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FICI: Corda Bamba
FICI: Corda Bamba
Baseado no livro homônimo de Lygia Bojunga Nunes, Corda Bamba é uma aventura interior de uma menina especial. Maria é uma equilibrista de um circo, filha de um casal de equilibristas que, de repente, tem que ir morar com a avó. Só que ela não entende muito bem o porquê disso e terá que embarcar em suas próprias memórias para compreender e superar um trauma.
A forma como o diretor Eduardo Goldenstein, em seu primeiro longa-metragem, adapta essa história é bastante feliz. Um tema tão intenso, tratado de uma forma verdadeira e simples para atingir crianças e adultos. Claro que há os truques comuns a qualquer roteiro infantil como o estereótipo da malvada, ou situações surreais hilárias como a "velha da história". Mas, nada que diminua o resultado, pelo contrário o torna mais belo. A metáfora do início com o velório do palhaço no número do circo também é bastante feliz.
Porque Corda Bamba não é feito de suspenses, mas de emoções. Ainda que não saibamos o que aconteceu com os pais de Maria, sua situação de órfã fica clara desde o princípio, assim como o fato dela estar traumatizada. Uma garota sem memórias, e suas memórias vão sendo representadas de uma forma bastante terapêutica através de portas em um corredor extenso. Primeiro em sonhos confusos, depois vão clareando em uma estrutura quase matemática toda vez que ela atravessa a janela em sua corda.
Maria precisa investigar a si mesma, romper o medo que a bloqueia de lembrar do passado. É interessante a forma como, a cada porta que abre, ela primeiro examina e reluta antes de entrar. E no momento-chave, chora desesperadamente querendo sair. Uma carga dramática tão forte que há de se admirar a garota Bia Goldenstein, filha do diretor, em seu primeiro trabalho. Convincente até mesmo na postura ao tentar se equilibrar na corda bamba.
O elenco também a ajuda, Gustavo Falcão e Georgiana Góes fazem seus pais. Augusto Madeira e Cláudio Mendes fazem o inusitado casal Foguinho e Barbuda, a Mulher Barbada. Stela Freitas é a avó que não consegue dar carinho à neta, apesar de querer lhe dar todo tipo de bens materiais. Todos bem em seus papéis, mas o destaque mesmo fica por conta de Silvia Aderne como a "velha da história". Um dos momentos mais cômicos e tristes ao mesmo tempo, pelo sub-texto da cena. Uma construção tragicômica na melhor utilização do termo e que a atriz nos dá um show de entrega e interpretação.
Corda Bamba consegue traduzir ainda uma realidade circense encantadora. Seja nas cenas do picadeiro ou nas brincadeiras de Foguinho na casa da avó de Maria, quando encanta os amigos de seu primo Quico com mágicas. A junção de circo e inconsciente é bastante feliz por nos remeter exatamente a esse processo interno da infância que não sabemos exatamente como explicar. E sem precisar de muitos recursos, Goldenstein consegue nos passar tudo isso.
E o diretor é bastante feliz também ao tentar atingir diversos públicos com as mais sutis e, às vezes, escancaradas referências cinematográficas. Quando vi a caixa de Foguinho sendo aberta no sonho de Maria e a câmera simplesmente entrar ali para sair no corredor de portas, lembrei logo de David Lynch em Cidade dos Sonhos. Mas, como não lembrar também de Alice, entrando na toca do coelho? E claro, toda vez que se fala em filme de circo, Fellini é a referência óbvia que também encontramos aqui. A mesa de aniversário de Maria com a velha da história também me trouxe à mente O Labirinto do Fauno. E tantas outras sensações construídas em música (O Poderoso Chefão, inclusive), fotografias, tons e temas.
Corda Bamba é essa interessante mistura. Um filme infantil, mas com uma temática adulta, construído em camadas que vão do raso onde crianças (mas, não muito pequenos, na faixa dos dez anos) se divertem e se emocionam, e adultos também podem ser levados por emoções e reflexões maiores.
