Minha Vida de Abobrinha
Uma criança órfã é levada por um policial para um orfanato onde começa a conviver com outras crianças com histórias tristes familiares. Uma, a mãe enlouqueceu, a outra, o pai matou a mãe e depois se suicidou por causa de uma traição, outra, a mãe foi deportada do país por ser estrangeira. Isso poderia ser retratado de diversas maneiras, algumas bem pesadas e tristes. Mas pelo olhar da criança, tudo parece mais leve.
Baseada no livro de Gilles Paris, a animação concorrente ao Oscar consegue construir essa linguagem simples e poética para problemas tão densos. Nada é escondido ou disfarçado. É quase como se o protagonista de Capitão Fantástico contasse a história, mas a maneira honesta e natural com que lida com essas tragédias acaba tornando a narrativa menos triste.
O protagonista, Icare, apelidado de Abobrinha, é o fio condutor da narrativa. Com medo de ter matado por acidente sua própria mãe, algo que o filme não deixa claro, mas dá a entender ser possível, ele vai parar nesse estranho orfanato onde a crianças criam laços familiares tão fortes que a saída de lá parece algo triste e não uma vitória.
Os valores da amizade e a capacidade de superar os problemas é talvez o grande trunfo da obra. É bonito acompanhar as descobertas dessas crianças e a maneira como aprendem a lidar com suas próprias tristezas. Não há muita aventura ou mesmo piadas, mas a trama consegue construir um ambienta agradável e divertido, principalmente em cenas como a festa de Halloween ou o passeio para conhecer a neve.
Toda feita em stop motion, a animação pode parecer pouco ágil em comparação as grande produções norte-americanas, mas há um ritmo próprio e envolvente que nos faz embarcar na trama. Talvez, as crianças menores não tenham paciência para ela, já que se conectam mais com a ação do momento e menos com a história que está sendo contada, mas as crianças acima da idade pré-escolar podem se conectar principalmente pelos sentimentos de amizade e amor paterno.
Talvez, os adultos é que acabem se encantando mais ao embarcar nos temas abordados. Há uma força própria na história de órfãos e no sonho familiar. E o fato de que todas lidarem com pais problemáticos seja um tema pesado, pela honestidade com que lida, fique mais fácil de lidar. O próprio fato da mãe de Abobrinha ser alcoolista e ele poder ter provocado sua morte ao fechar a porta do sótão é algo a se pensar.
Minha Vida de Abobrinha não é uma animação infantil, apesar de tratar de uma perspectiva infantil e ter uma conexão com elas. É daquelas obras que nos surpreendem e são capazes de atingir diversos públicos através de suas camadas. Não por acaso foi o candidato da Suíça à vaga de melhor filme em língua estrangeira no Oscar, algo que o Brasil também deveria ter feito na época de O Menino e o Mundo. Não foi selecionado, mas entrou em melhor animação. E só por isso, já conseguiu um destaque internacional merecido.
Minha vida de abobrinha (Ma vie de Courgette, 2017 / Suíça / França)
Direção: Claude Barras
Roteiro: Céline Sciamma, Germano Zullo, Claude Barras, Morgan Navarro
Duração: 66 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Minha Vida de Abobrinha
2017-02-09T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
animacao|cinema europeu|Claude Barras|critica|oscar 2017|
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