
Uma montanha na
Argélia.
Monges católicos. Uma comunidade muçulmana. E uma aparente paz.
Homens e Deuses começa com harmonia. Em um mundo perfeito não precisaríamos brigar por
religião, afinal todas elas nos levam a
Deus, só que de maneiras diferentes. As disputas são sempre políticas, disfarçadas de religiosas. Há uma briga constante por quem irá dominar a mente humana, levando-nos como gado. Ou melhor, como ovelhas, em pastos intermináveis de pastores questionáveis.

Baseado em acontecimentos verídicos, o
filme de
Xavier Beauvois nos mostra a missão desses
monges franceses em meio a conflitos do mundo
muçulmano. Quando um grupo radical começa a ameaçar o entorno, o governo tenta tirá-los de lá, ou pelo menos, manter o exército como proteção. Mas, eles não querem abandonar a comunidade com a qual criaram laços afetivos. E então o clima
tenso começa a crescer até o fatídico resultado que os que conhecem a história já sabem.
O tom do
filme é quase documental, há muitas cenas do cotidiano da comunidade e do mosteiro. Quanto mais a situação avança, mais cenas de
cantos gregorianos são presenciadas. A forma de rezar dos
monges é encantadora e muito bem explorada pela câmera de
Xavier Beauvois. Há uma cena incrivelmente tensa e bela do grupo de mãos dadas, em um canto de
oração, enquanto um helicóptero sobrevoa o mosteiro.

Além do ritmo, há também um contraste imenso entre a
tensão da situação e as belas paisagens locais. As montanhas, perto dos céus, o silêncio da natureza, o lago, os pássaros em seu ritual de êxodo. A vida segue seu curso, sem pressa, assim como os
monges tentam fazer. Mas, em suas cabeças está o constante alerta de que tudo pode mudar a qualquer momento. Mas, nenhum deles quer sair dali: "um bom pastor não abandona suas ovelhas quando o lobo aparece", diz um deles. E eles tentam seguir isso à risca.

A direção de
Xavier Beauvois é poética, como se quisesse prestar uma homenagem àqueles
homens de fé. Quase como se tivesse receio de atrapalhar aqueles momentos. Uma observadora atenta, mas sem muita interferência. As reuniões, a forma como mostra a rotina de cada um deles, as
orações, os rituais, as visitas às comunidades. E junto com o roteiro sensível nos proporciona momentos de muita emoção, como quando um deles coloca
O Lago dos Cisnes em mais uma metáfora de pássaros em êxodo, armadilhas, pastor e decisões de vida. Além das frases de efeitos como "absolutamente indefeso e já tão ameaçado", para a representação do menino Jesus.
Outra coisa interessante do
filme é não rotular nem estigmatizar ninguém. Nem mesmo os radicais, na figura do líder deles que na primeira invasão ao mosteiro acaba se entendendo com o líder dos
monges, vivido por
Lambert Wilson, quando este cita o
Alcorão para acalmá-lo. Mas, as cenas mais significativas são na vila, em uma casa onde as conversas são praticamente para demonstrar que nem todo
muçulmano é igual e nem todos pensam da mesma maneira.
Homens e Deuses é quase um tratado sobre
religiosidade, boa vontade e respeito ao próximo. Um relato belo sobre a verdadeira relação humana.
Homens e Deuses (Des hommes et des dieux: 2010 / França)
Direção: Xavier Beauvois
Roteiro: Xavier Beauvois
Com: Lambert Wilson, Michael Lonsdale, Olivier Rabourdin
Duração: 122 min.