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Volver

VolverNão consigo entender como os espanhóis podem não gostar de Almodóvar. O diretor é definitivamente genial. Alguns filmes dele são uma delícia de se ver, pela plástica, pelo ritmo, pela construção narrativa. Assim é Volver, filme de 2006. Voltar, em bom português. Durante pouca parte do filme ficamos sem entender quem é que está voltando. Mas, quando a personagem volta, a situação surreal não é menos deliciosa de acompanhar. É fácil se apaixonar por aquela família enlouquecida, cheia de segredos, traumas e culpas. É fácil entender assassinatos e a forma como eles são encobertos. Há ali uma suspensão total da ética. Os fins justificam os meios. E não vamos discutir escrúpulos porque em Almodóvar é permitido apenas sentir e expressar emoções.

Não que eu concorde com isso, mas é a premissa básica para acompanharmos suas obras, senão, iremos passar dias pensando e rejeitando o estupro de uma mulher em coma como em Fale com Ela, por exemplo. Então, a morte do marido de Raimunda e a forma como ela encobre seu corpo torna-se aceitável. Compramos aquele universo fílmico. Volver é também a volta do diretor ao universo feminino, após Fale com Ela e Má Educação, centrados em personagens masculinos. E demonstra que este é mesmo seu melhor estilo, já que o filme seguinte perde muito em relação ao conjunto da obra.

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A história é centrada em Raimunda e Sole, duas irmãs órfãs que compartilham a dor dos pais terem morrido em um incêndio e sua tia estar à beira da morte. Raimunda é uma mulher de personalidade forte e um passado traumático, que vive com seu marido e sua filha de catorze anos em Madri. Sole é uma mulher solteira e solitária que vive de um salão clandestino em sua própria casa. Tudo se complica com duas mortes em paralelo. Raimunda encontra o marido morto na cozinha de casa, esfaqueado por sua filha que se defendia de um abuso sexual, ao mesmo tempo que tenta encobrir o crime, fica sabendo que sua tia Paula enfim desencarnara. Sole vai ao enterro sozinha, enquanto Raimunda tenta se livrar do corpo do marido e proteger a filha. Para complicar ainda mais, Sole volta do pequeno vilarejo natal com o fantasma de sua mãe. Completando o quadro, temos a vizinha da família, que está com câncer e quer que Raimunda desvende com o fantasma da mãe um mistério do passado.

VolverDito assim é quase assassinar o filme, pois Almodóvar não se resume a palavras. Cada quadro, adereço, cor, trilha é um complemento da personalidade das personagens e das implicações da narrativa. O filme é para ser sentido, não explicado. Somos envolvidos com cada acontecimento de forma harmônica, bela, intensa. Como não poderia deixar de ser, a melhor cena é um musical. Raimunda canta Volver com toda a alma, enquanto o fantasma de sua mãe ouve do carro, escondida. O significado daquela música, da relação passada das suas personagens, do momento em que vivem. É tudo de uma sintonia única, que emociona. E é ainda mais significante interpretado pelas duas grandes musas de Almodóvar. A nova Penélope Cruz e a antiga Carmen Maura.

Aliás, vendo Volver é fácil entender porque Penélope Cruz virou musa do diretor e de todos os temas latinos. A atriz está completamente solta no papel, sensual, bela, intensa como nunca tinha visto antes. Compreender Raimunda é uma tarefa bonita. Assim como Carmen Maura mereceu o prêmio de melhor atriz em Cannes pelo papel. A intensidade com que constrói Irene é de se aplaudir. Aliás, todo o elenco está muito bem no final das contas.

Volver é um filme feminino em sua essência, os homens são meros coadjuvantes, quase não aparecem em cena. Toda a trama é conduzida por elas. Talvez por isso, os espanhóis reclamem tanto do diretor. Eu adorei. Como adoro a maioria das obras de Almodóvar.

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