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Kiko Goifman
Periscópio
Periscópio
Estranho, experimental, nonsense. Periscópio causa estranheza. Dois homens, um apartamento, um peixe, um periscópio na sala e uma cabra. Nada sabemos, nada importa, e também estranhamente, somos envolvidos por eles do início ao fim da projeção.
Muito do mérito do filme está na escolha dos atores, tivesse o diretor Kiko Goifman escolhido outros menos hábeis poderia cair no ridículo. Mas, tanto Jean-Claude Bernardet quanto João Miguel se exploram em cena. Beirando o Teatro do Absurdo, Eric e Élvio respectivamente brigam, quase de matam e depois se exibem para o estranho objeto que surge no meio da sala deles.
Quem são esses dois, não sabemos, assim como não temos ideia da relação entre eles. Apenas que não se suportam mais e vivem em um apartamento cheio de mofo em um prédio vazio. Existe vida fora dali? Tampouco sabemos. Ou mesmo porque estão isolados, ilhados naquele recinto. Talvez a metáfora da ilha seja mesmo o melhor caminho para algumas interpretações, já que é o periscópio que vem salvá-los. O que melhor do que um submarino para salvar náufragos?
O fato é que, com o surgimento do periscópio, o mistério se instala e as brigas cessam. Ambos começam a se exibir para a "coisa", construindo simulações de felicidade que vão desde uma simples dança, passando por peça com direito a cortina e tudo, até um banquete extravagante em uma espécie de ceia de Natal com peru e pratos doces e salgados diversos.
A experimentação das lentes é bastante curiosa, principalmente quando entra em cena o periscópio e muitos dos enquadramentos são visto pelo reflexo do objeto causando ainda mais estranhamento. Há uma bela cena também em que Élvio pinta um quadro de Eric, onde Kiko Goifman brinca com as sombras e reflexos de uma maneira criativa. Primeiro, vemos uma sombra na parede que parece um lobo pronto para dar um bote. Depois a cena abre e vemos toda a disposição cênica, até que a câmera caminha um pouco e começamos a ver o quadro sendo pintado no reflexo da janela atrás de João Miguel.
Curioso também o texto escrito pelo próprio diretor em parceria com Jean-Claude Bernardet. Pensamentos e frases que ficam no ar, sem terminar o raciocínio. Jogos de palavras, inclusive com frases ditas em inglês por João Miguel quando Élvio discute com o peixe Jack. Há uma discussão muito boa entre os dois logo no início onde cada um fala sem parar e sem ouvir o outro, criando uma angústia crescente.
Periscópio é, então, uma experiência exótica, que traz muitos elementos, uns mais outros menos trabalhados. Mas, é um jogo que nos envolve pelo sensorial e pela curiosidade do inusitado. Tudo fica meio no ar, mas também nem tudo precisa de explicação nessa vida.
Periscópio (Periscópio, 2012 / Brasil)
Direção: Kiko Goifman
Roteiro: Kiko Goifman e Jean-Claude Bernardet
Com: Jean-Claude Bernardet, João Miguel
Duração: 86 min.
Muito do mérito do filme está na escolha dos atores, tivesse o diretor Kiko Goifman escolhido outros menos hábeis poderia cair no ridículo. Mas, tanto Jean-Claude Bernardet quanto João Miguel se exploram em cena. Beirando o Teatro do Absurdo, Eric e Élvio respectivamente brigam, quase de matam e depois se exibem para o estranho objeto que surge no meio da sala deles.
Quem são esses dois, não sabemos, assim como não temos ideia da relação entre eles. Apenas que não se suportam mais e vivem em um apartamento cheio de mofo em um prédio vazio. Existe vida fora dali? Tampouco sabemos. Ou mesmo porque estão isolados, ilhados naquele recinto. Talvez a metáfora da ilha seja mesmo o melhor caminho para algumas interpretações, já que é o periscópio que vem salvá-los. O que melhor do que um submarino para salvar náufragos?
O fato é que, com o surgimento do periscópio, o mistério se instala e as brigas cessam. Ambos começam a se exibir para a "coisa", construindo simulações de felicidade que vão desde uma simples dança, passando por peça com direito a cortina e tudo, até um banquete extravagante em uma espécie de ceia de Natal com peru e pratos doces e salgados diversos.
A experimentação das lentes é bastante curiosa, principalmente quando entra em cena o periscópio e muitos dos enquadramentos são visto pelo reflexo do objeto causando ainda mais estranhamento. Há uma bela cena também em que Élvio pinta um quadro de Eric, onde Kiko Goifman brinca com as sombras e reflexos de uma maneira criativa. Primeiro, vemos uma sombra na parede que parece um lobo pronto para dar um bote. Depois a cena abre e vemos toda a disposição cênica, até que a câmera caminha um pouco e começamos a ver o quadro sendo pintado no reflexo da janela atrás de João Miguel.
Curioso também o texto escrito pelo próprio diretor em parceria com Jean-Claude Bernardet. Pensamentos e frases que ficam no ar, sem terminar o raciocínio. Jogos de palavras, inclusive com frases ditas em inglês por João Miguel quando Élvio discute com o peixe Jack. Há uma discussão muito boa entre os dois logo no início onde cada um fala sem parar e sem ouvir o outro, criando uma angústia crescente.
Periscópio é, então, uma experiência exótica, que traz muitos elementos, uns mais outros menos trabalhados. Mas, é um jogo que nos envolve pelo sensorial e pela curiosidade do inusitado. Tudo fica meio no ar, mas também nem tudo precisa de explicação nessa vida.
Periscópio (Periscópio, 2012 / Brasil)
Direção: Kiko Goifman
Roteiro: Kiko Goifman e Jean-Claude Bernardet
Com: Jean-Claude Bernardet, João Miguel
Duração: 86 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Periscópio
2015-09-18T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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