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Fausto
Fausto
Uma lenda, diversas adaptações, um famoso romance de Yuri Arabov, uma peça de Goethe. Fausto já foi muitas coisas, e nas mãos do russo Aleksandr Sokurov ele se torna uma obra inquietante que traz à tona toda a questão filosófica de seu personagem e o seu pacto com o demônio.
Médico, alquimista e cientista, Fausto busca incansavelmente descobrir onde se esconde a alma humana e o que seria exatamente isso. Com seu ajudante Wagner, ele disseca cadáveres e investiga a anatomia humana, sem conseguir saciar suas dúvidas mais profundas. Até que ele conhece um ser diabólico que promete mostrar todos os mistérios da humanidade. Ele começa a segui-lo sem muita certeza do que verá, até que descobre a bela Margarida que o levará a se envolver cada vez mais com o estranho ser que o cerca.
A composição de Aleksandr Sokurov, no entanto, não possui explicações tão cartesianas que nos possam interpretar Fausto de uma maneira tão exata. A sua vontade de transcender a imagem foi tanta que, em muitos momentos da ação do demônio, a tela se distorce em diversos níveis. O jogo da fotografia também é construído a partir de sombras e luzes. Muitos momentos vemos tudo quase na penumbra, em outros a luz estoura de uma maneira tal que quase não definimos os traços dos personagens.
É uma interpretação bastante particular do russo que já nos brindou com filmes como Arca Russa e que se auto-denomina um artista fortemente influenciado pelo impressionismo. Fausto é isso, um filme impressionista, em que as sensações interiores são mais fortes que a própria construção externa. Onde o arquétipo da alma humana ganha ainda mais força em sua eterna fantasia de ceder ou não a uma proposta das trevas em troca do que acha ser a sua felicidade. É também uma condenação. Já que, diante do desejo, o homem se torna frágil e acaba vivendo da ilusão de poder.
Mas, por toda essa filosofia e angústia, pela estética estranha aos olhos acostumados com o privilégio da imagem, Fausto é também um filme difícil. Cansativo em suas longas duas horas e quinze minutos. Faça objetivo ao roteiro, por mais que a falta de objetivos possa ser uma questão na construção do efeito pretendido. Não que isso torne o filme ruim, mas é pouco palatável às grandes plateias. Exige demais do público e precisa que este deseje embarcar na viagem filosófica de imagens estranhas.
E ninguém pode acusá-lo de tentar ludibriar com o que não promete. Aliás, a primeira cena da autópsia já demonstra a estética esperada. E, a cada viagem ao lado do ser estranho, temos novas investidas, experiências e experimentações de sensações. Um exercício cinematográfico incomum e nem sempre agradável.
Agradável e digno de aplausos, é a atuação de Anton Adasinskyi como o serzinho asqueroso que conduz nosso protagonista em sua jornada. Assim como Johannes Zeiler também está bem como o curioso médico. A dupla consegue momentos incríveis de interpretações intensas, em um duelo digno do texto proposto. Mergulham em seus personagens de uma maneira louvável, ainda que cause estranhamento algumas cenas como a do jato d´água.
Fausto não é então, um filme para grandes plateias. É uma experiência estética e emocional. Uma desconstrução filosófica em tela. Literalmente. Poderia ser menos longo e com diálogos mais eloquentes, talvez, ainda assim, uma obra digna. Só não sei se valeu o Leão de Ouro em Veneza que levou no ano passado.
Fausto (Faust, 2011 / Alemanha)
Direção: Aleksandr Sokurov
Roteiro: Aleksandr Sokurov
Com: Johannes Zeiler, Anton Adasinsky e Isolda Dychauk
Duração: 135 min.
Médico, alquimista e cientista, Fausto busca incansavelmente descobrir onde se esconde a alma humana e o que seria exatamente isso. Com seu ajudante Wagner, ele disseca cadáveres e investiga a anatomia humana, sem conseguir saciar suas dúvidas mais profundas. Até que ele conhece um ser diabólico que promete mostrar todos os mistérios da humanidade. Ele começa a segui-lo sem muita certeza do que verá, até que descobre a bela Margarida que o levará a se envolver cada vez mais com o estranho ser que o cerca.
A composição de Aleksandr Sokurov, no entanto, não possui explicações tão cartesianas que nos possam interpretar Fausto de uma maneira tão exata. A sua vontade de transcender a imagem foi tanta que, em muitos momentos da ação do demônio, a tela se distorce em diversos níveis. O jogo da fotografia também é construído a partir de sombras e luzes. Muitos momentos vemos tudo quase na penumbra, em outros a luz estoura de uma maneira tal que quase não definimos os traços dos personagens.
É uma interpretação bastante particular do russo que já nos brindou com filmes como Arca Russa e que se auto-denomina um artista fortemente influenciado pelo impressionismo. Fausto é isso, um filme impressionista, em que as sensações interiores são mais fortes que a própria construção externa. Onde o arquétipo da alma humana ganha ainda mais força em sua eterna fantasia de ceder ou não a uma proposta das trevas em troca do que acha ser a sua felicidade. É também uma condenação. Já que, diante do desejo, o homem se torna frágil e acaba vivendo da ilusão de poder.
Mas, por toda essa filosofia e angústia, pela estética estranha aos olhos acostumados com o privilégio da imagem, Fausto é também um filme difícil. Cansativo em suas longas duas horas e quinze minutos. Faça objetivo ao roteiro, por mais que a falta de objetivos possa ser uma questão na construção do efeito pretendido. Não que isso torne o filme ruim, mas é pouco palatável às grandes plateias. Exige demais do público e precisa que este deseje embarcar na viagem filosófica de imagens estranhas.
E ninguém pode acusá-lo de tentar ludibriar com o que não promete. Aliás, a primeira cena da autópsia já demonstra a estética esperada. E, a cada viagem ao lado do ser estranho, temos novas investidas, experiências e experimentações de sensações. Um exercício cinematográfico incomum e nem sempre agradável.
Agradável e digno de aplausos, é a atuação de Anton Adasinskyi como o serzinho asqueroso que conduz nosso protagonista em sua jornada. Assim como Johannes Zeiler também está bem como o curioso médico. A dupla consegue momentos incríveis de interpretações intensas, em um duelo digno do texto proposto. Mergulham em seus personagens de uma maneira louvável, ainda que cause estranhamento algumas cenas como a do jato d´água.
Fausto não é então, um filme para grandes plateias. É uma experiência estética e emocional. Uma desconstrução filosófica em tela. Literalmente. Poderia ser menos longo e com diálogos mais eloquentes, talvez, ainda assim, uma obra digna. Só não sei se valeu o Leão de Ouro em Veneza que levou no ano passado.
Fausto (Faust, 2011 / Alemanha)
Direção: Aleksandr Sokurov
Roteiro: Aleksandr Sokurov
Com: Johannes Zeiler, Anton Adasinsky e Isolda Dychauk
Duração: 135 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Fausto
2012-09-15T09:00:00-03:00
Amanda Aouad
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