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Os 33

Os 33 - filme

O mundo parou em 12 de outubro de 2010 para assistir ao resgate dos 33 mineiros chilenos presos na mina San José após um desmoronamento catastrófico. A saga de 69 dias foi um evento midiático sem precedentes, unindo o drama humano ao heroísmo da persistência. Não é de se estranhar que essa história extraordinária tenha chegado às telas de cinema, adaptada em Os 33 (2015), dirigido pela cineasta mexicana Patricia Riggen. Ainda assim, a tarefa de traduzir um evento tão complexo e emotivo para o cinema provou ser tão desafiadora quanto o próprio resgate.

A narrativa é inspirada no livro "Deep Down Dark", de Héctor Tobar, e se propõe a capturar não apenas os horrores do confinamento, mas também a luta na superfície para salvar os trabalhadores soterrados. Patricia Riggen, conhecida por filmes como Garota em Progresso (2012) e Sob a Mesma Lua (2007), faz um esforço louvável para manter a coesão entre os inúmeros personagens e os eventos paralelos que acontecem dentro e fora da mina. No entanto, é justamente essa ambição que faz o filme tropeçar.

A escolha de Antonio Banderas como Mario Sepúlveda, líder carismático e porta-voz dos mineiros, é um dos acertos mais evidentes do longa. Banderas interpreta Mario com energia e intensidade, capturando tanto a bravura quanto as vulnerabilidades de um homem que assumiu para si a responsabilidade de manter a esperança viva em um ambiente de completa desesperança. Suas cenas, especialmente as que mostram a divisão do escasso suprimento de comida e a gestão dos ânimos em um espaço claustrofóbico, são algumas das mais poderosas do filme.

Os 33 - filme
Ao seu lado, Juliette Binoche brilha como María Segovia, irmã de um dos mineiros, cuja determinação incansável e força emocional a transformam na "voz" dos familiares que acamparam em frente à mina. Binoche, mesmo em um papel relativamente pequeno, é uma presença marcante e dá profundidade à história ao retratar as dores e a resiliência daqueles que esperavam pela volta de seus entes queridos.

Por outro lado, o personagem de Rodrigo Santoro, Laurence Golborne, ministro da Energia do Chile, não tem o mesmo impacto. Santoro oferece uma atuação contida, mas o roteiro o limita a ser um observador passivo dos eventos, o que torna difícil se conectar com sua jornada. Isso é agravado pela superficialidade com que o filme aborda os conflitos políticos em torno do resgate. Um ponto crucial da história real – o dilema entre o governo chileno e as operações de resgate privadas – é apenas tangenciado, quando poderia ter sido uma subtrama fascinante.

O maior mérito técnico do filme está em sua cinematografia, liderada por Checco Varese. As paisagens áridas e desoladoras do Deserto do Atacama contrastam com a escuridão opressiva do interior da mina, criando uma experiência visual que sublinha a divisão entre os mundos acima e abaixo da terra. Varese, que já trabalhou com Riggen anteriormente, usa cores vibrantes para destacar o calor sufocante e a solidão do ambiente, enquanto as cenas subterrâneas transmitem de forma convincente o horror do confinamento.

Os 33 também se beneficia de uma trilha sonora cuidadosamente construída por James Horner, que evita o sensacionalismo. A música não tenta manipular as emoções do público, mas serve como uma moldura para os momentos dramáticos e esperançosos da história. Em filmes como esse, onde a carga emocional já é inerente à narrativa, uma trilha exagerada poderia ter arruinado o equilíbrio.

Os 33 - filme
No entanto, com 33 protagonistas potenciais, era inevitável que muitos personagens acabassem subdesenvolvidos. Embora Riggen se esforce para dar voz a alguns mineiros, como o problemático Darío Segovia (Juan Pablo Raba) e o boliviano Carlos Mamani (Tenoch Huerta), muitos outros são relegados a estereótipos ou se tornam figurantes na própria história. Além disso, o drama entre as duas mulheres de Yonni Barrios (Jacob Vargas) – sua esposa e amante – é tratado com um humor forçado que parece deslocado em um filme tão carregado emocionalmente.

Outro ponto é a escolha do idioma principal ser o inglês, com sotaques forçados que oscilam entre o aceitável e o distrativo. Embora seja compreensível que a produção tenha adotado essa abordagem para alcançar um público global, a autenticidade da história perde força com essa decisão. Imagine assistir a um drama tão enraizado na cultura chilena e ouvir diálogos que soam como um ensaio para uma novela americana. A desconexão é palpável.

O momento mais marcante do filme, sem dúvida, é o desmoronamento inicial. A cena é uma explosão de tensão, com efeitos especiais que capturam o caos e a impotência dos trabalhadores. É o tipo de sequência que prende a respiração do público e estabelece a gravidade do que está por vir. Já o resgate final, embora emocionalmente impactante, é prejudicado por uma montagem apressada. A pressa em encerrar a narrativa rouba a profundidade de algumas interações cruciais, especialmente no que diz respeito à relação entre Mario e os outros mineiros.

Apesar de suas falhas, Os 33 é um tributo sincero à resiliência humana. A direção de Patricia Riggen demonstra um carinho evidente pela história. O filme oferece um vislumbre comovente da força e da fragilidade humanas, mas deixa a sensação de que, com mais cuidado no roteiro e mais ousadia em explorar os conflitos externos, poderia ter sido verdadeiramente excepcional.

Ainda assim, para aqueles que acompanharam o resgate em 2010 ou para os que se interessam por histórias reais de sobrevivência, Os 33 oferece uma experiência cinematográfica visualmente arrebatadora e emocionalmente tocante, mesmo que falhe em atingir toda a complexidade de sua fonte. Um filme que, como o próprio deserto que o abriga, é belo e imperfeito em igual medida.


Os 33 (The 33, 2015 / Chile, Colômbia, EUA)
Direção: Patricia Riggen
Roteiro Jose Rivera, Mikko Alanne
Com: Rodrigo Santoro, Antonio Banderas, Juliette Binoche, Gabriel Byrne, James Brolin, Bob Gunton, Naomi Scott, Kate del Castillo, Jacob Vargas, Adriana Barraza, Lou Diamond Phillips
Duração: 125 min.

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