Grandes Cenas: Toy Story 3
Desde que saí do cinema em 2010, quis falar sobre essa cena, mas fui deixando para depois. Há muitas questões que a envolvem desde o significado do que Toy Story representou para a Pixar e para a animação que são coroadas com esta cena de uma maneira brilhante.
Em primeiro lugar, o primeiro filme da trilogia em 1995, mostrou os estúdios para o mundo e modificou a forma de se fazer animação no ocidente. Antes visto apenas como filmes infantis quase resumidos aos contos de fadas da Disney, com a Pixar e Toy Story, parece que descobrimos o que os orientais já sabiam faz tempo. É possível fazer uma animação que agrade a várias gerações, com camadas de texto para cada uma delas.
Brincar com o universo infantil e a fantasia de toda criança de que um brinquedo é quase como um amigo imaginário foi um bela premissa. Todos poderiam se identificar com a jornada de Woody e seu dono Andy. Da mesma forma que o ciúmes com a chegada de Buzz Lightyear é a ameaça do novo. Sentimento conhecido por qualquer um.
Em Toy Story 3, essa identificação vai além de uma maneira muito especial. Pois, se os adultos continuam relembrando a infância e as crianças se identificando com o que vivem, temos aqui um público muito especial. As antigas crianças que assistiram o primeiro Toy Story em 1995 e que agora, assim como Andy, cresceram e precisam se desapegar de seus brinquedos.
Por isso, a cena final do filme é tão forte. Não precisa dizer que a partir daqui teremos spoilers, certo? É a coroação de uma longa jornada de amizade e cumplicidade que precisava ser passada à diante. É lindo quando Woody percebe que precisa ajudar os amigos e, ao mesmo tempo, esquecer Andy. É ainda mais lindo quando Andy percebe isso, entregando seus antigos amigos para a garotinha Bonnie.
Ele vai até a casa da pequena com uma caixão nas mãos e para ao portão observando-a brincar. Ele parece se reconhecer ali, nela. Mas, o mais interessante é perceber que apesar de a mãe de Bonnie e Andy estarem conversando, a câmera está na altura da garotinha, nos mostrando a sua visão da cena.
E a altura padrão continua sendo a infantil, tanto que Andy se abaixa para conversar com Bonnie que, ainda desconfiada, como toda criança, se esconde entre as pernas da mãe. O plano se abre, mas continuamos na altura da criança, vendo Andy sentado no chão, as pernas da mãe e Bonnie observando o garoto abrir a caixa de brinquedos que quer oferecer a ela. "Alguém muito especial para cuidar deles".
Quando ele começa a apresentar os bonecos, uma música suave vai surgindo em B.G., ajudando na emoção. Bonnie vai andando desconfiada em direção a Andy e pega Jessie, a primeira a ser apresentada. Aos poucos ela vai ficando repleta de brinquedos, sempre com a música ao fundo e a voz de Andy apresentando cada um deles. Temos uma variação de planos aqui, por vezes fechando um close no boneco, outras pegando o rosto dos dois.
Buzz é o último que Andy apresenta, ele não pretendia dar Woody que pretendia levar com ele para a faculdade. Termina a apresentação e pede que Bonnie prometa cuidar bem de todos. Temos um plano com todos eles juntos e a voz de Andy em off dizendo que eles são importantes para ele. Isso já é um ponto emocional para os bonecos, que passaram o filme achando que tinham sido jogados no lixo.
Bonnie não responde, olha no fundo da caixa e vê Woody. Ela fala: "Meu cowboy" e Andy se assusta, não sabe o que o boneco faz ali. Ela continua: "tem uma cobra na minha bota", frase que Woody diz quando puxam uma cordinha dele. Ela ri e faz o gesto para pegar o brinquedo, Andy recua. Os dois se olham. Nesse momento, a câmera deixa de ser na altura de Bonnie, vemos câmera alta e câmera baixa, mostrando Andy maior que Bonnie. Ela está acuada, ele tem o poder.
Andy olha para Woody e fala emocionado que o boneco tem sido seu amigo desde sempre. E que o que o faz especial é que "ele nunca desiste de você". E nisso, temos um zoom fechando o close cada vez mais em Woody. Somos todos um pouco Andy ali, nos despedindo daquele amigo de três filmes.
Após esse discurso, a câmera abre novamente em um plano baixo, na altura de Bonnie e Andy pergunta se ela acha que pode cuidar do brinquedo para ele. Só aí, ela responde e ele concorda em dar o boneco. A passagem também é feita em plano detalhe, seguida de um abraço de Bonnie em Woody. Os dois começam a brincar com todos os bonecos. O BG sobe, mas as vozes ainda podem ser ouvidas, com os dois se divertindo com diversas aventuras.
Até que Andy vai embora. Parado ao lado do carro, ele dá uma última olhada e um tchau. Bonnie retribui o gesto, mas logo depois faz o boneco Woody dar um tchau também e vemos a expressão emocionada de Andy que entra no carro. Uma rápida passagem por todos eles, sem Bonnie, faz Andy agradecer por tudo. Quando Bonnie entra e o carro de Andy se afasta, vemos os bonecos "ganharem" vida e Woody dizer: "adeus, parceiro".
A emoção é grande porque a cena fala de uma amizade especial que qualquer pessoa conhece. Fala também de um rito de passagem da infância que é doloroso e necessário. Fala de despedidas. Mas, também fala de continuação da vida. Tudo isso construído com muita sensibilidade.
