Grandes Cenas: Será Que Ele É?
Aproveitando o filme O Concurso que tem uma referência a esta cena, resolvi analisar a cena do teste no filme Será Que Ele É?. Em primeiro lugar, é bom deixar claro que a cena brinca com estereótipos e, como toda cena de humor, exagera nas definições. Um homem não pode dançar? Claro que pode. Pode ser até bailarino profissional e não ser gay. A construção é apenas uma piada de que homem que é homem tem que ser grosseiro, "sem frescuras".
O filme, aliás, é uma brincadeira com tudo isso, ao abordar o drama do pacato professor de uma cidadezinha, às vésperas de seu casamento, que tem sua masculinidade posta a prova ao ser "homenageado" por um ex-aluno em um discurso de premiação do Oscar. Segundo o ex-aluno, o personagem de Kevin Kline teria sido sua inspiração para o personagem que lhe rendeu o prêmio porque ele era gay.
Sua vida vira um inferno. Todos começam a questionar a masculinidade daquele professor de língua inglesa, sempre arrumadinho e fã dos filmes de Barbra Streisand. Mesmo sua noiva começa a acreditar que isso possa ser verdade. Assim como seus pais. Desta maneira, Howard Brackett precisa provar de qualquer maneira que é homem e por isso se submete a este estranho teste de masculinidade. Mas, não se pode mesmo levar a sério um teste que é feito com uma fita K7 com uma narração tão efusiva. Ou pode?
A cena começa com Howard entrando em cada, assustado e pegando o pacote. Planos detalhes nos mostram o livro "Seja um homem, explore sua masculinidade" e a fita K7 sendo colocada no aparelho de som. Corta para um plano médio dele sentando em uma cadeira com o livro na mão. Toda a construção cênica é que traz o verdadeiro impacto da cena, a câmera vai apenas aproximando aos poucos, para que percebamos a tensão do protagonista. Mas, a expressão corporal do ator Kevin Kline diz tudo. Ele está sentado, tenso, de perna cruzada como uma mulher, roendo as unhas, com o livro no colo. À medida que responde às perguntas, deixa o livro na mesa e tenta parar de roer as unhas, mas seus gestos continuam afeminados. Tanto que, quando a gravação pergunta se ele é um homem, sua mão vira a munheca.
Temos o contra-plano com o gravador, onde ouvimos o locutor mandar ele se levantar. A câmera fica intercalando entre ele em pé, nervoso, querendo mostrar que é homem e o aparelho de som, como se estivesse mesmo ali uma pessoa conversando com ele. Tanto que a gravação "adivinha" tudo o que ele faz, a começar pelo "você é um bule?", por causa da mão na cintura. Ou quando ele tira apenas uma parte da blusa e acha ruim. Ou mesmo quando ele não entende o que é para fazer quando a gravação manda segurar "as partes". O mais engraçado é que isso não chega a ser um exagero, afinal, quem iria se submeter a um teste de masculinidade desses? Só mesmo um homem que tivesse gestos mais contidos ou afeminados. E nisso, entra o estereótipo de que já falamos. Um homem tem que ser grosseiro, desarrumado, quase um troglodita. O que, claro, não é verdade.
Chegamos à parte da dança, onde começa a tocar a música I Will Survive, que se tornou um símbolo homossexual. A missão é ouvir a música e não dançar. Percebemos que o plano está cada vez mais fechado no rosto de Kevin Kline, demonstrando sua tensão e esforço para não começar a dançar. Planos detalhes do seu corpo, principalmente cintura e pés vão demonstrando como ele não está conseguindo se segurar. A construção física enquanto a voz vai reforçando que ele não pode dançar, que ele vai resistir, é divertida por ser irônica.
Quando o plano fica o mais fechado possível no rosto do ator, é quando a música vai dar também a sua virada para entrar o refrão. E nesse ponto ele chega ao clímax e não resiste. A câmera foca o pé se debatendo e faz um travelling vertical simulando a própria erupção vulcânica em que seu corpo explode começando a dançar. A câmera dá, então, um zoom out e vemos o personagem dançando enlouquecidamente. A montagem rápida, no ritmo da música fica intercalando entre o plano inteiro e planos detalhes do corpo do ator Kevin Kline se remexendo.
Mais uma vez, a questão do estereótipo e exagero é explorada para fazer rir. Tanto na narração exagerada que diz coisas como "não dance, morda uma orelha, chute alguém", como se homem fosse bicho, quanto na própria dança, não precisava se soltar e remexer tanto só por ouvir uma música dentro de casa. É como se o personagem estivesse "possuído", tanto que quando a música pára, ele volta a si e fica inconformado. Isso simplesmente não existe. Mas, não deixa de ser divertido, uma alegoria que marca exatamente por brincar com o estereótipo de uma maneira descontraída.
