O média-metragem Jéssica Cristopherry foi lançado esse ano em uma pré-estreia para convidados e um mini-circuito pelo Beco dos Artistas, famoso espaço GLS em Salvador. O documentário narra o sonho de uma das diretoras do projeto (co-dirigido por Paula Lice, Rodrigo Luna e Ronei Jorge) de se tornar uma transformista. Agora ele segue pelo circuito de Festivais do país, em uma versão menor, de 13 min, com o nome de Jessy. Sua última indicação foi para o DOC Cachoeira que acontece entre 03 e 08 de setembro de 2013.
O curta Arremate foi lançado em 2012 e já percorreu um circuito de Festivais onde ganhou o Panorama Coisa de Cinema do Ano Passado e um Prêmio em Ilhéus, no 3º FECIBA. Agora, ele foi selecionado para um dos Festivais mais tradicionais do país: o Festival de Gramado. Confiante, apesar de não deslumbrado com a indicação, Luna abriu as portas de sua casa para uma conversa descontraída sobre o início de carreira, o curta e o Ciclo Salvador de Cinema, que produz junto com sua antiga produtora, a Domínio Público. Veja como foi.
- Como foi o seu início de carreira? Você sempre quis ser cineasta?
Luna: Eu acho que quis ser cineasta desde sempre, desde criança. Era uma meta que sempre tive. Minhas brincadeiras era brincando de ser cineasta. E aí na adolescência comecei a fazer teatro e conheci Matheus Rocha (Diretor de Fotografia - A Coleção Invisível) e no terceiro ano colegial a gente tentou fazer um filme, que deu super errado (risos). A gente não conseguiu terminar o filme. Mas tem coisas ótimas e a brincadeira rendeu.
- O que te atraía no audiovisual?
Luna: Eu sempre gostei muito de cinema. Uma coisa que sempre vi, desde criança. Cresci vendo filmes. Passei minha adolescência vendo filmes. Uma das formas de diversão da galera da escola era se reunir para ver filme e beber vodka. E sempre tive vontade de fazer, uma vontade que foi se definindo melhor com o tempo. Quero fazer cinema, não quero fazer TV, por exemplo.
- E quando você percebeu que não era mais uma brincadeira, que era sério mesmo?
Luna: Não sei se eu percebi ainda (risos), na real. O audiovisual é onde eu ganho dinheiro, já trabalho com isso tem bastante tempo, desde que eu comecei a produzir TV e tal. Hoje em dia eu ganho a vida com audiovisual. Filmo peça, edito e autoro DVD. Agora, profissionalização de cinema... Quando eu fiz o Dez Centavos, filme de César (Fernando de Oliveira) eu percebi que entendia de set. Foi a primeira vez que eu acabei sendo assistente de direção e nas reuniões prévias, visitando locação, eu percebi que já tinha uma bagagem. Uma bagagem que fui adquirindo de trabalhos que fui correndo atrás, uma coisa aqui e ali, que foi me ajudando.
- E você fez também muito videoclipe, certo?
Luna: Foi, foi mais ou menos nessa época que comecei a fazer. Na verdade videoclipe foi meio sorte da gente. A gente que falo é eu e Reure (Renato C. Gaiarsa) um brother que sempre fez as coisas junto comigo. A gente acabou colaborando com um clipe da Demoiselle, que é uma banda daqui. E daí, começou a fazer um clipe da Plane of Mine. A gente achou que ia para ajudar e, no meio do processo, percebemos que eles queriam que a gente dirigisse. Fizemos, e o clipe foi para Gramado. Foi assim que nós viramos diretores de videoclipe (risos).
- E essa experiência com videoclipe, te ajudou a fazer cinema?
Luna: Acho que sim, a gente sempre tentava narrar alguma coisa. Mesmo que não tivesse uma historinha com começo, meio e fim, a gente tentava contar alguma coisa. O Reure tinha uma Super VHS. Ele era da Católica (UCSal), eu era da Facom (Faculdade de Comunicação da UFBa), a gente se conheceu fazendo figuração de um filme de Manoel de Oliveira que filmaram aqui na Bahia, Palavra e Utopia, um diretor português. Todo mundo do cinema acabou fazendo figuração nesse projeto pra ver como era.
