jornada emocionalmente complexa e, às vezes, melancólica. Adaptado do sucesso musical "Last Christmas" de George Michael, o filme é uma homenagem tanto ao espírito do cantor quanto àqueles que, assim como a protagonista, buscam uma nova chance em suas próprias vidas. Emma Thompson, que assina o roteiro e atua no longa, conseguiu, com seu olhar refinado para nuances culturais e temas humanitários, dar ao filme um tom que se desvia das convenções da comédia romântica, ainda que, ironicamente, se prenda demais a alguns clichês do gênero.

O roteiro começa nos apresentando Kate, interpretada por Emilia Clarke com seu carisma habitual, uma jovem que tenta retomar a vida após uma grave doença, mas que se encontra à deriva. Trabalhando em uma loja de artigos natalinos e sem conseguir se conectar com sua família, Kate está distante de qualquer sensação de bem-estar, e sua busca por algo que preencha essa lacuna interna a leva a encontros efêmeros e ao cansaço da rotina. É então que ela conhece Tom (Henry Golding), um estranho carismático que parece ter uma visão genuinamente positiva da vida, o que intriga e eventualmente transforma Kate. A química entre Clarke e Golding é clara e ajuda a dar força ao arco romântico, ainda que Tom surja, em diversos momentos, como um personagem que simboliza algo maior do que sua função como interesse amoroso.

Uma Segunda Chance para Amar - filme
Paul Feig
, que se destacou anteriormente em Missão Madrinha de Casamento (2011), mostra uma direção curiosamente contida aqui, o que combina com o tom melancólico e introspectivo da história. Visualmente, ele compensa com uma fotografia que explora ao máximo o cenário londrino de inverno, com suas luzes e decorações festivas em cada esquina, que dão ao filme a aura de uma fábula moderna. Feig equilibra bem a atmosfera nostálgica do Natal com o peso da melancolia de Kate, proporcionando momentos de leveza e reflexão que quebram as expectativas de um final previsível. Essa combinação entre o cenário natalino e o enredo focado em questões existenciais parece sugerir que o espírito natalino é mais um estado de mudança do que um destino final.

A música de George Michael é a espinha dorsal da produção. Funcionando como muito mais que uma trilha sonora, ela sustenta o próprio ritmo emocional do filme. Thompson aproveita as letras de Michael para fundamentar temas do roteiro – a busca por redenção, o desejo de ser amado e a capacidade de se doar. Embora músicas como “Faith” e “Wake Me Up Before You Go-Go” apareçam de forma sutil, é “Last Christmas” que ganha ares mais profundos, alinhando-se perfeitamente com a reviravolta da trama, uma interessante alegoria sobre autocuidado e a importância de se abrir para o mundo.

A atuação de Emilia Clarke é um ponto forte e convincente, especialmente em cenas que demandam uma abordagem mais dramática. Clarke explora a vulnerabilidade de Kate sem torná-la completamente frágil, demonstrando uma resiliência que combina bem com o teor da personagem. Henry Golding, por sua vez, encarna Tom com uma leveza que cativa, ainda que seu personagem soe, em alguns momentos, mais um ideal platônico do que uma pessoa concreta. Tom é mais uma presença que inspira mudanças do que um parceiro que compartilha uma história – uma abordagem que, se por um lado traz algo novo ao gênero, por outro limita a profundidade do romance entre os protagonistas. Emma Thompson como a mãe de Kate adiciona toques sutis e necessários de drama familiar, abordando a questão dos imigrantes e o medo do deslocamento, especialmente no contexto europeu. Essa narrativa sobre a família de imigrantes eslavos em Londres e suas tentativas de reconstruir uma identidade após o trauma da guerra é uma camada que traz relevância social ao filme e, ainda que abordada de forma superficial, enriquece o pano de fundo emocional da história.

Uma Segunda Chance para Amar - filme
No entanto, há momentos em que a narrativa perde sua força devido ao excesso de temas e arcos paralelos. Em certos pontos, o roteiro parece vacilar, como se estivesse tentando atender a várias expectativas ao mesmo tempo, sem se decidir entre ser um conto de Natal, um drama romântico ou uma sátira leve sobre as complexidades da família moderna. Essa indecisão fica evidente na tentativa de incorporar temas como a crise financeira e o impacto do Brexit, assuntos que, embora mereçam destaque, acabam dispersando a atenção da jornada pessoal de Kate. A comédia, que geralmente é um ponto forte em roteiros de Thompson, se revela frágil e o humor sutil acaba competindo com o drama, tirando a profundidade de algumas questões abordadas.

Ainda que com alguns tropeços, Uma Segunda Chance para Amar é um filme que ganha pontos por ser ousado em sua abordagem de questões como o crescimento pessoal e a superação do medo de amar. Sua capacidade de surpreender, é um mérito de Thompson e Feig, que optaram por explorar temas de uma forma mais poética e introspectiva. Não é o típico filme de Natal que termina com um “felizes para sempre” óbvio. É um filme que desafia o espectador a olhar para o próprio coração e questionar a maneira como nos relacionamos com as pessoas ao nosso redor. De certa forma, a mensagem central do filme reflete o próprio George Michael – alguém que, apesar de uma vida de glórias e dores, sempre buscou uma conexão genuína com seu público, oferecendo seu coração em cada nota e cada palavra.

Uma Segunda Chance para Amar não é uma obra-prima, mas é um filme que tenta fazer algo significativo e, em sua execução, consegue transmitir, ao menos em parte, a emoção sincera de uma segunda chance. Feig e Thompson se unem para entregar uma narrativa que, embora imperfeita, brilha pela tentativa de inovar dentro de um gênero saturado, com um elenco que encanta e um tributo a um artista que transformou sentimentos em canções. Ao fim, é uma história sobre aceitação, arrependimento e, acima de tudo, sobre a capacidade de encontrar beleza nas segundas chances – e isso também faz parte do verdadeiro espírito do Natal.


Uma Segunda Chance Para Amar (Last Christmas, 2019 / Estados Unidos, Reino Unido)
Direção: Paul Feig
Roteiro: Emma Thompson, Greg Wise
Elenco: Emma Thompson, Henry Golding, Emilia Clarke, Michelle Yeoh
Duração: 102 min.

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