Surrealismo
Há oitenta anos, em 06 junho de 1929, estreava em Paris um filme que causaria espanto e surpresa, revolucionando o cinema: O Cão Andaluz. Produzido por Luis Buñuel com a ajuda de Salvador Dali, a cena inicial, com uma mulher tendo o olho cortado por uma navalha, causou tanta angústia que um espectadora chegou a sofrer um aborto espontâneo. Assim, ambos conseguiram o seu intento de ser admitidos no grupo de André Breton, passando a frequentar as reuniões semanais do Movimento Surrealista.
Fortemente influenciado pelas idéias de Sigmund Freud, o surrealismo busca ir além da razão, revelando através da arte as sensações do inconsciente. “Nós combatemos sob todas as formas, a indiferença poética, a distração artística, a pesquisa erudita, a especulação pura, e não queremos ter nada em comum com os economizadores de espírito”, dizia parte do manifesto publicado em 1924.
Dez anos após O Cão Andaluz, Dali e Buñuel lançam A Idade do Ouro, também uma sucessão de imagens oníricas que causam sensações diversas no espectador. Melhor não explicar a história de nenhum dos dois filmes. Não é explicável. Ao fazer isso a minha razão quebra o manifesto surrealista que não quer a razão e sim a sensação que as imagens podem causar, se libertando da ordem. Falo apenas que um é a passagem do tempo, o outro, os tabus de uma sociedade conservadora.
Buñuel brigou com Dali, foi para o México onde produziu alguns bons filmes e retornou para França, onde dirigiu suas obras-primas: O Anjo Exterminador e A Bela da Tarde. Ambos com traços surrealistas que ele nunca abandonou, porém com uma história que pode ser minimamente contada.
O Anjo Exterminador fala da inércia da sociedade burguesa (alvo principal do surrealismo), provavelmente de onde Caetano Veloso tirou o refrão de Panis et Circensis. Após uma noite agradável em uma casa, um grupo de amigos não consegue sair da sala, sem nenhum motivo aparente. As portas estão abertas, eles querem ir embora, mas uma força maior incompreendível os impele a permanecer ali. Aos poucos, a comida vai acabando, eles vão ficando sujos, cansados, mas não conseguem atravessar a linha da porta. A angústia vai tomando conta dos presentes que começam a mostrar suas verdadeiras faces, discussões são travadas, revelações feitas, tudo com uma câmera investigativa, densa, expondo aquela situação absurda. Em dado momento, animais passam pela outra sala, pessoas lá fora se aglomeram achando que eles não saem por alguma ameaça real assustadora. Porém, tudo não passa de inércia. Esta é a metáfora que ele quer passar. E a angústia que sentimos ao ver o filme, considerando aquilo absurdo nos faz refletir em quantos momentos absurdos passamos na vida, sem coragem de agir por pura inércia.
A Bela da Tarde é ainda mais complexo. Fala da insatisfação humana. Séverine, vivida por Catherine Deneuve
, é uma mulher bonita, bem casada, com uma situação financeira estável, porém não está satisfeita. O filme começa com uma cena estranha com ela em uma carruagem, ao lado do marido. Em um dado momento, ele a manda saltar e bate nela. Tudo não passa de um sonho, sonhos cada vez mais comuns para Séverine. Em uma tarde, sem motivo aparente ela entra em uma casa que serve de bordel de luxo e pede emprego. Todas as tardes, então, enquanto o marido está trabalhando, Séverine vive a fantasia de ser uma prostituta recebendo os piores tipos de homens que batem, abusam e a desrespeitam. Alguma lógica nisso? Mais uma metáfora angustiante da nossa insatisfação com a vida.
Porém, ambos não podem ser analisados apenas com as palavras acima, pois antes de tudo, os filmes de Buñuel são imagens. É o ritmo da sucessão de cenas, da música, da montagem, dos movimento de câmera que dão o tom e trazem as sensações mais diversas. Foi o que ele sugou de mais belo e mais complexo da teoria de Freud, do movimento surrealista, mas, acima de tudo, do mecanismo próprio de fazer cinema e ser considerado um autor.