Não achei a cena original na internet, apenas essa com um mashup da música do final de Lost.
Em primeiro lugar, o primeiro filme da trilogia em 1995, mostrou os estúdios para o mundo e modificou a forma de se fazer animação no ocidente. Antes visto apenas como filmes infantis quase resumidos aos contos de fadas da Disney, com a Pixar e Toy Story, parece que descobrimos o que os orientais já sabiam faz tempo. É possível fazer uma animação que agrade a várias gerações, com camadas de texto para cada uma delas.
Brincar com o universo infantil e a fantasia de toda criança de que um brinquedo é quase como um amigo imaginário foi um bela premissa. Todos poderiam se identificar com a jornada de Woody e seu dono Andy. Da mesma forma que o ciúmes com a chegada de Buzz Lightyear é a ameaça do novo. Sentimento conhecido por qualquer um.
Em Toy Story 3, essa identificação vai além de uma maneira muito especial. Pois, se os adultos continuam relembrando a infância e as crianças se identificando com o que vivem, temos aqui um público muito especial. As antigas crianças que assistiram o primeiro Toy Story em 1995 e que agora, assim como Andy, cresceram e precisam se desapegar de seus brinquedos.
Por isso, a cena final do filme é tão forte. Não precisa dizer que a partir daqui teremos spoilers, certo? É a coroação de uma longa jornada de amizade e cumplicidade que precisava ser passada à diante. É lindo quando Woody percebe que precisa ajudar os amigos e, ao mesmo tempo, esquecer Andy. É ainda mais lindo quando Andy percebe isso, entregando seus antigos amigos para a garotinha Bonnie.
Ele vai até a casa da pequena com uma caixão nas mãos e para ao portão observando-a brincar. Ele parece se reconhecer ali, nela. Mas, o mais interessante é perceber que apesar de a mãe de Bonnie e Andy estarem conversando, a câmera está na altura da garotinha, nos mostrando a sua visão da cena.
E a altura padrão continua sendo a infantil, tanto que Andy se abaixa para conversar com Bonnie que, ainda desconfiada, como toda criança, se esconde entre as pernas da mãe. O plano se abre, mas continuamos na altura da criança, vendo Andy sentado no chão, as pernas da mãe e Bonnie observando o garoto abrir a caixa de brinquedos que quer oferecer a ela. "Alguém muito especial para cuidar deles".
Quando ele começa a apresentar os bonecos, uma música suave vai surgindo em B.G., ajudando na emoção. Bonnie vai andando desconfiada em direção a Andy e pega Jessie, a primeira a ser apresentada. Aos poucos ela vai ficando repleta de brinquedos, sempre com a música ao fundo e a voz de Andy apresentando cada um deles. Temos uma variação de planos aqui, por vezes fechando um close no boneco, outras pegando o rosto dos dois.
Buzz é o último que Andy apresenta, ele não pretendia dar Woody que pretendia levar com ele para a faculdade. Termina a apresentação e pede que Bonnie prometa cuidar bem de todos. Temos um plano com todos eles juntos e a voz de Andy em off dizendo que eles são importantes para ele. Isso já é um ponto emocional para os bonecos, que passaram o filme achando que tinham sido jogados no lixo.
Bonnie não responde, olha no fundo da caixa e vê Woody. Ela fala: "Meu cowboy" e Andy se assusta, não sabe o que o boneco faz ali. Ela continua: "tem uma cobra na minha bota", frase que Woody diz quando puxam uma cordinha dele. Ela ri e faz o gesto para pegar o brinquedo, Andy recua. Os dois se olham. Nesse momento, a câmera deixa de ser na altura de Bonnie, vemos câmera alta e câmera baixa, mostrando Andy maior que Bonnie. Ela está acuada, ele tem o poder.
Andy olha para Woody e fala emocionado que o boneco tem sido seu amigo desde sempre. E que o que o faz especial é que "ele nunca desiste de você". E nisso, temos um zoom fechando o close cada vez mais em Woody. Somos todos um pouco Andy ali, nos despedindo daquele amigo de três filmes.
Após esse discurso, a câmera abre novamente em um plano baixo, na altura de Bonnie e Andy pergunta se ela acha que pode cuidar do brinquedo para ele. Só aí, ela responde e ele concorda em dar o boneco. A passagem também é feita em plano detalhe, seguida de um abraço de Bonnie em Woody. Os dois começam a brincar com todos os bonecos. O BG sobe, mas as vozes ainda podem ser ouvidas, com os dois se divertindo com diversas aventuras.
Até que Andy vai embora. Parado ao lado do carro, ele dá uma última olhada e um tchau. Bonnie retribui o gesto, mas logo depois faz o boneco Woody dar um tchau também e vemos a expressão emocionada de Andy que entra no carro. Uma rápida passagem por todos eles, sem Bonnie, faz Andy agradecer por tudo. Quando Bonnie entra e o carro de Andy se afasta, vemos os bonecos "ganharem" vida e Woody dizer: "adeus, parceiro".
A emoção é grande porque a cena fala de uma amizade especial que qualquer pessoa conhece. Fala também de um rito de passagem da infância que é doloroso e necessário. Fala de despedidas. Mas, também fala de continuação da vida. Tudo isso construído com muita sensibilidade.
Não achei a cena original na internet, apenas essa com um mashup da música do final de Lost.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Grandes Cenas: Toy Story 3
2014-03-30T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
animacao|grandes cenas|infantil|
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