A história é instigante. José e Olívia são dois nômades devido aos trabalhos que exercem. Ela, produtora de moda, ele, fotógrafo, estão sempre viajando pelo mundo. Latitudes se aproveita dessa premissa para nos contar momentos de encontros e desencontros do casal, em oito cidades diferentes. A websérie teve oito episódios, um para cada cidade, assim como a televisão, que só acrescentou ao episódio online alguns minutos de bastidores do mesmo. Já o filme é uma compilação dois oito episódios com uma nova montagem para caber em 85 minutos.
Agora, por que eu falo que ela poderia ter ficado apenas como uma websérie? Porque não traz nada de novo, apenas a possibilidade de pegar novos públicos que não estão acostumados à internet. O episódio da televisão era uma compilação das coisas que estavam na internet, a parte da narrativa mais os ensaios e entrevistas que também poderiam ser encontrados no canal do Youtube. Não há uma extensão da narrativa, pensa-se a televisão apenas enquanto projeto com uma duração maior. Não acho inválido, apenas poderia ir além.
Já a versão cinematográfica traz problemas. É uma nova montagem dos oito episódios, editando algumas cenas, suprimindo outras para dar a sensação de uma curva dramática única. Mas, não é. A narrativa foi pensada para ser episódica, ao juntar tudo em um copião de 85 minutos fica estranho, repetitivo até. A rotina de José e Olivia perde muito do charme, principalmente pela mudança de ordem de alguns acontecimentos que nos dá um final enigmático, mas que perde a força que teve ao ser o final do primeiro episódio.
A composição poética do encontro de duas pessoas quase desconhecidas em hotéis impessoais que vão se envolvendo mesmo que estejam sempre se despedindo continua boa. Mas, parece que falta algo. Falta entender melhor esses dois e seus objetivos, talvez. Mas, mais do que isso, falta a naturalidade nas conversas. Ao cortar alguns respiros da websérie, os encontros dos dois parecem de dois pseudo-intelectuais que ao se encontrarem por acaso a cada cidade, sempre tentam ser rápidos, pois logo viajarão para outro lugar, preferem ficar filosofando sobre a vida em vez de curtir um ao outro.
É diferente da obra de Richard Linklater, por exemplo, onde Latitudes parece beber na fonte. Jesse e Celine conversam sobre a vida, filosofam sobre relações, mas estão ali, durante toda a projeção em um único lugar onde tudo vai transcorrendo com uma naturalidade impressionante. Já José e Olívia estão sempre saltando de uma cidade para outra e a sensação não é de continuação de uma conversa iniciada anteriormente, mas uma repetição cíclica que não ajuda a avançar em seus questionamentos. Os dois momentos em que estão longe um do outro acabam sendo os mais importantes para a evolução de ambos.
De qualquer maneira, Alice Braga e Daniel Oliveira conseguem passar naturalidade às personagens, demonstrando ainda uma boa química em cena. Mesmo que pouco seja dito ou demonstrado sobre a vida de José e Olívia, acabamos tendo a sensação de conhecê-los, porque vivenciamos seus sentimentos conflituosos e suas mudanças.
A fotografia também se destaca, com um bom trabalho de luz e sombras, além das cores em cada país de acordo com a estação do ano e o emocional das personagens. A direção também é cuidadosa, dando à Latitudes uma bela composição estética, ainda que lhe falte algo. A sensação que fica é que ela deveria continuar mesmo sendo apenas uma bela websérie. Mas, já valeu a tentativa.
Latitudes (Latitudes, 2014 / Brasil)
Direção: Felipe Braga
Roteiro: Felipe Braga
Com: Alice Braga, Daniel Oliveira, Elisa Volpatto, Michel Noher
Duração: 85 min.