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Dia dos Pais com Campo dos Sonhos
Dia dos Pais com Campo dos Sonhos
Dia dos Pais. Em vez de lista de filmes sobre pais, exemplos de pais, ou algo parecido com o que já fiz em outros anos, queria trazer um único exemplo. A princípio, pensei em algo para Grandes Cenas. Mas, analisar a escolhida em todos os aspectos não era o caso aqui. Quero falar mais da escolha narrativa, da forma como o roteiro nos leva a este final tão emocionante. Não precisa dizer que haverá spoilers, né? Então, se você nunca viu O Campo dos Sonhos e não quer perder a surpresa, não leia.
É extremamente interessante o fato de o verdadeiro roteiro de O Campo dos Sonhos só ser revelado no seu final. Não é o primeiro filme que faz isso, A Escolha de Sofia, por exemplo, ou mesmo o recente filme brasileiro O Som ao Redor seguem o mesmo caminho. Porque a sinopse do filme foca na trama do fazendeiro Ray Kinsella, vivido por Kevin Costner, que começa a ouvir uma voz misteriosa no milharal de sua fazenda "se você construir, ele virá". Sem entender o que é aquilo, Ray começa a ouvir a voz com cada vez mais frequência, até que tem a visão de um campo de golfe. É quando ele se lembra das histórias que seu falecido pai contava e imagina que precisa construir o campo para que os ídolos do baseball volte a jogar. Principalmente, Shoeless Joe Jackson, vivido por Ray Liotta que era o ídolo maior de seu pai e foi expulso do esporte após se envolver em uma trama de suborno.
Dito isso, à primeira vista, Campo dos Sonhos é um filme sobre um homem simples que consegue resgatar o espírito atormentado de outro, que fez uma escolha errada em sua carreira e tem a oportunidade de retornar ao esporte que amava. Não deixa de haver essa trama. Não apenas Shoeless, mas vários espíritos de jogadores diversos conseguem retornar através deste campo mágico. Como Archie Graham, que chegou a jogar profissionalmente, mas preferiu largar a carreira para ser médico. Inclusive, no filme, o seu personagem tem a oportunidade de refazer essa escolha e opta novamente pela medicina ao sair do campo para salvar a filha de Ray que tinha se engasgado na arquibancada.
Porém, o roteiro de Campo dos Sonhos esconde algo muito mais profundo. Um resgate muito maior entre um pai e um filho. Ray não sabia, mas o "ele" a quem a voz misteriosa se referia não era Shoeless, e sim, o seu pai. Um homem que ele amou, mas que teve pouca chance de conviver e até mesmo dizer. John Kinsella também tinha sido jogador de baseball, mas não seguiu a carreira. E o campo lhe dá essa oportunidade. Mas, mais do que isso, lhe dá a oportunidade de estar com o seu filho, ainda que não tenha consciência plena disso. É um resgate muito maior para Ray, que reconhece seu pai naquele corpo jovem, e até mesmo ingênuo ainda. E tem a oportunidade jogar com ele, como boa parte dos pais e filhos norte-americanos.
A cena da revelação traz uma carga emocional imensa. É no finalzinho do filme, quando a partida acaba e Shoeless vai se despedir de Ray. O jogador fica parado olhando para ele e a esposa. O fazendeiro não entende e pergunta o que aconteceu? Ele simplesmente diz: "se você construir..." e vira o rosto apontando em uma direção do campo completando "...ele virá". Não é preciso dizer muito, a câmera corta para o canto do campo apontado. Lá está o personagem de Dwier Brown, ainda com a máscara de apanhador, para criar suspense. Ele tira e olha na direção de Ray e ele entende. Aquele é o seu pai. E ele finalmente entende o verdadeiro significado da mensagem misteriosa e o complemento "alivie sua dor, percorra a distância". E é interessante como Shoeless vai indo embora displicentemente quando Ray pergunta se era ele. E Shoeless responde "não, Ray, era você".
