
Não que eu concorde com isso, mas é a premissa básica para acompanharmos suas obras, senão, iremos passar dias pensando e rejeitando o estupro de uma mulher em coma como em Fale com Ela, por exemplo. Então, a morte do marido de Raimunda e a forma como ela encobre seu corpo torna-se aceitável. Compramos aquele universo fílmico. Volver é também a volta do diretor ao universo feminino, após Fale com Ela e Má Educação, centrados em personagens masculinos. E demonstra que este é mesmo seu melhor estilo, já que o filme seguinte perde muito em relação ao conjunto da obra.

A história é centrada em Raimunda e Sole, duas irmãs órfãs que compartilham a dor dos pais terem morrido em um incêndio e sua tia estar à beira da morte. Raimunda é uma mulher de personalidade forte e um passado traumático, que vive com seu marido e sua filha de catorze anos em Madri. Sole é uma mulher solteira e solitária que vive de um salão clandestino em sua própria casa. Tudo se complica com duas mortes em paralelo. Raimunda encontra o marido morto na cozinha de casa, esfaqueado por sua filha que se defendia de um abuso sexual, ao mesmo tempo que tenta encobrir o crime, fica sabendo que sua tia Paula enfim desencarnara. Sole vai ao enterro sozinha, enquanto Raimunda tenta se livrar do corpo do marido e proteger a filha. Para complicar ainda mais, Sole volta do pequeno vilarejo natal com o fantasma de sua mãe. Completando o quadro, temos a vizinha da família, que está com câncer e quer que Raimunda desvende com o fantasma da mãe um mistério do passado.

Aliás, vendo Volver é fácil entender porque Penélope Cruz virou musa do diretor e de todos os temas latinos. A atriz está completamente solta no papel, sensual, bela, intensa como nunca tinha visto antes. Compreender Raimunda é uma tarefa bonita. Assim como Carmen Maura mereceu o prêmio de melhor atriz em Cannes pelo papel. A intensidade com que constrói Irene é de se aplaudir. Aliás, todo o elenco está muito bem no final das contas.
Volver é um filme feminino em sua essência, os homens são meros coadjuvantes, quase não aparecem em cena. Toda a trama é conduzida por elas. Talvez por isso, os espanhóis reclamem tanto do diretor. Eu adorei. Como adoro a maioria das obras de Almodóvar.