Aqui a cena, pena que só encontrei dublada. A voz do dublador acaba exagerando no estereótipo afeminado ao contrário do tom de voz que Kevin Kline utiliza. Mas, a voz do locutor é boa.
O filme, aliás, é uma brincadeira com tudo isso, ao abordar o drama do pacato professor de uma cidadezinha, às vésperas de seu casamento, que tem sua masculinidade posta a prova ao ser "homenageado" por um ex-aluno em um discurso de premiação do Oscar. Segundo o ex-aluno, o personagem de Kevin Kline teria sido sua inspiração para o personagem que lhe rendeu o prêmio porque ele era gay.
Sua vida vira um inferno. Todos começam a questionar a masculinidade daquele professor de língua inglesa, sempre arrumadinho e fã dos filmes de Barbra Streisand. Mesmo sua noiva começa a acreditar que isso possa ser verdade. Assim como seus pais. Desta maneira, Howard Brackett precisa provar de qualquer maneira que é homem e por isso se submete a este estranho teste de masculinidade. Mas, não se pode mesmo levar a sério um teste que é feito com uma fita K7 com uma narração tão efusiva. Ou pode?
A cena começa com Howard entrando em cada, assustado e pegando o pacote. Planos detalhes nos mostram o livro "Seja um homem, explore sua masculinidade" e a fita K7 sendo colocada no aparelho de som. Corta para um plano médio dele sentando em uma cadeira com o livro na mão. Toda a construção cênica é que traz o verdadeiro impacto da cena, a câmera vai apenas aproximando aos poucos, para que percebamos a tensão do protagonista. Mas, a expressão corporal do ator Kevin Kline diz tudo. Ele está sentado, tenso, de perna cruzada como uma mulher, roendo as unhas, com o livro no colo. À medida que responde às perguntas, deixa o livro na mesa e tenta parar de roer as unhas, mas seus gestos continuam afeminados. Tanto que, quando a gravação pergunta se ele é um homem, sua mão vira a munheca.
Temos o contra-plano com o gravador, onde ouvimos o locutor mandar ele se levantar. A câmera fica intercalando entre ele em pé, nervoso, querendo mostrar que é homem e o aparelho de som, como se estivesse mesmo ali uma pessoa conversando com ele. Tanto que a gravação "adivinha" tudo o que ele faz, a começar pelo "você é um bule?", por causa da mão na cintura. Ou quando ele tira apenas uma parte da blusa e acha ruim. Ou mesmo quando ele não entende o que é para fazer quando a gravação manda segurar "as partes". O mais engraçado é que isso não chega a ser um exagero, afinal, quem iria se submeter a um teste de masculinidade desses? Só mesmo um homem que tivesse gestos mais contidos ou afeminados. E nisso, entra o estereótipo de que já falamos. Um homem tem que ser grosseiro, desarrumado, quase um troglodita. O que, claro, não é verdade.
Chegamos à parte da dança, onde começa a tocar a música I Will Survive, que se tornou um símbolo homossexual. A missão é ouvir a música e não dançar. Percebemos que o plano está cada vez mais fechado no rosto de Kevin Kline, demonstrando sua tensão e esforço para não começar a dançar. Planos detalhes do seu corpo, principalmente cintura e pés vão demonstrando como ele não está conseguindo se segurar. A construção física enquanto a voz vai reforçando que ele não pode dançar, que ele vai resistir, é divertida por ser irônica.
Quando o plano fica o mais fechado possível no rosto do ator, é quando a música vai dar também a sua virada para entrar o refrão. E nesse ponto ele chega ao clímax e não resiste. A câmera foca o pé se debatendo e faz um travelling vertical simulando a própria erupção vulcânica em que seu corpo explode começando a dançar. A câmera dá, então, um zoom out e vemos o personagem dançando enlouquecidamente. A montagem rápida, no ritmo da música fica intercalando entre o plano inteiro e planos detalhes do corpo do ator Kevin Kline se remexendo.
Mais uma vez, a questão do estereótipo e exagero é explorada para fazer rir. Tanto na narração exagerada que diz coisas como "não dance, morda uma orelha, chute alguém", como se homem fosse bicho, quanto na própria dança, não precisava se soltar e remexer tanto só por ouvir uma música dentro de casa. É como se o personagem estivesse "possuído", tanto que quando a música pára, ele volta a si e fica inconformado. Isso simplesmente não existe. Mas, não deixa de ser divertido, uma alegoria que marca exatamente por brincar com o estereótipo de uma maneira descontraída.
Aqui a cena, pena que só encontrei dublada. A voz do dublador acaba exagerando no estereótipo afeminado ao contrário do tom de voz que Kevin Kline utiliza. Mas, a voz do locutor é boa.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Grandes Cenas: Será Que Ele É?
2013-07-23T08:00:00-03:00
Amanda Aouad
Frank Oz|grandes cenas|Kevin Kline|
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