Até o Fim
Muitos filmes de naufrágios já foram feitos, com diversos pontos de vista, estilos, gêneros. Até o Fim é mais um deles, porém, o novato J.C. Chandor busca inovar em sua construção ao utilizar apenas um ator e nenhum diálogo. A ideia é interessante, com vários pontos positivos e um exercício de linguagem bom, mas que se torna cansativa.
O personagem de Robert Redford, que é creditado como "Our Man" (nosso homem), está em seu veleiro em pleno Oceano Índico, quando este bate em um container e tem o casco furado. Ele consegue remendar, mas esta não será a única adversidade que enfrentará em mar aberto, sem rádio, com poucos mantimentos e apenas um antigo equipamento marítimo e mapas para tentar sair daquela situação.
O que chama a atenção no filme é sua escolha contemplativa, onde um homem sozinho passa a maior parte do tempo calado, tentando sobreviver de uma maneira bastante controlada, quase uma fleuma instigante. Em apenas uma cena ele perde o equilíbrio e se desespera, mas logo retoma a calma e age sempre de maneira racional ao extremo. O filme é quase um tratado de como sobreviver no mar.
Outra coisa que a plateia pode estranhar é o fato de o filme não ter diálogos. Ouvimos a voz de Redford apenas três vezes em todos os 106 minutos. No monólogo inicial, onde ele escreve uma espécie de carta despedida. Quanto tenta se comunicar via rádio e na já citada cena em que perde o equilíbrio. Isso não quer dizer que o filme é mudo, claro. Além de toda a construção de som ambiente, a trilha pontual marca os momentos mais complexos na trajetória do personagem. Não por acaso, a única indicação ao Oscar do filme foi para Edição de Som.
E também por isso, muitos acreditavam na indicação de Robert Redford, que foi indicado ao Globo de Ouro. Mas, diante dos indicados e da também ausência de Tom Hanks, acho que seria complicado. Redford não está ruim, mas não sustenta tão bem o filme sozinho. Não exatamente por sua atuação, mas pela própria dificuldade do seu personagem que não tem picos de emoção em uma situação tão extrema. Ele está sempre ali, tentando controlar sua situação, ele não nos passa o desespero da tentativa de sobrevivência, na verdade, ele não fica desesperado e isso nos dá agonia.
Por outro lado, isso também traz outro viés, como já disse. Quase um tutorial de sobrevivência. Sabemos pouco desse homem, quase nada é verdade, nem o seu nome. Mas, ele tem uma família, tanto que escreve para ela. A cena da carta, por sinal, é acertadamente em silêncio, sem repetir em voz over o já dito. Sabemos que ama velejar, é metódico, inteligente, adora livros e outras obras de arte. É um homem sensível, mas também racional. Ele não se desespera, é verdade, mas ali isso não ajudaria mesmo. O que ele precisava era agir.
A fotografia é muito bem construída nos dando a dimensão da situação, mostrando aos poucos cada problema e nos guiando junto com o protagonista naquela situação limite. Mas, temos também algumas incongruências, como o buraco remendado que sobrevive tão bem a tempestades, enquanto outras partes do casco partem facilmente. Em determinado momento, o veleiro vira com a cabine aberta e quando retorna, ela está completamente seca. Isso sem falar em alguns detalhes da parte final que soam exagerados. Mas, a forma como termina, que vi alguns reclamando, acho bem escolhida.
Quem espera grandes emoções, roteiro bem encadeado, com padrões que se enquadrem em algum gênero, certamente vai estranhar a proposta de J.C. Chandor. Mas, há ali algo que nos deixa sempre juntos ao protagonista, presos ao barco, na expectativa de algo acontecer. Por isso, é uma experiência fílmica instigante, ainda que não nos surpreenda com algo espetacular.
Até o Fim (All Is Lost, 2013 / EUA)
Direção: J.C. Chandor
Roteiro: J.C. Chandor
Com: Robert Redford
Duração: 106 min.
O personagem de Robert Redford, que é creditado como "Our Man" (nosso homem), está em seu veleiro em pleno Oceano Índico, quando este bate em um container e tem o casco furado. Ele consegue remendar, mas esta não será a única adversidade que enfrentará em mar aberto, sem rádio, com poucos mantimentos e apenas um antigo equipamento marítimo e mapas para tentar sair daquela situação.
O que chama a atenção no filme é sua escolha contemplativa, onde um homem sozinho passa a maior parte do tempo calado, tentando sobreviver de uma maneira bastante controlada, quase uma fleuma instigante. Em apenas uma cena ele perde o equilíbrio e se desespera, mas logo retoma a calma e age sempre de maneira racional ao extremo. O filme é quase um tratado de como sobreviver no mar.
Outra coisa que a plateia pode estranhar é o fato de o filme não ter diálogos. Ouvimos a voz de Redford apenas três vezes em todos os 106 minutos. No monólogo inicial, onde ele escreve uma espécie de carta despedida. Quanto tenta se comunicar via rádio e na já citada cena em que perde o equilíbrio. Isso não quer dizer que o filme é mudo, claro. Além de toda a construção de som ambiente, a trilha pontual marca os momentos mais complexos na trajetória do personagem. Não por acaso, a única indicação ao Oscar do filme foi para Edição de Som.
E também por isso, muitos acreditavam na indicação de Robert Redford, que foi indicado ao Globo de Ouro. Mas, diante dos indicados e da também ausência de Tom Hanks, acho que seria complicado. Redford não está ruim, mas não sustenta tão bem o filme sozinho. Não exatamente por sua atuação, mas pela própria dificuldade do seu personagem que não tem picos de emoção em uma situação tão extrema. Ele está sempre ali, tentando controlar sua situação, ele não nos passa o desespero da tentativa de sobrevivência, na verdade, ele não fica desesperado e isso nos dá agonia.
Por outro lado, isso também traz outro viés, como já disse. Quase um tutorial de sobrevivência. Sabemos pouco desse homem, quase nada é verdade, nem o seu nome. Mas, ele tem uma família, tanto que escreve para ela. A cena da carta, por sinal, é acertadamente em silêncio, sem repetir em voz over o já dito. Sabemos que ama velejar, é metódico, inteligente, adora livros e outras obras de arte. É um homem sensível, mas também racional. Ele não se desespera, é verdade, mas ali isso não ajudaria mesmo. O que ele precisava era agir.
A fotografia é muito bem construída nos dando a dimensão da situação, mostrando aos poucos cada problema e nos guiando junto com o protagonista naquela situação limite. Mas, temos também algumas incongruências, como o buraco remendado que sobrevive tão bem a tempestades, enquanto outras partes do casco partem facilmente. Em determinado momento, o veleiro vira com a cabine aberta e quando retorna, ela está completamente seca. Isso sem falar em alguns detalhes da parte final que soam exagerados. Mas, a forma como termina, que vi alguns reclamando, acho bem escolhida.
Quem espera grandes emoções, roteiro bem encadeado, com padrões que se enquadrem em algum gênero, certamente vai estranhar a proposta de J.C. Chandor. Mas, há ali algo que nos deixa sempre juntos ao protagonista, presos ao barco, na expectativa de algo acontecer. Por isso, é uma experiência fílmica instigante, ainda que não nos surpreenda com algo espetacular.
Até o Fim (All Is Lost, 2013 / EUA)
Direção: J.C. Chandor
Roteiro: J.C. Chandor
Com: Robert Redford
Duração: 106 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Até o Fim
2014-03-12T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
aventura|critica|drama|J.C. Chandor|Robert Redford|
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