Kay e Arnold estão fazendo 31 anos de casados, mas parecem mesmo dois estranhos dividindo o mesmo teto. Todos os dias, Kay prepara o seu café e jantar, enquanto ele age roboticamente lendo jornal pela manhã e vendo programa de golfe pela noite até adormecer e ir para seu quarto. Dormindo em quartos separados, quase não tendo contato físico, nem mesmo uma intimidade natural, Kay apela para uma situação drástica: terapia de casal. O Dr. Feld promete, através de um tratamento intensivo, uma solução para o casamento, a questão é como Arnold vai se sentir em relação a isso.
Sendo um filme tão intimista e franco, chama logo a atenção a interpretação, principalmente do casal protagonista. Meryl Streep e Tommy Lee Jones conseguem uma química na falta de química de seus protagonistas. As expressões dela a cada tentativa frustrada de aproximação, a dele em cada incômodo nessa tentativa, os pequenos gestos nos fazem crer no que eles estão passando. Compreender até como amigos íntimos que acabam envolvidos e torcendo para que uma mágica se faça. E Steve Carell consegue uma boa dose de equilíbrio ao construir o terapeuta que tentará resolver o problema desse simpático casal.
Os detalhes dessa construção estão também na direção, é verdade. Desde o posicionamento em cena, onde um bom exemplo é o sofá do consultório do Dr. Feld. Na primeira sessão, ele está em uma ponta, ela na outra, completamente distantes. Após um exercício que dá certo, estão os dois juntos em uma das pontas. Após um exercício errado, estão novamente cada um em sua ponta. A falta de intimidade está nos detalhes. Na mão que fica no ar, na forma desajeitada de tentar um aconchego na cama, no olhar de decepção ou de felicidade com coisas simples, no nervosismo do jantar romântico, como se fosse a primeira vez.
A questão da falta de intimidade é tão evidente que os que os cercam percebem também com facilidade. Vide as expressões dos filhos no jantar de comemoração do aniversário de casamento. Ou a garçonete que deseja "boa sorte", ao ver a situação na mesa. Ou ainda pelos conselhos de transeuntes como "se seu casamento não vai bem, não é um jantar que irá salvar". E o mais impressionante na construção dos dois personagens é que, por mais que vejamos que são dois estranhos em uma situação impraticável, é visível que ambos se amam e querem continuar juntos. E a forma como essa questão vai sendo dosada no roteiro de Vanessa Taylor é muito inteligente por não exagerar nem no drama, nem na comédia pastelão.
Um Divã para Dois tem construções verdadeiras, em embaraços reais daqueles personagens que aprendemos a gostar. As cenas da fantasia sexual mesmo são muito bem construídas. O embaraço de ambos é totalmente crível. A forma como Meryl Streep se encolhe e se desnuda de vaidades, ao mesmo tempo em que Tommy Lee Jones está visivelmente desconfortável e quase não acredita quando a esposa diz não ter fantasias, é tocante. Assim como as piadas que se fazem de algumas dessas situações são bem realizadas. Tanto que não se torna ridículo, por exemplo, vermos Meryl Streep com uma banana na mão tentando treinar sexo oral.
Tudo é construído de uma maneira muito honesta, desnudando não apenas os personagens, mas muitos casais que vemos por aí. E os dois atores constroem isso com muita verdade, por isso, a identificação acaba tão forte. Torcemos para que eles possam nos provar que é possível continuar e encontrar a intimidade de uma relação plena. Para que o amor não seja apenas eterno enquanto dure, mas que possa existir mesmo um felizes para sempre. Nem que para isso seja mesmo necessária a ajuda de Um Divã para Dois.
Um Divã para Dois (Hope Springs, 2012 / EUA)
Direção: David Frankel
Roteiro: Vanessa Taylor
Com: Meryl Streep, Tommy Lee Jones e Steve Carell
Duração: 100 min