A trama começa logo após os acontecimentos catastróficos do segundo filme/ livro. Lisbeth Salander é levada para um hospital com uma bala alojada no cérebro e ferimentos por todo o corpo. Assim como seu pai, que também está bastante machucado. O clima é tenso, a polícia investiga o que aconteceu. O jornalista Mikael Blomkvist arma um cerco para provar a inocência da exótica amiga. Enquanto a partição secreta do governo sueco tenta encontrar uma forma de não vazar os seus segredos. Isso sem falar no gigante louro Niedermann, que continua fugitivo da polícia.
Como disse, se você não viu ou leu os demais capítulos da trilogia, esse parágrafo acima é vago, confuso e faltando peças. Agora essa confusão e tensão inicial, acaba funcionando bem para os que estão acompanhando todos os passos da hacker mais famosa dos últimos tempos. Porque assim, o espectador entra no clima da própria personagem, abalada com todos os acontecimentos recentes, tendo sida até mesmo enterrada viva, e que precisa ainda se localizar. Aos poucos, com a melhora gradativa de Lisbeth, vamos nos acomodando também na cadeira e acompanhando os fatos.
Os realizadores dos filmes alteraram muitos acontecimentos dos livros, o que não chega a ser um problema. Apenas um, que aponto desde a crítica do primeiro filme: o pouco foco à revista Millennium que aqui é fundamental para o desenlace da trama. Se o roteirista Ulf Ryberg e o diretor Daniel Alfredson encontrassem outra forma de ajudar Lisbeth sem precisar deixar a redação tão em foco aqui, talvez tudo fosse mais orgânico. Porém, ao seguir com o plano original, algo soa estranho. Não estamos tão familiarizados com aquelas pessoas se vemos apenas os filmes. E muita coisa fica sem respostas.
A própria personagem Erika Berger se torna uma tola medrosa. Não há tempo para construí-la melhor, sua relação com Mikael, sua relação com a redação como editora-chefe. Não falo nem em incluir a trama de sua transferência para o jornal, ficaria ainda mais confuso. Mas, por não ter isso, até os e-mails de ameaças acabam indo do nada a lugar nenhum. Ela fica uma mulher frágil, covarde até, apenas um joguete nas mãos de Mikael e dos "inimigos". Isso sem falar que a tensão entre ela e Lisbeth é completamente ignorada na trilogia, perdendo também a possibilidade de construir determinada solução ao final de tudo. Quem leu o livro, sabe do que estou falando.
Outra personagem que perde forças é Annika Giannini, principalmente, na parte mais importante do julgamento. A forma como Daniel Alfredson conduz as acusações e defesas acaba picotando demais a "virada" principal da trama, não surpreendendo tanto quanto no livro. O plano de Mikael também acaba ficando solto demais, e alguns personagens que estariam envolvidos como o antigo tutor de Lisbeth, seu antigo patrão e os amigos, acabam ignorados completamente nesse terceiro filme. Ainda assim, a mobilização é intensa e a resolução é forte.
O filme também tem essa direção crua, realista que possibilita bons momentos como a cena do restaurante e a cena do galpão. Tudo poderia ficar over, se exagerassem na produção. Aqui, esse clima o torna mais incômodo, tenso e envolvente. Até porque, o principal vínculo do espectador com o filme, jamais é quebrado. Nos preocupamos com Lisbeth, com o seu futuro, sua vida, sua inocência. E isso é muito bem trabalhado até pelo talento da atriz Noomi Rapace que consegue dosar bem a fragilidade da personagem escondida naquela máscara agressiva. A cena dela limpando o rosto após o primeiro dia de audiência ou a cena na janela de seu apartamento demonstram bem isso.
A Rainha do Castelo de Ar é, então, um bom fechamento para a trilogia Millennium, ainda que não seja o ideal. O segundo filme, A menina que brincava com fogo, acaba sendo o melhor dos três, por ter conseguido traduzir bem a outra e construir um filme envolvente. Aqui, a tradução peca em vários aspectos, ainda que consiga ser uma obra envolvente. O seu maior problema, no entanto, é mesmo depender de outras informações para ser completamente compreendido.
A Rainha do Castelo de Ar (Luftslottet som sprängdes, 2009 / Suécia
Direção: Daniel Alfredson
Roteiro: Ulf Ryberg
Com: Michael Nyqvist, Noomi Rapace e Lena Endre
Duração: 147 min.