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Todo mundo tem problemas sexuais
Todo mundo tem problemas sexuais
Lançado em 2000, a peça Todo mundo tem problemas sexuais do dramaturgo Domingos de Oliveira é um sucesso de público e crítica. Baseado em cartas que o psicanalista Alberto Goldin recebia em sua coluna Vida Íntima do jornal O Globo, a peça é construída em cinco esquetes de casais em situações complicadas, costuradas por um grupo que se intitula "anjos do amor". Entre uma situação e outra, eles tecem comentários sobre a vida íntima e formas sexuais.
Bom, passar isso para tela do cinema é possível. Há diversas opções de adaptações, porém Domingos de Oliveira quis inovar construindo o óbvio: um teatro filmado. Segundo o próprio dramaturgo que dirige e assina o roteiro do filme, a opção foi "para emprestar ao cinema alguns dos poderes do teatro, que é mais velho". Digno, até mesmo justo que Oliveira queira deixar para prosteridade sua obra e principalmente a atuação de Pedro Cardoso. Mas, não há como analisar essa obra como um filme. Chega a ser injusto.
O que vemos em tela é uma experiência fílmica teatral bastante inusitada que nos levanta questões e proporciona uma imersão um tanto falha. Vamos, por partes, aliás, fragmentação é a palvra em Todo mundo tem problemas sexuais. A começar pela própria estrutura do roteiro. São cinco situações: uma mulher que não admite que seu parceiro use Viagra para ter relações com ela, um casal convencional que após uma situação inesperada passa a desejar novas experiências, um casal que se conheceu na internet e se encontra as escuras, um farmacêutico que quer levar sua colega de trabalho para cama e um homem que mesmo apaixonado pela mulher percebe que tem desejos homossexuais. Não satisfeito, Domingos de Oliveira divide ainda mais sua história ao filmá-la de três formas diferentes: Uma encenação fílmica em locações, um registro da montagem da peça em 2002 e uma montagem especial para o filme em 2008.
Essa montagem inusitada de peça teatral com filme traz uma análise interessante em relação a diferença entre a linguagem cinematográfica e cênica. São óbvias, claro, é não deixa de ser curioso comparar na tela a diferença de interpretação, por exemplo. No teatro tudo parece mais out, exagerado. Eles gritam, gesticulam ao máximo, fazem marcações visíveis de posicionamento em cena. Já na encenação em locação, o tom é sempre menor, mais realista, intimista até. E Domingos de Oliveira leva essa comparação as últimas consequências quando começa uma frase em um formato e termina no outro. Nesse ponto a mistura imposta é válida.
Mas, então, fica um certo vazio na plateia do cinema que acompanha aquele registro como se fosse um observador distante de uma festa a qual não foi convidado. É impressionante perceber o contraste da platéia do teatro se acabando de rir, enquanto nós, no cinema, ficamos quase constrangidos de um sorriso ou outro. É outra relação. Aquilo não foi mesmo pensado para a sala escura. Não que o texto seja ruim. É divertido, e tem situações engraçadas, mas causa estranhamento desde o primeiro instante quando Domingos de Oliveira olha para câmera e apresenta o que iremos ver como se fosse um making of. A quebra do pacto ficcional acontece a todo instante, não nos faz entrar na trama.
Se não bastasse isso, o equipamento de captação não foi dos mais adequados, é possível perceber falhas em imagens de baixa qualidade, principalmente nas cenas mais escuras. Fora a qualidade do áudio em alguns momentos da exibição da peça. Os atores, no entanto, estão entregues e são eles que nos fazem acompanhar até o fim a experiência insólita. Principalmente Pedro Cardoso que está em quase todas as esquetes, menos na terceira, que curiosamente é a única que não começa com um depoimento dos personagens para a câmera. Isso sem falar do epílogo que tanto na peça quanto no filme é o momento do auge das gargalhadas. Pena que no cinema ele acabou sendo relegado a segundo plano. Primeiro porque não está inteiro, segundo, porque vem junto com o início dos créditos. Terceiro, porque nossos insensíveis projetistas ligam as luzes nesse momento dispersando a platéia. Mas, para provar que a situação tem força, pelo menos na minha sessão todos ficaram sentados até Pedro Cardoso (ou o personagem fálico que ele representava) calar a boca.
Todo mundo tem problemas sexuais como filme, tenho que dizer, é uma das coisas mais lamentáveis que já fizeram. Como registro de uma peça de sucesso é compreensível, não se perde. Como experiência de novas linguagens, não deixa de ser válido. Em uma época onde a falta de criatividade impera, podemos pelo menos comparar, estudar e analisar um caso inusitado de comédia em vários níveis.