Este é um ponto importante da mágica do filme. O além pode ter dado sua ajudinha, mas quem queria que tudo isso acontecesse era o próprio Ray. Era sua angústia, sua ferida interna, quase inconsciente de um pai ausente. Um pai que ele ansiava em rever e compartilhar momentos, apresentar sua filha, dividir angústias. Em toda a mística kármica presente no filme, é como se o próprio Ray tivesse materializado as visões para justificar a loucura de ir em busca de seu pai. Porque, no final, foi ele quem fez tudo aquilo acontecer. Arriscando as reservas financeiras de sua família, indo de encontro a tudo que fosse lógico.
E depois de tanto esforço ele observa aquele homem que um dia seria seu pai, mais jovem do que ele era agora e não sabe o que fazer. É como uma criança novamente, emocionada. Sua esposa sugere: apresente a neta a ele. E Ray segue de maneira quase instantânea. Sem revelar o segredo, claro. Já que o pai não tem consciência do todo. E isso torna a cena ainda mais emocionante, pois somos cúmplices de Ray nesse momento tão emocionante. Nós que já acompanhamos todo o percurso, as decisões difíceis, a loucura da construção do campo, os problemas financeiros, a mágica das pessoas verem os jogadores, os jogos pagos, até aquele momento em que tudo, finalmente, é explicado. Vemos a forma como ele tenta se aproximar sem se aproximar do pai.
Pai e filho caminham pelo campo ao pôr-do-sol, sem uma revelação explícita, mas como se uma afinidade fosse criada. É bonito de ver, de acompanhar. E John Kinsella, de certa forma, se explica ao filho. Fala do sonho realizado, da sensação de paraíso. Do próprio conceito de se há paraíso ou não. "O paraíso é onde os sonhos se tornam realidade", diz John e Ray completa que, então, aquele lugar é sim o paraíso. Afinal, todos os sonhos se tornaram realidade. E para fechar a cota de sonhos, ele chama o pai para uma "partida". Uma curiosidade é que no roteiro original a palavra "Dad" (pai) não era mencionada. Foi a platéia das primeiras exibições testes que consideraram fundamental. Talvez, não fosse, ficar implícito, nos tendo como testemunhas, é belo. Mas, ao explicitar a relação, acaba dando a entender que em alguma parte da consciência de John, ele sabe que aquele homem é o seu filho.
E isso é que torna Campo dos Sonhos tão especial e propício para o Dia dos Pais. Nos faz refletir sobre as nossas próprias relações com esse homem que ajudou a nos dar a vida. Sejam pais ausentes, pais presentes, pais que já se foram, pais companheiros. Eles também são fundamentais em nossa formação. Então, felicidades a todos eles.
É extremamente interessante o fato de o verdadeiro roteiro de O Campo dos Sonhos só ser revelado no seu final. Não é o primeiro filme que faz isso, A Escolha de Sofia, por exemplo, ou mesmo o recente filme brasileiro O Som ao Redor seguem o mesmo caminho. Porque a sinopse do filme foca na trama do fazendeiro Ray Kinsella, vivido por Kevin Costner, que começa a ouvir uma voz misteriosa no milharal de sua fazenda "se você construir, ele virá". Sem entender o que é aquilo, Ray começa a ouvir a voz com cada vez mais frequência, até que tem a visão de um campo de golfe. É quando ele se lembra das histórias que seu falecido pai contava e imagina que precisa construir o campo para que os ídolos do baseball volte a jogar. Principalmente, Shoeless Joe Jackson, vivido por Ray Liotta que era o ídolo maior de seu pai e foi expulso do esporte após se envolver em uma trama de suborno.
Dito isso, à primeira vista, Campo dos Sonhos é um filme sobre um homem simples que consegue resgatar o espírito atormentado de outro, que fez uma escolha errada em sua carreira e tem a oportunidade de retornar ao esporte que amava. Não deixa de haver essa trama. Não apenas Shoeless, mas vários espíritos de jogadores diversos conseguem retornar através deste campo mágico. Como Archie Graham, que chegou a jogar profissionalmente, mas preferiu largar a carreira para ser médico. Inclusive, no filme, o seu personagem tem a oportunidade de refazer essa escolha e opta novamente pela medicina ao sair do campo para salvar a filha de Ray que tinha se engasgado na arquibancada.
