Edward Bloom é assim, um homem criativo que gosta de ver o mundo com seus olhos particulares. Mas, é daqueles contadores tradicionais que não inventa, apenas aumenta o conto. Histórias de pescadores, poderiam dizer alguns. E é com uma história de pescador que ele inicia sua saga, a do peixe impossível de pescar. As metáforas que se constroem a partir daí, inclusive em seu final, são emocionantes. A visão de mundo de Ed Bloom, vivido por Ewan McGregor na juventude e Albert Finney na velhice, é fascinante. Não por acaso, todos o adoram. Todos, menos seu próprio filho.
Will Bloom é um homem cético, cansado de ouvir as histórias mirabolantes de seu pai que sempre lhe parecem mentiras sem tamanho. O personagem, vivido por Billy Crudup chega a ser amargurado, não suportando a ideia de pai que lhe apresentam e chegando a ficar anos sem falar com este. Tudo o que ele quer é conhecer um pouco da verdade. Mas, afinal, o que é a verdade? Isso é o que Will vai descobrir aos poucos, podendo assim, quem sabe, se aproximar de seu pai que está doente.
A forma como o roteiro constrói essa relação de pai e filho, tendo a história de vida de Ed, e suas histórias maravilhosas, como pano de fundo é mesmo fascinante. Não apenas pela trama e metáforas, mas pela direção de arte imposta por Tim Burton, que sempre embarca nas imagens lúdicas e poéticas de um mundo estranho. A construção da bruxa, dos personagens do circo, das gêmeas japonesas, da cidade especial com seus sapatos no varal, das árvores atacando, da própria guerra. Tudo é um grande sonho bem arquitetado.
Tão bem arquitetado que, por vezes, nos deparamos com pistas e recompensas fascinantes como o noivo de Sandra Bloom que nos fora apresentado de alguma forma anteriormente. Ou a relação da menininha loira e a bruxa do destino. Assim como todas as relações entre verdade e fantasia que vamos percebendo ao longo do filme. E tudo isso, com um grand finale guardado a sete chaves a partir de uma frase tão simples e simbólica ao mesmo tempo: "então, é assim que eu morro".
O roteiro de John August, baseado no livro de Daniel Wallace, também traz boas ironias e construções cênicas como as pistas sobre Sandra que Ed vai recebendo a cada mês de trabalho no circo. "Ela vai para a faculdade", ou "ela gosta de Narciso", junto à composição de cena feita por Tim Burton e as expressões faciais de Ewan McGregor dão um toque ingênuo, irônico e engraçado ao mesmo tempo. É dessa química que Peixe Grande é feito e fascina plateias há anos.
Porque com tudo isso, não deixa de haver poesia, como na cena em que Ed vê Sandra pela primeira vez e o tempo pára. A construção imagética daquele momento, a aproximação aos poucos de Ed, os flagras possíveis com aquelas pessoas petrificadas, os efeitos que simples pipocas fazem no ar. Tudo é tão belo e bem construído que nos envolvemos com aquele ser e seus sonhos mais puros. E logo depois o encanto é cortado com ironia e risos, ao vermos o próprio tempo "ir em busca do tempo perdido". Nada pode ser mais fascinante que isso.
Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas é uma lição de amor. Amor à vida, aos sonhos, às histórias que transformam nossa realidade, por vezes tão simples, em algo grandioso e belo. É também o reencontro de alma, de mundos diversos. E principalmente, um resgate emocionante de uma relação de pai e filho que percebem que, para amar um ao outro, é preciso compreender sua visão de mundo. E, não tentar impor a que acreditamos ser a verdade, porque talvez, a verdade nem mesmo exista de fato e sejamos apenas aquilo em que acreditamos.
Peixe Grande e Suas Histórias Maravilhosas (Big Fish, 2003 / EUA)
Direção: Tim Burton
Roteiro: John August
Com: Ewan McGregor, Albert Finney, Billy Crudup, Jessica Lange, Helena Bonham Carter, Marion Cotillard e Alison Lohman
Duração: 125 min.