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Alemão
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Após o fiasco de Billi Pig, José Eduardo Belmonte precisava mostrar que o que vimos em Se Nada Mais Der Certo não era uma promessa não cumprida. E ele conseguiu fazer de Alemão um filme interessante, ainda que com problemas, principalmente no péssimo desenho de som que prejudica muito em algumas cenas.
A trama pega o mote das pacificações ocorridas no Rio de Janeiro para narrar a história de cinco policiais que trabalhavam disfarçados no Morro do Alemão. Por um descuido, os traficantes descobrem a identidade deles, que ficam presos em uma pizzaria local aguardando o desfecho, enquanto a polícia militar se prepara para invadir o morro.
A premissa é interessante e, até certo ponto, bem executada. A trajetória dos personagens é bem costurada com bons pontos de tensão, principalmente com a personalidade do personagem de Milhem Cortaz. Os cinco personagens ganham camadas, não são apenas cinco policiais genéricos confinados. Isso torna o jogo mais complexo e tenso. Eles não são soldados mandados agindo como comboio.
E os cinco atores também defendem bem cada um deles. Milhem Cortaz é de longe o melhor ator em cena, dando a Branco a intensidade necessária para assumir a liderança e guiar os acontecimentos de agora com seu código duvidoso. Caio Blat também se destaca como o garoto certinho e otimista, só não precisava o product placement do site Omelete em sua primeira cena. Já Otávio Muller dá ao Doca toda a frustração e cansaço que o personagem precisa. E Gabriel Braga Nunes e Marcello Melo Jr. completam bem o quadro como ex-corrupto Danilo e o apaixonado Carlinhos, respectivamente.
O personagem Carlinhos ainda traz mais uma camada para discussão sociológica do filme, digamos assim. O único negro do grupo, visivelmente foi o que mais sofreu enquanto disfarçado. Tanto que diz o tempo todo que levou porrada de polícia. É também o que cria um vínculo com alguém da favela, o que trará outras consequências. E, por isso, gera desconfianças entre os colegas de ter sido o "dedo-duro" da turma, tanto que fica algemado as primeiras 24 horas em que permanece no esconderijo. É interessante como o roteiro joga esses detalhes sem precisar de um discurso racial, deixando o espectador perceber.
Mas, se os policiais são bem construídos, os bandidos são genéricos. Principalmente o líder Playboy que ainda é prejudicado por uma interpretação ruim de Cauã Reymond. Uma pena, pois o ator já demonstrou ter capacidade de atuações melhores. Playboy e sua gangue, no entanto, parecem agir no automático. Mesmo com as duas tentativas de humanização com o caso de Mariana, que está presa junto aos policiais, ou da irmã do braço direito que é a paixão de Carlinhos. Nada parece natural, com frases feitas e estratégia padrão.
Porém, o que incomoda mesmo no filme é o desenho de som do mesmo. Completamente over e equivocado chega a prejudicar cenas, como a chegada de Carlinhos na pizzaria, ou o interrogatório do policial que tenta descobrir o que aconteceu com a operação. Isso sem falar no didatismo quase absurdo da hora do confronto quando a letra do MC Marechal nos narra "essa é a guerra, neguin". Colocada no início, ou apenas no final, teria um impacto muito melhor do que ali onde enfraqueceu a música e a cena.
Por falar em enfraquecer, um certo flashback também tirou muito da emoção final do filme. Porém, o encerramento com a virada dos créditos acaba sendo bem construído, nos dando outra visão do que José Eduardo Belmonte quis passar com esse filme. E ali, a música do MC Marechal caiu como uma luva, até por isso, sua execução poucos minutos antes foi tola.
No final, temos em Alemão um filme instigante, com boas ideias e má execução de outras. De qualquer forma, cumpre um papel de gênero e ainda discute, mesmo que de maneira vaga o retrato do nosso país atual. Menos pelo que vemos durante a ficção, mais pela forma como ele escolhe abrir e fechar sua trama com imagens reais bastante significativas, o anúncio do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016 com a comemoração nas areias de Copacabana, que de certa maneira "abre" as operações de pacificação. E a montagem final, que talvez demonstre as consequências de tudo isso.
Alemão (2014 / Brasil)
Direção: José Eduardo Belmonte
Roteiro: Gabriel Martins e Leonardo Levis
Com: Antônio Fagundes, Cauã Reymond, Caio Blat, Gabriel Braga Nunes, Marcello Melo Jr., Milhem Cortaz, Otávio Muller
Duração: 109 min.