Corda Bamba, história de uma menina equilibrista (idem, 2012 / Brasil)
Direção: Eduardo Goldenstein
Roteiro: Eduardo Goldenstein e George Moura
Com: Bia Goldenstein, Augusto Madeira, Cláudio Mendes, Gustavo Falcão, Georgiana Góes, Stela Freitas, Silvia Aderne e Joao Madeira
Duração: 80 min
A forma como o diretor Eduardo Goldenstein, em seu primeiro longa-metragem, adapta essa história é bastante feliz. Um tema tão intenso, tratado de uma forma verdadeira e simples para atingir crianças e adultos. Claro que há os truques comuns a qualquer roteiro infantil como o estereótipo da malvada, ou situações surreais hilárias como a "velha da história". Mas, nada que diminua o resultado, pelo contrário o torna mais belo. A metáfora do início com o velório do palhaço no número do circo também é bastante feliz.
Porque Corda Bamba não é feito de suspenses, mas de emoções. Ainda que não saibamos o que aconteceu com os pais de Maria, sua situação de órfã fica clara desde o princípio, assim como o fato dela estar traumatizada. Uma garota sem memórias, e suas memórias vão sendo representadas de uma forma bastante terapêutica através de portas em um corredor extenso. Primeiro em sonhos confusos, depois vão clareando em uma estrutura quase matemática toda vez que ela atravessa a janela em sua corda.
Maria precisa investigar a si mesma, romper o medo que a bloqueia de lembrar do passado. É interessante a forma como, a cada porta que abre, ela primeiro examina e reluta antes de entrar. E no momento-chave, chora desesperadamente querendo sair. Uma carga dramática tão forte que há de se admirar a garota Bia Goldenstein, filha do diretor, em seu primeiro trabalho. Convincente até mesmo na postura ao tentar se equilibrar na corda bamba.
O elenco também a ajuda, Gustavo Falcão e Georgiana Góes fazem seus pais. Augusto Madeira e Cláudio Mendes fazem o inusitado casal Foguinho e Barbuda, a Mulher Barbada. Stela Freitas é a avó que não consegue dar carinho à neta, apesar de querer lhe dar todo tipo de bens materiais. Todos bem em seus papéis, mas o destaque mesmo fica por conta de Silvia Aderne como a "velha da história". Um dos momentos mais cômicos e tristes ao mesmo tempo, pelo sub-texto da cena. Uma construção tragicômica na melhor utilização do termo e que a atriz nos dá um show de entrega e interpretação.
Corda Bamba consegue traduzir ainda uma realidade circense encantadora. Seja nas cenas do picadeiro ou nas brincadeiras de Foguinho na casa da avó de Maria, quando encanta os amigos de seu primo Quico com mágicas. A junção de circo e inconsciente é bastante feliz por nos remeter exatamente a esse processo interno da infância que não sabemos exatamente como explicar. E sem precisar de muitos recursos, Goldenstein consegue nos passar tudo isso.
E o diretor é bastante feliz também ao tentar atingir diversos públicos com as mais sutis e, às vezes, escancaradas referências cinematográficas. Quando vi a caixa de Foguinho sendo aberta no sonho de Maria e a câmera simplesmente entrar ali para sair no corredor de portas, lembrei logo de David Lynch em Cidade dos Sonhos. Mas, como não lembrar também de Alice, entrando na toca do coelho? E claro, toda vez que se fala em filme de circo, Fellini é a referência óbvia que também encontramos aqui. A mesa de aniversário de Maria com a velha da história também me trouxe à mente O Labirinto do Fauno. E tantas outras sensações construídas em música (O Poderoso Chefão, inclusive), fotografias, tons e temas.
Corda Bamba é essa interessante mistura. Um filme infantil, mas com uma temática adulta, construído em camadas que vão do raso onde crianças (mas, não muito pequenos, na faixa dos dez anos) se divertem e se emocionam, e adultos também podem ser levados por emoções e reflexões maiores.
Corda Bamba, história de uma menina equilibrista (idem, 2012 / Brasil)
Direção: Eduardo Goldenstein
Roteiro: Eduardo Goldenstein e George Moura
Com: Bia Goldenstein, Augusto Madeira, Cláudio Mendes, Gustavo Falcão, Georgiana Góes, Stela Freitas, Silvia Aderne e Joao Madeira
Duração: 80 min
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
FICI: Corda Bamba
2012-10-23T07:30:00-03:00
Amanda Aouad
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