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Gustavo Taretto
Javier Drolas
Pilar López de Ayala
Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Digital
Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Digital
Vivemos uma época de superficialidades, em uma selva de pedra vazia, onde as relações humanas se tornam mais seguras na rede virtual do que nas ruas. Medianeras, filme argentino de Gustavo Taretto começa com reflexões de seu protagonista, Martin, sobre o tempo em que vive, e principalmente, sobre sua cidade, Buenos Aires, com sua arquitetura cheia de "irregularidades estéticas e éticas". A crítica ácida com bom humor segue o mesmo com a apresentação da outra protagonista do longametragem, Mariana, que, entre outras coisas, pergunta "como confiar em uma cidade que dá as costas ao seu rio?" E nesse jogo de reflexão e piadas, assistimos a um belo filme.
Medianeras, que no Brasil ganhou o didático subtítulo Buenos Aires na Era do Amor Digital é um filme de toques realistas e românticos ao mesmo tempo, com humor que mistura o estilo de Woddy Allen com o de nosso brasileiro Jorge Furtado. Acompanhamos em paralelo a rotina de Martin e Mariana, dois vizinhos que não se conhecem, mas têm muita coisa em comum. Martin, é um webdesigner com síndrome de pânico, recém separado, que fez de seu apartamento um paraíso dos nerds, repleto de bonecos de super heróis, objetos de Star Wars (inclusive um sabre de luz), dois Macs, videogames e filmes. Mariana é uma arquiteta que trabalha com organização de vitrines, fóbica e também recém separada, mora em seu apartamento cheio de manequins. Ambos vivem o pânico e a solidão das grandes cidades em uma espécie de mal do século. Ambos, no entanto, não perdem a esperança de encontrar o seu par perfeito e viver um pouco do que chamam de felicidade.
É interessante perceber que o filme de Gustavo Taretto fala explicitamente de Buenos Aires, mas poderia falar de qualquer grande cidade do mundo. Interligados pela rede de computadores, cada vez mais próximos e distantes um do outro, seguimos em nosso universo particular, cada vez mais sozinhos, cada vez mais fóbicos, cada vez mais necessitados de contato humano. Martin e Mariana são reflexos do mundo em que vivemos, onde conectar-se não é necessariamente se relacionar com o outro. Em determinado momento, Martin compara um encontro marcado pela internet com um pedido no Mac Donalds, na foto é ótimo, ao vivo uma decepção. Em uma analogia parecida, apesar de não ter a ajuda da web, temos Mariana com um rapaz na aula de natação. Na água, tudo parece perfeito, no encontro real, a máscara cai e nada funciona.
Enquanto toda moça sonha com seu príncipe encantado, Mariana sonha em descobrir Onde está Wally? Literalmente folheando o livro ela se pergunta como irá encontrar seu Wally na vida real, se não consegue encontrar nem mesmo na página de um livro. A comparação é simbólica e sintetiza boa parte do filme. Na verdade, Martin está ali do lado, mas ela é incapaz de ver, assim como o desenho no meio da multidão da cidade ilustrada. E Gustavo Taretto faz questão de criar situações diversas onde os dois estão no mesmo ambiente sem se notar e nós vamos brincando de marcar cada vez que ambos estão em tela. Uma pena que na primeira vez que isso acontece, o diretor, talvez sem acreditar em nossa capacidade, faça questão de ressaltar isso com um coração desenhado. Ainda bem que é apenas na primeira vez, como um início de jogo. E sem dúvidas, a melhor situação é a da loja de velas.
Gustavo Taretto brinca com imagens em vários momentos, acompanhando o movimento de ambos em uma espécie de raccord. Como na sequência em que ela coloca um óculos no manequim e logo depois vem Martin colocando os próprios óculos. Ou quando ela termina de arrumar uma vitrine dizendo que imagina que se alguém para em frente a vitrine, é porque se interessou por algo que existe nela própria e logo depois Martin passa e pára observando a arrumação. Ou quando ela procura Wally no livro com uma lupa e logo depois vemos Martin andando pelas ruas. O diretor é bastante visual também em outras situações, como na piscina, onde utiliza o número da raia para indicar o número de dias em que Mariana se encontra com um rapaz. Ou na cena da escada, quando ela sobe os vinte andares do restaurante, e os números dos andares indicam o esgotamento do seu paquera.
Outra situação interessante é em relação ao piano de um vizinho de Mariana. Os toques das teclas do piano de cauda, que vimos chegando em determinada cena invadem nossos ouvidos em vários momentos, parecendo um som extra-diegético, ou seja, fora de cena. Porém, logo depois, Mariana interage com ele de alguma forma, quebrando um objeto ou batendo na parede, fazendo a música parar e nos lembrar que aquilo está mesmo acontecendo no apartamento ao lado. Essa situação repetitiva também funciona para utilizar o humor em meio ao desespero. Esse é o tom de boa parte da projeção, conduzindo de forma leve o que poderia ser um drama insuportável. Os dois personagens são cativantes e os atores Javier Drolas e a espanhola Pilar López de Ayala, defendem-os muitos bem, conseguindo passar todos os sonhos e limites dos personagens.
Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Digital é um filme sensível, bem humorado e repleto de nuanças. Um reflexo de nossa vida urbana atual onde a falta de confiança no próximo e o medo da solidão nos enrolam a cada dia em uma teia sem fim. Uma prova de que nossos hermanos sabem mesmo o que estão fazendo quando o assunto é sétima arte.
Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Digital (Medianeras / Argentina: 2011)
Direção: Gustavo Taretto
Roteiro: Gustavo Taretto
Com: Javier Drolas, Pilar López de Ayala, Inés Efron, Adrián Navarro, Rafael Ferro
Duração: 90 min.
Medianeras, que no Brasil ganhou o didático subtítulo Buenos Aires na Era do Amor Digital é um filme de toques realistas e românticos ao mesmo tempo, com humor que mistura o estilo de Woddy Allen com o de nosso brasileiro Jorge Furtado. Acompanhamos em paralelo a rotina de Martin e Mariana, dois vizinhos que não se conhecem, mas têm muita coisa em comum. Martin, é um webdesigner com síndrome de pânico, recém separado, que fez de seu apartamento um paraíso dos nerds, repleto de bonecos de super heróis, objetos de Star Wars (inclusive um sabre de luz), dois Macs, videogames e filmes. Mariana é uma arquiteta que trabalha com organização de vitrines, fóbica e também recém separada, mora em seu apartamento cheio de manequins. Ambos vivem o pânico e a solidão das grandes cidades em uma espécie de mal do século. Ambos, no entanto, não perdem a esperança de encontrar o seu par perfeito e viver um pouco do que chamam de felicidade.
É interessante perceber que o filme de Gustavo Taretto fala explicitamente de Buenos Aires, mas poderia falar de qualquer grande cidade do mundo. Interligados pela rede de computadores, cada vez mais próximos e distantes um do outro, seguimos em nosso universo particular, cada vez mais sozinhos, cada vez mais fóbicos, cada vez mais necessitados de contato humano. Martin e Mariana são reflexos do mundo em que vivemos, onde conectar-se não é necessariamente se relacionar com o outro. Em determinado momento, Martin compara um encontro marcado pela internet com um pedido no Mac Donalds, na foto é ótimo, ao vivo uma decepção. Em uma analogia parecida, apesar de não ter a ajuda da web, temos Mariana com um rapaz na aula de natação. Na água, tudo parece perfeito, no encontro real, a máscara cai e nada funciona.
Enquanto toda moça sonha com seu príncipe encantado, Mariana sonha em descobrir Onde está Wally? Literalmente folheando o livro ela se pergunta como irá encontrar seu Wally na vida real, se não consegue encontrar nem mesmo na página de um livro. A comparação é simbólica e sintetiza boa parte do filme. Na verdade, Martin está ali do lado, mas ela é incapaz de ver, assim como o desenho no meio da multidão da cidade ilustrada. E Gustavo Taretto faz questão de criar situações diversas onde os dois estão no mesmo ambiente sem se notar e nós vamos brincando de marcar cada vez que ambos estão em tela. Uma pena que na primeira vez que isso acontece, o diretor, talvez sem acreditar em nossa capacidade, faça questão de ressaltar isso com um coração desenhado. Ainda bem que é apenas na primeira vez, como um início de jogo. E sem dúvidas, a melhor situação é a da loja de velas.
Gustavo Taretto brinca com imagens em vários momentos, acompanhando o movimento de ambos em uma espécie de raccord. Como na sequência em que ela coloca um óculos no manequim e logo depois vem Martin colocando os próprios óculos. Ou quando ela termina de arrumar uma vitrine dizendo que imagina que se alguém para em frente a vitrine, é porque se interessou por algo que existe nela própria e logo depois Martin passa e pára observando a arrumação. Ou quando ela procura Wally no livro com uma lupa e logo depois vemos Martin andando pelas ruas. O diretor é bastante visual também em outras situações, como na piscina, onde utiliza o número da raia para indicar o número de dias em que Mariana se encontra com um rapaz. Ou na cena da escada, quando ela sobe os vinte andares do restaurante, e os números dos andares indicam o esgotamento do seu paquera.
Outra situação interessante é em relação ao piano de um vizinho de Mariana. Os toques das teclas do piano de cauda, que vimos chegando em determinada cena invadem nossos ouvidos em vários momentos, parecendo um som extra-diegético, ou seja, fora de cena. Porém, logo depois, Mariana interage com ele de alguma forma, quebrando um objeto ou batendo na parede, fazendo a música parar e nos lembrar que aquilo está mesmo acontecendo no apartamento ao lado. Essa situação repetitiva também funciona para utilizar o humor em meio ao desespero. Esse é o tom de boa parte da projeção, conduzindo de forma leve o que poderia ser um drama insuportável. Os dois personagens são cativantes e os atores Javier Drolas e a espanhola Pilar López de Ayala, defendem-os muitos bem, conseguindo passar todos os sonhos e limites dos personagens.
Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Digital é um filme sensível, bem humorado e repleto de nuanças. Um reflexo de nossa vida urbana atual onde a falta de confiança no próximo e o medo da solidão nos enrolam a cada dia em uma teia sem fim. Uma prova de que nossos hermanos sabem mesmo o que estão fazendo quando o assunto é sétima arte.
Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Digital (Medianeras / Argentina: 2011)
Direção: Gustavo Taretto
Roteiro: Gustavo Taretto
Com: Javier Drolas, Pilar López de Ayala, Inés Efron, Adrián Navarro, Rafael Ferro
Duração: 90 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Medianeras: Buenos Aires na Era do Amor Digital
2011-09-21T16:25:00-03:00
Amanda Aouad
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