
A trama é narrada por seu protagonista, Alexander DeLarge, o 655321, ou simplesmente Alex. Um jovem chefe de uma gangue que à noite espanca velhinhos na rua e invade casas alheias para estuprar e espancar seus moradores. Tudo com uma postura irônica assustadora, a ponto de cometer o ato de violência cantando "Singing in the Rain". Até que um dia, esse jovem é pego, condenado e aceita participar de um experimento que promete reenquadrá-lo na sociedade, o Experimento Ludovico. Após as sessões, Alex não consegue mais cometer nenhum ato de violência, mas não porque aprendeu, e sim, porque seu corpo o obriga a isso.

Seus pais são construídos como seres ainda mais estranhos. A forma como se comunicam e aceitam as desculpas do filho, sem nem ao menos saber o que este faz à noite nas ruas, chama a atenção. Mas, é quando Alex retorna para casa que a situação fica ainda mais insólita. Parece que o próprio conceito de instituição familiar também está caótica nesse futuro instável pós-Guerra Fria. Um futuro onde questões éticas são também coisa do passado, vide a frase de um dos médicos do instituto que diz "não nos preocupamos com a ética, mas com a diminuição da criminalidade".

E nessa constante inversão de valores acabamos confusos também, rejeitando todas as atitudes de Alex, da polícia, dos cientistas, dos pais, do velho, do partido, do dono da casa. Como não sentir a dor de Alex em seu desespero ao ouvir Beethoven como trilha sonora de uma das sessões de "tortura"? Ou mesmo quando é preso no quarto ouvindo a mesma música em uma altura tal que só lhe dá uma opção? A interpretação de Malcolm McDowell, claro, é fundamental para nos envolvermos com o personagem, mesmo em sua construção irônica inicial. Acabamos, mesmo sem querer, nos importando com aquele ser repugnante.

Esses e outros detalhes, fizeram de Laranja Mecânica um ícone cult, um mito maior até que a obra, arriscaria dizer. Mas que traz significados, metáforas e pensamentos que merecem mesmo revisões sempre, basta ultrapassar o superficial de que é um filme "violento", como os ingleses fizeram na época, levando Kubrick a proibir o filme no país. De qualquer maneira, um filme eterno. E que bom que continuam restaurando e cuidando para que não se perca para as futuras gerações.
Laranja Mecânica (A Clockwork Orange, 1971 / EUA)
Direção: Stanley Kubrick
Roteiro: Stanley Kubrick
Com: Malcolm McDowell, Patrick Magee, Michael Bates
Duração: 136 min.