Grandes Cenas: A Era do Rádio
Em 1987, Woody Allen não manteve como de costume a tradição de lançar um filme por ano. Ele já tinha tido pausas em outros anos, é verdade. O que torna o ano especial é que, após dois grandes sucessos – A Rosa Púrpura do Cairo (1985) e Hannah e Suas Irmãs (1986) –, ele conseguiu ainda lançar dois no mesmo ano: o melancólico Setembro e A Era do Rádio, uma jornada doce e divertida pelas lembranças de sua infância, que se confundiam com a época áurea da mídia sonora. Muitos casos reais são retratados na obra, como a famosa narração de Orson Welles de A Guerra dos Mundos que fez pessoas se suicidarem achando que os alienígenas estavam mesmo invadindo o planeta. Ou o triste caso da garotinha que caiu em um poço.
O filme é uma declaração de amor ao rádio e suas personalidades. Assim como um retrato de uma época e de uma família judia bem particular onde o jovem Allen cresceu. Sempre guiados por sua voz em uma narração, vamos desvendando esse universo peculiar e suas histórias engraçadas, emocionantes e repleta de memórias. Mas se tem uma cena que marca este filme em especial é a sua abertura. As linhas seguintes contém spoilers da cena.
Em apenas dois minutos e quarenta, Woody Allen consegue construir o clima de sua obra, homenageando o rádio e nos divertindo com um caso, digamos, pitoresco. Dois ladrões invadem uma casa à noite e, enquanto estão assaltando, o telefone toca. É um programa de rádio que tem um quiz musical para eles. Os ladrões participam do quiz e vencem o prêmio máximo. A família retorna à casa e vê que bagunçaram tudo e ficam tranquilos porque eles levaram apenas algumas bobagens. O susto mesmo vem no dia seguinte, quando o caminhão da rádio estaciona com diversos móveis e eletrodomésticos que os ladrões tinham ganhado em seu nome.
A piada em si já é divertida. Traz uma ironia própria de Woody Allen, e sua narração falando sobre a surpresa no dia seguinte, por si só, já nos faz rir. A composição com a imagem do caminhão sendo descarregado e a família observando assustada é um plus. Ela, de certa maneira, nos mostra o clima de todo o filme. A história com humor, casos que parecem mentira e que tem o rádio como agente importante na vida daquelas pessoas. É isso que veremos por toda a projeção.
Essa cena tem ainda um toque genial, já que é praticamente toda construída através de sons. Os dois ladrões entram com lanternas, em uma casa escura. Vemos praticamente vultos deles e detalhes de suas bocas ao falar. Supomos e construímos a cena mais em nossa mente do que nos é mostrado em tela. É o toque genial da escolha da direção. Estamos ouvindo uma história, tal qual os ouvintes do rádio. São os sons, os diálogos, a narração, os efeitos, as músicas que nos contam aquilo.
Mesmo quando a cena corta para a Rádio, onde vemos uma orquestra e uma plateia, temos uma imagem quase estática. Apenas os músicos e o locutor fazem pequenos gestos. Nos ambienta e contrasta com a imagem na casa, mas é apenas um plus. A graça é mesmo construída pelos sons, assim como a narrativa. É como se Woody Allen quisesse abrir uma porta e nos introduzir naquele mundo onde as imagens ainda não contavam muitas histórias, muito menos da vida privada. A televisão era novidade e o cinema era espaço para grandes temas.
A Era do Rádio nos abre uma porta para a vida cotidiana que já vinha sendo desenvolvida por Allen em seus filmes desde Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1997). Nos mostra um pouco dele, mas também um pouco de uma época. E onde esse objeto tão cultuado centralizava de alguma maneira aquela rotina.
Confira a cena e divirta-se.
O filme é uma declaração de amor ao rádio e suas personalidades. Assim como um retrato de uma época e de uma família judia bem particular onde o jovem Allen cresceu. Sempre guiados por sua voz em uma narração, vamos desvendando esse universo peculiar e suas histórias engraçadas, emocionantes e repleta de memórias. Mas se tem uma cena que marca este filme em especial é a sua abertura. As linhas seguintes contém spoilers da cena.
Em apenas dois minutos e quarenta, Woody Allen consegue construir o clima de sua obra, homenageando o rádio e nos divertindo com um caso, digamos, pitoresco. Dois ladrões invadem uma casa à noite e, enquanto estão assaltando, o telefone toca. É um programa de rádio que tem um quiz musical para eles. Os ladrões participam do quiz e vencem o prêmio máximo. A família retorna à casa e vê que bagunçaram tudo e ficam tranquilos porque eles levaram apenas algumas bobagens. O susto mesmo vem no dia seguinte, quando o caminhão da rádio estaciona com diversos móveis e eletrodomésticos que os ladrões tinham ganhado em seu nome.
A piada em si já é divertida. Traz uma ironia própria de Woody Allen, e sua narração falando sobre a surpresa no dia seguinte, por si só, já nos faz rir. A composição com a imagem do caminhão sendo descarregado e a família observando assustada é um plus. Ela, de certa maneira, nos mostra o clima de todo o filme. A história com humor, casos que parecem mentira e que tem o rádio como agente importante na vida daquelas pessoas. É isso que veremos por toda a projeção.
Essa cena tem ainda um toque genial, já que é praticamente toda construída através de sons. Os dois ladrões entram com lanternas, em uma casa escura. Vemos praticamente vultos deles e detalhes de suas bocas ao falar. Supomos e construímos a cena mais em nossa mente do que nos é mostrado em tela. É o toque genial da escolha da direção. Estamos ouvindo uma história, tal qual os ouvintes do rádio. São os sons, os diálogos, a narração, os efeitos, as músicas que nos contam aquilo.
Mesmo quando a cena corta para a Rádio, onde vemos uma orquestra e uma plateia, temos uma imagem quase estática. Apenas os músicos e o locutor fazem pequenos gestos. Nos ambienta e contrasta com a imagem na casa, mas é apenas um plus. A graça é mesmo construída pelos sons, assim como a narrativa. É como se Woody Allen quisesse abrir uma porta e nos introduzir naquele mundo onde as imagens ainda não contavam muitas histórias, muito menos da vida privada. A televisão era novidade e o cinema era espaço para grandes temas.
A Era do Rádio nos abre uma porta para a vida cotidiana que já vinha sendo desenvolvida por Allen em seus filmes desde Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (1997). Nos mostra um pouco dele, mas também um pouco de uma época. E onde esse objeto tão cultuado centralizava de alguma maneira aquela rotina.
Confira a cena e divirta-se.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Grandes Cenas: A Era do Rádio
2016-05-14T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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