- Você criou a Domínio Público, sua antiga produtora, em que momento desse processo?
Luna: Foi uma época da minha vida em que eu conheci o Reinofy (Duarte) na faculdade de cinema da FTC, eu fiz meio semestre e ele fez dois terços do semestre, antes de largar (risos).
- Serviu para vocês se conhecerem (risos)?
Luna: Serviu para conhecer uma galera de cinema. E ver alguns filmes. Foi bom. Mas, eu tranquei porque tive um acidente na época. Mas, foi bom. E voltando à Domínio Público, o Reinofy tinha essa produtora que estava inativa. E caiu a ficha que a gente teria uma pessoa jurídica já com três anos de existência, que poderia participar de editais. Então, reativamos a empresa e acabou que tiveram alguns projetos bem legais. Alguns curtas e o Ciclo Salvador de Cinema que vai ter de novo esse ano. Eu saí da empresa porque surgiram outros projetos, outros caminhos que se abrem, mas a gente continua parceiro, tanto que vou participar do Ciclo.
- O curta Arremate é o seu primeiro trabalho como diretor cinematográfico?
Luna: Eu tô chamando o Arremate meu primeiro trabalho, porque foi o primeiro que a gente entrou nesse esquema de filme autoral mesmo, ficção. Mas, antes disso eu já tinha feito alguns documentários, o DVD do Cascadura, por exemplo, que não é videoclipe, mas um documentário que repassa a história da banda e entender o que é o disco. E tem os vídeos dança, coreógrafos que me chamaram para filmar esse tipo de filme, que é o vídeo arte.
- E o Arremate como surgiu?
Luna: O Arremate surgiu desde a época que comecei com Reure. Eu tinha lido o conto do Neil Gaiman, mostrei para o Reure, ele falou “vamos fazer”. E aí a gente começou a adaptar o roteiro que ficou gigante, tinha várias coisas. O Reure falou com os agentes do autor, descobrimos que ele liberava os direitos, desde que não tivesse lucro. Acabou que nunca rolou. Ficou na gaveta. Aí, o Reure foi para São Paulo e eu continuei trabalhando no roteiro. Eu gostava de ficar trabalhando em roteiros, ajustando. Hoje em dia não faço mais tanto isso. Mas, eu fui trabalhando para deixar ele mais sintético. Comecei a cortar quase tudo. No roteiro original ele saia, encontrava a telefonista, tinha até o Fim do Mundo. Mas, eu fui limpando até ficar o que é, apenas um ator em uma sala com o telefone. Cheguei a mostrar pro Reure, ele não gostou, disse que não era o filme a gente tava trabalhando, mas que eu deveria fazer. Só que continuou na gaveta. Depois de muitos anos, eu estava conversando com um grupo que estava pensando em fundar um coletivo de cinema, que acabou não acontecendo (risos). Mas, no meio da conversa, percebemos que já tínhamos os meios, só faltava um roteiro super barato com um ator em um apartamento. Aí, eu falei, "então, eu tenho esse roteiro". Mostrei Arremate e eles disseram, "vamos fazer".
- E como foi a construção dele, as referências, ou é algo mais intuitivo?
