
O filme é dividido em duas partes, o treinamento do batalhão de fuzileiros navais comandadas pelo sargento Hartman. E a guerra em si, a partir da visão do correspondente Soldado "Joker".
Muitos criticam que parecem dois filmes, onde a segunda parte seria inferior pela força dos personagens apresentados na primeira. Discordo. Revendo o filme recentemente no cinema, parece ainda mais bem construída essas duas etapas. A ironia da preparação com a defrontação com a realidade é extremamente eficiente. Uma não funcionaria sem a outra. É nesse jogo de o que Hartman ensina e do que "Joker" aprende que está boa parte da maestria do filme.

A ironia também está presente no discurso e nos objetos de cena. Na primeira parte, nas letras das "músicas" que o sargento faz o batalhão cantar durante os treinos. Na segunda parte, nos cartazes e bonecos que compõem a cena na sala de reuniões. Esses detalhes fazem a cena final não parecer estranha ou mesmo gratuita, tudo vai sendo construído de uma maneira extremamente inteligente em seu subtexto.

Se não bastasse toda essa construção textual e de personagens, Kubrick ainda nos brinda com escolhas perfeitas em seu perfeccionismo já conhecido. Todos os enquadramentos da primeira fase são cuidadosamente encaixados como molduras claustrofóbicas. A forma como o sargento é filmado também com a câmera baixa amplia sua força, contrastando com a cena da virada. Já no Vietnã, vemos pouco de guerra e explosões, mas a expectativa é trabalhada de uma maneira instigante, nos mostrando a visão dos soldados escondidos.
Penúltimo filme de Kubrick, não por acaso, Nascido Para Matar é considerado por muitos sua obra-prima. Um filme bem construído que diz exatamente a que veio, nos brindando com cenas memoráveis.
Nascido Para Matar (Full Metal Jacket, 1987 / EUA)
Direção: Stanley Kubrick
Roteiro: Stanley Kubrick, Michael Herr e Gustav Hasford
Com: Matthew Modine, R. Lee Ermey, Vincent D'Onofrio
Duração: 116 min.