Para encerrar, um vídeo que encontrei com o resumo da vida de Buñuel. Vale a pena dar uma olhadinha.
Fortemente influenciado pelas idéias de Sigmund Freud, o surrealismo busca ir além da razão, revelando através da arte as sensações do inconsciente. “Nós combatemos sob todas as formas, a indiferença poética, a distração artística, a pesquisa erudita, a especulação pura, e não queremos ter nada em comum com os economizadores de espírito”, dizia parte do manifesto publicado em 1924.
Dez anos após O Cão Andaluz, Dali e Buñuel lançam A Idade do Ouro, também uma sucessão de imagens oníricas que causam sensações diversas no espectador. Melhor não explicar a história de nenhum dos dois filmes. Não é explicável. Ao fazer isso a minha razão quebra o manifesto surrealista que não quer a razão e sim a sensação que as imagens podem causar, se libertando da ordem. Falo apenas que um é a passagem do tempo, o outro, os tabus de uma sociedade conservadora.
Buñuel brigou com Dali, foi para o México onde produziu alguns bons filmes e retornou para França, onde dirigiu suas obras-primas: O Anjo Exterminador e A Bela da Tarde. Ambos com traços surrealistas que ele nunca abandonou, porém com uma história que pode ser minimamente contada.
O Anjo Exterminador fala da inércia da sociedade burguesa (alvo principal do surrealismo), provavelmente de onde Caetano Veloso tirou o refrão de Panis et Circensis. Após uma noite agradável em uma casa, um grupo de amigos não consegue sair da sala, sem nenhum motivo aparente. As portas estão abertas, eles querem ir embora, mas uma força maior incompreendível os impele a permanecer ali. Aos poucos, a comida vai acabando, eles vão ficando sujos, cansados, mas não conseguem atravessar a linha da porta. A angústia vai tomando conta dos presentes que começam a mostrar suas verdadeiras faces, discussões são travadas, revelações feitas, tudo com uma câmera investigativa, densa, expondo aquela situação absurda. Em dado momento, animais passam pela outra sala, pessoas lá fora se aglomeram achando que eles não saem por alguma ameaça real assustadora. Porém, tudo não passa de inércia. Esta é a metáfora que ele quer passar. E a angústia que sentimos ao ver o filme, considerando aquilo absurdo nos faz refletir em quantos momentos absurdos passamos na vida, sem coragem de agir por pura inércia.
A Bela da Tarde é ainda mais complexo. Fala da insatisfação humana. Séverine, vivida por Catherine Deneuve
, é uma mulher bonita, bem casada, com uma situação financeira estável, porém não está satisfeita. O filme começa com uma cena estranha com ela em uma carruagem, ao lado do marido. Em um dado momento, ele a manda saltar e bate nela. Tudo não passa de um sonho, sonhos cada vez mais comuns para Séverine. Em uma tarde, sem motivo aparente ela entra em uma casa que serve de bordel de luxo e pede emprego. Todas as tardes, então, enquanto o marido está trabalhando, Séverine vive a fantasia de ser uma prostituta recebendo os piores tipos de homens que batem, abusam e a desrespeitam. Alguma lógica nisso? Mais uma metáfora angustiante da nossa insatisfação com a vida.
Porém, ambos não podem ser analisados apenas com as palavras acima, pois antes de tudo, os filmes de Buñuel são imagens. É o ritmo da sucessão de cenas, da música, da montagem, dos movimento de câmera que dão o tom e trazem as sensações mais diversas. Foi o que ele sugou de mais belo e mais complexo da teoria de Freud, do movimento surrealista, mas, acima de tudo, do mecanismo próprio de fazer cinema e ser considerado um autor.
Para encerrar, um vídeo que encontrei com o resumo da vida de Buñuel. Vale a pena dar uma olhadinha.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Surrealismo
2009-06-05T20:27:00-03:00
Amanda Aouad
Especial|Historia do cinema|materias|surrealismo|
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