Luna: Tem várias referências. Na primeira reunião de pré-produção, o Jeronimo (Soffer, diretor de fotografia) falou o seguinte, "o Narcival é um ótimo ator, vem do teatro, a gente filma com duas câmeras e daí você vai montando do jeito que você quer". Aí eu falei, "não quero, não topo isso. Isso é videoclipe, isso eu já faço. Eu quero fazer cinema clássico, decupar, escolher tudo antes". "Então, vamos decupar", ele falou. Uma das referências que a gente pirou foi o Expressionismo Alemão, Caligari (o Gabinete do Dr. Caligari). Todos os planos são meio tortinhos, com sombras, são referências sutis. A ideia é que ninguém perceba mesmo, que fique só no inconsciente. E daí tem uma coisa que a gente tentou fazer que foi o efeito de Vertigo. Só que a gente não fez aproximando a câmera, a gente fez, assim, toda vez que tem um corte, a gente muda para outro plano e depois volta pro mesmo plano com outra lente. Então, você vai tendo a mesma proporção da cabeça, mas você vai percebendo mais o cenário no decorrer do curta. Começa muito fechado nele e vai abrindo. Isso foi milimetricamente pensado e decupado, no roteiro mesmo.
- E o Reure, acabou montando o filme?
Luna: Ele voltou para montar, mesmo não tendo gostado do roteiro como estava, eu falei que queria ele. E hoje ele ama o filme, vai pra Gramado (risos), fez questão de ir. Porque tem isso mesmo, tamo junto. Ele não é mais diretor, mas foi um ótimo montador, conseguiu fazer várias coisas e faz parte do projeto.
- O Arremate já ganhou o Panorama Coisa de Cinema de 2012 ...
Luna: O Panorama, o prêmio do Júri no Festival de Ilhéus, o 3º FECIBA...
- E agora, foi selecionado para Gramado. Como está a expectativa?
Luna: Não me deslumbro muito, mas, realmente, Gramado é um símbolo. É engraçado porque é o décimo Festival que o Arremate vai, já ganhou alguns prêmios, mas não teve a mesma repercussão que ir à Gramado. É um Festival Grande, com várias categorias, então, acho que é possível ganhar algum prêmio. Estou torcendo pelo Narcival, se ele voltar com o Kikito de melhor ator, já vou ficar feliz pra caramba, porque é o reconhecimento de um cara que foi super importante para o projeto. Os atores toparam fazer, sem financiamento e são incríveis.
- E o Jéssica (documentário média-metragem lançado esse ano), como está a carreira dele?
Luna: O Jéssica está no circuito dos Festivais também, já foi selecionado para dez festivais. Tanto na versão curta, quanto na versão de média que é a versão oficial, digamos assim. E por enquanto é isso. A gente está trabalhando desmembramentos, para a televisão, inclusive. Mas, estamos trabalhando nisso.
- E longa-metragem, já pensa em algum?
Luna: É a conversa que estou tendo com meus amigos hoje em dia. Já tenho os próximos curtas na cabeça, já tenho engatilhada outras ideias, mas falta a ideia do longa que é onde queremos chegar. Queremos estar fazendo filmes de longa-metragem, estreando nos cinemas, e tal. E isso não vai acontecer daqui há 5 anos, tem que começar hoje a trabalhar as ideias para daqui há alguns anos conseguir meter em um edital e conseguir fazer. É a meta. Mas, ainda é um sonho.
- E os projetos de agora?
Luna: Vou fazer um curta-metragem, “O menino da Gamboa”, que é um projeto do Peu (Pedro Perazzo), mas que eu fui crescendo no projeto. Eu era assistente de direção dele, na hora de escrever no edital, ele me colocou como diretor assistente e quando ele foi aprovado, ele disse “então, vamos dirigir juntos”. Tá faltando pouco, já estamos começando a pré-produção e a ideia é rodar ainda este ano, em dezembro.
- E o Ciclo Salvador de Cinema, quando será?
Luna: Final de outubro. A gente está fechando as oficinas ainda, mas quer fazer uma de Fotografia, outra de continuidade menor, uma de Projetos voltada para editais. A gente quer fazer uma também de atuação para cinema, mas aí depende de conseguir fechar as pessoas que a gente quer para ministrar. E tem outras ideias ainda.
- Naquele mesmo esquema na Caixa Cultural?
Luna: Isso, na Caixa Cultural, cursos gratuitos, com oficinas curtas de dois dias, três no máximo. Serão duas semanas nessa edição, não apenas uma, por isso, tem mais cursos e com durações diferentes.