Todo mundo tem problemas sexuais (Todo Mundo Tem Problemas Sexuais: 2011 / Brasil)
Direção: Domingos Oliveira
Roteiro: Domingos de Oliveira
Com: Pedro Cardoso, Cláudia Abreu, Priscilla Rozembaum, Orã Figueiredo.
Duração: 80 min
Bom, passar isso para tela do cinema é possível. Há diversas opções de adaptações, porém Domingos de Oliveira quis inovar construindo o óbvio: um teatro filmado. Segundo o próprio dramaturgo que dirige e assina o roteiro do filme, a opção foi "para emprestar ao cinema alguns dos poderes do teatro, que é mais velho". Digno, até mesmo justo que Oliveira queira deixar para prosteridade sua obra e principalmente a atuação de Pedro Cardoso. Mas, não há como analisar essa obra como um filme. Chega a ser injusto.
O que vemos em tela é uma experiência fílmica teatral bastante inusitada que nos levanta questões e proporciona uma imersão um tanto falha. Vamos, por partes, aliás, fragmentação é a palvra em Todo mundo tem problemas sexuais. A começar pela própria estrutura do roteiro. São cinco situações: uma mulher que não admite que seu parceiro use Viagra para ter relações com ela, um casal convencional que após uma situação inesperada passa a desejar novas experiências, um casal que se conheceu na internet e se encontra as escuras, um farmacêutico que quer levar sua colega de trabalho para cama e um homem que mesmo apaixonado pela mulher percebe que tem desejos homossexuais. Não satisfeito, Domingos de Oliveira divide ainda mais sua história ao filmá-la de três formas diferentes: Uma encenação fílmica em locações, um registro da montagem da peça em 2002 e uma montagem especial para o filme em 2008.
Essa montagem inusitada de peça teatral com filme traz uma análise interessante em relação a diferença entre a linguagem cinematográfica e cênica. São óbvias, claro, é não deixa de ser curioso comparar na tela a diferença de interpretação, por exemplo. No teatro tudo parece mais out, exagerado. Eles gritam, gesticulam ao máximo, fazem marcações visíveis de posicionamento em cena. Já na encenação em locação, o tom é sempre menor, mais realista, intimista até. E Domingos de Oliveira leva essa comparação as últimas consequências quando começa uma frase em um formato e termina no outro. Nesse ponto a mistura imposta é válida.
Mas, então, fica um certo vazio na plateia do cinema que acompanha aquele registro como se fosse um observador distante de uma festa a qual não foi convidado. É impressionante perceber o contraste da platéia do teatro se acabando de rir, enquanto nós, no cinema, ficamos quase constrangidos de um sorriso ou outro. É outra relação. Aquilo não foi mesmo pensado para a sala escura. Não que o texto seja ruim. É divertido, e tem situações engraçadas, mas causa estranhamento desde o primeiro instante quando Domingos de Oliveira olha para câmera e apresenta o que iremos ver como se fosse um making of. A quebra do pacto ficcional acontece a todo instante, não nos faz entrar na trama.
Se não bastasse isso, o equipamento de captação não foi dos mais adequados, é possível perceber falhas em imagens de baixa qualidade, principalmente nas cenas mais escuras. Fora a qualidade do áudio em alguns momentos da exibição da peça. Os atores, no entanto, estão entregues e são eles que nos fazem acompanhar até o fim a experiência insólita. Principalmente Pedro Cardoso que está em quase todas as esquetes, menos na terceira, que curiosamente é a única que não começa com um depoimento dos personagens para a câmera. Isso sem falar do epílogo que tanto na peça quanto no filme é o momento do auge das gargalhadas. Pena que no cinema ele acabou sendo relegado a segundo plano. Primeiro porque não está inteiro, segundo, porque vem junto com o início dos créditos. Terceiro, porque nossos insensíveis projetistas ligam as luzes nesse momento dispersando a platéia. Mas, para provar que a situação tem força, pelo menos na minha sessão todos ficaram sentados até Pedro Cardoso (ou o personagem fálico que ele representava) calar a boca.
Todo mundo tem problemas sexuais como filme, tenho que dizer, é uma das coisas mais lamentáveis que já fizeram. Como registro de uma peça de sucesso é compreensível, não se perde. Como experiência de novas linguagens, não deixa de ser válido. Em uma época onde a falta de criatividade impera, podemos pelo menos comparar, estudar e analisar um caso inusitado de comédia em vários níveis.
Todo mundo tem problemas sexuais (Todo Mundo Tem Problemas Sexuais: 2011 / Brasil)
Direção: Domingos Oliveira
Roteiro: Domingos de Oliveira
Com: Pedro Cardoso, Cláudia Abreu, Priscilla Rozembaum, Orã Figueiredo.
Duração: 80 min
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Todo mundo tem problemas sexuais
2011-09-10T09:35:00-03:00
Amanda Aouad
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