Porém, o roteiro de Campo dos Sonhos esconde algo muito mais profundo. Um resgate muito maior entre um pai e um filho. Ray não sabia, mas o "ele" a quem a voz misteriosa se referia não era Shoeless, e sim, o seu pai. Um homem que ele amou, mas que teve pouca chance de conviver e até mesmo dizer. John Kinsella também tinha sido jogador de baseball, mas não seguiu a carreira. E o campo lhe dá essa oportunidade. Mas, mais do que isso, lhe dá a oportunidade de estar com o seu filho, ainda que não tenha consciência plena disso. É um resgate muito maior para Ray, que reconhece seu pai naquele corpo jovem, e até mesmo ingênuo ainda. E tem a oportunidade jogar com ele, como boa parte dos pais e filhos norte-americanos.
A cena da revelação traz uma carga emocional imensa. É no finalzinho do filme, quando a partida acaba e Shoeless vai se despedir de Ray. O jogador fica parado olhando para ele e a esposa. O fazendeiro não entende e pergunta o que aconteceu? Ele simplesmente diz: "se você construir..." e vira o rosto apontando em uma direção do campo completando "...ele virá". Não é preciso dizer muito, a câmera corta para o canto do campo apontado. Lá está o personagem de Dwier Brown, ainda com a máscara de apanhador, para criar suspense. Ele tira e olha na direção de Ray e ele entende. Aquele é o seu pai. E ele finalmente entende o verdadeiro significado da mensagem misteriosa e o complemento "alivie sua dor, percorra a distância". E é interessante como Shoeless vai indo embora displicentemente quando Ray pergunta se era ele. E Shoeless responde "não, Ray, era você".
Este é um ponto importante da mágica do filme. O além pode ter dado sua ajudinha, mas quem queria que tudo isso acontecesse era o próprio Ray. Era sua angústia, sua ferida interna, quase inconsciente de um pai ausente. Um pai que ele ansiava em rever e compartilhar momentos, apresentar sua filha, dividir angústias. Em toda a mística kármica presente no filme, é como se o próprio Ray tivesse materializado as visões para justificar a loucura de ir em busca de seu pai. Porque, no final, foi ele quem fez tudo aquilo acontecer. Arriscando as reservas financeiras de sua família, indo de encontro a tudo que fosse lógico.
E depois de tanto esforço ele observa aquele homem que um dia seria seu pai, mais jovem do que ele era agora e não sabe o que fazer. É como uma criança novamente, emocionada. Sua esposa sugere: apresente a neta a ele. E Ray segue de maneira quase instantânea. Sem revelar o segredo, claro. Já que o pai não tem consciência do todo. E isso torna a cena ainda mais emocionante, pois somos cúmplices de Ray nesse momento tão emocionante. Nós que já acompanhamos todo o percurso, as decisões difíceis, a loucura da construção do campo, os problemas financeiros, a mágica das pessoas verem os jogadores, os jogos pagos, até aquele momento em que tudo, finalmente, é explicado. Vemos a forma como ele tenta se aproximar sem se aproximar do pai.
Pai e filho caminham pelo campo ao pôr-do-sol, sem uma revelação explícita, mas como se uma afinidade fosse criada. É bonito de ver, de acompanhar. E John Kinsella, de certa forma, se explica ao filho. Fala do sonho realizado, da sensação de paraíso. Do próprio conceito de se há paraíso ou não. "O paraíso é onde os sonhos se tornam realidade", diz John e Ray completa que, então, aquele lugar é sim o paraíso. Afinal, todos os sonhos se tornaram realidade. E para fechar a cota de sonhos, ele chama o pai para uma "partida". Uma curiosidade é que no roteiro original a palavra "Dad" (pai) não era mencionada. Foi a platéia das primeiras exibições testes que consideraram fundamental. Talvez, não fosse, ficar implícito, nos tendo como testemunhas, é belo. Mas, ao explicitar a relação, acaba dando a entender que em alguma parte da consciência de John, ele sabe que aquele homem é o seu filho.
E isso é que torna Campo dos Sonhos tão especial e propício para o Dia dos Pais. Nos faz refletir sobre as nossas próprias relações com esse homem que ajudou a nos dar a vida. Sejam pais ausentes, pais presentes, pais que já se foram, pais companheiros. Eles também são fundamentais em nossa formação. Então, felicidades a todos eles.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Dia dos Pais com Campo dos Sonhos
2013-08-11T08:00:00-03:00
Amanda Aouad
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