A trama pega o mote das pacificações ocorridas no Rio de Janeiro para narrar a história de cinco policiais que trabalhavam disfarçados no Morro do Alemão. Por um descuido, os traficantes descobrem a identidade deles, que ficam presos em uma pizzaria local aguardando o desfecho, enquanto a polícia militar se prepara para invadir o morro.
A premissa é interessante e, até certo ponto, bem executada. A trajetória dos personagens é bem costurada com bons pontos de tensão, principalmente com a personalidade do personagem de Milhem Cortaz. Os cinco personagens ganham camadas, não são apenas cinco policiais genéricos confinados. Isso torna o jogo mais complexo e tenso. Eles não são soldados mandados agindo como comboio.
E os cinco atores também defendem bem cada um deles. Milhem Cortaz é de longe o melhor ator em cena, dando a Branco a intensidade necessária para assumir a liderança e guiar os acontecimentos de agora com seu código duvidoso. Caio Blat também se destaca como o garoto certinho e otimista, só não precisava o product placement do site Omelete em sua primeira cena. Já Otávio Muller dá ao Doca toda a frustração e cansaço que o personagem precisa. E Gabriel Braga Nunes e Marcello Melo Jr. completam bem o quadro como ex-corrupto Danilo e o apaixonado Carlinhos, respectivamente.
O personagem Carlinhos ainda traz mais uma camada para discussão sociológica do filme, digamos assim. O único negro do grupo, visivelmente foi o que mais sofreu enquanto disfarçado. Tanto que diz o tempo todo que levou porrada de polícia. É também o que cria um vínculo com alguém da favela, o que trará outras consequências. E, por isso, gera desconfianças entre os colegas de ter sido o "dedo-duro" da turma, tanto que fica algemado as primeiras 24 horas em que permanece no esconderijo. É interessante como o roteiro joga esses detalhes sem precisar de um discurso racial, deixando o espectador perceber.
Mas, se os policiais são bem construídos, os bandidos são genéricos. Principalmente o líder Playboy que ainda é prejudicado por uma interpretação ruim de Cauã Reymond. Uma pena, pois o ator já demonstrou ter capacidade de atuações melhores. Playboy e sua gangue, no entanto, parecem agir no automático. Mesmo com as duas tentativas de humanização com o caso de Mariana, que está presa junto aos policiais, ou da irmã do braço direito que é a paixão de Carlinhos. Nada parece natural, com frases feitas e estratégia padrão.
Porém, o que incomoda mesmo no filme é o desenho de som do mesmo. Completamente over e equivocado chega a prejudicar cenas, como a chegada de Carlinhos na pizzaria, ou o interrogatório do policial que tenta descobrir o que aconteceu com a operação. Isso sem falar no didatismo quase absurdo da hora do confronto quando a letra do MC Marechal nos narra "essa é a guerra, neguin". Colocada no início, ou apenas no final, teria um impacto muito melhor do que ali onde enfraqueceu a música e a cena.
Por falar em enfraquecer, um certo flashback também tirou muito da emoção final do filme. Porém, o encerramento com a virada dos créditos acaba sendo bem construído, nos dando outra visão do que José Eduardo Belmonte quis passar com esse filme. E ali, a música do MC Marechal caiu como uma luva, até por isso, sua execução poucos minutos antes foi tola.
No final, temos em Alemão um filme instigante, com boas ideias e má execução de outras. De qualquer forma, cumpre um papel de gênero e ainda discute, mesmo que de maneira vaga o retrato do nosso país atual. Menos pelo que vemos durante a ficção, mais pela forma como ele escolhe abrir e fechar sua trama com imagens reais bastante significativas, o anúncio do Rio de Janeiro como sede das Olimpíadas de 2016 com a comemoração nas areias de Copacabana, que de certa maneira "abre" as operações de pacificação. E a montagem final, que talvez demonstre as consequências de tudo isso.
Alemão (2014 / Brasil)
Direção: José Eduardo Belmonte
Roteiro: Gabriel Martins e Leonardo Levis
Com: Antônio Fagundes, Cauã Reymond, Caio Blat, Gabriel Braga Nunes, Marcello Melo Jr., Milhem Cortaz, Otávio Muller
Duração: 109 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Alemão
2014-03-18T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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