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O Animal Cordial
O Animal Cordial
Primeiro longa-metragem de Gabriela Amaral Almeida como diretora, O Animal Cordial tem muito das caraterísticas que a cineasta já vinha trabalhando em seus curtas. O gênero de terror, claro, mas com doses de humor irônico que traduzem um pouco da crítica social que suas obras evocam. Em suas diversas camadas, entre referências e metáforas, a obra vai ecoando em nós por muito tempo.
Em sua estrutura superficial, temos um terror bem contado, sem muitas novidades. Um restaurante em local afastado em seu final de expediente atende os últimos clientes quando dois assaltantes atrapalhados invadem o local. Sem querer prejudicar a fama do seu estabelecimento, Inácio, interpretado por Murilo Benício, decide não chamar a polícia e tomar suas próprias medidas que vão escalando em absurdos e violências fechados naquele local.
O domínio da técnica cinematográfica é evidente. A maneira como Gabriela Amaral Almeida lida com a construção de efeitos do filme é sensível. Não é um filme para dar sustos, mas para nos construir uma empatia ao mesmo tempo que somos apenas observadores de tudo aquilo. Ainda que Inácio e a garçonete Sara, vivida por Luciana Paes pareçam os protagonistas, já que é a partir deles que a narrativa anda, é com o cozinheiro Djair, interpretado por Irandhir Santos, que nos identificamos. Seu olhar parece representar a plateia ou ao mesmo é o que queremos que seja.
De maneira plástica e cuidadosa, a diretora vai nos envolvendo naquele drama, repleto de sangue, mas que não chega a flertar com o grotesco. É plasticamente bonito até, como Tarantino tanto faz em suas obras, usando a violência como um elemento artístico que nos faz pensar. São situações e gestos aparentemente banais que acabam por nos dar ótimos estudos da natureza humana.
E aí está o ponto alto do filme, a começar pelo título que traz a mistura de conceitos do "homem cordial", que Sérgio Buarque de Holanda discute em Raízes do Brasil, com o "Animal político", de Aristóteles, na busca em conceituar um cidadão. O Animal Cordial acaba sendo essa mistura insólita que se tornou o próprio povo brasileiro construído pelo viés português e exploração de índios e negros que ainda hoje se reflete na nossa imensa desigualdade social.
A partir disso, o filme vai ganhando outros significados que vão além da simples produção de efeitos de um filme de terror clássico, ainda que o terror tenha sido muito utilizado para discutir política e sociedade. Vide o próprio Expressionismo Alemão. O fato é que o filme se passa em um restaurante que se chama La Barca, traz uma disputa de classes muito clara com os empregados, o dono do restaurante, os assaltantes e os clientes ricos. No meio disso, a garçonete que deseja ascender socialmente.
Na personagem de Sara muito da chave da trama, em suas diversas camadas, encontra-se. E Luciana Paes consegue passar com muita competência toda a sua complexidade. Nos pequenos detalhes, vamos compreendendo suas nuanças e enriquecendo a experiência. Encontra pilares no próprio Murilo Benício, que defende bem seu "patrão" psicopata, e Irandhir Santos, que é meio que a voz dos reprimidos dentro daquela embarcação. Destaque ainda para Camila Morgado e Humberto Carrão, também saindo de estereótipos.
O Animal Cordial nos apresenta um estudo preciso sobre uma sociedade complexa e suas nuances. Escala a narrativa na estrutura do absurdo para através de metáforas nos trazer uma realidade dura que nos encara todos os dias. Com tintas de sangue, Gabriela pinta racismo, machismo e diferenças sociais com uma impressionante técnica que nos faz pensar e continua ecoando em nossa mente.
Filme visto no XIII Panorama Internacional Coisa de Cinema.
O Animal Cordial (O Animal Cordial, 2017 / Brasil)
Direção: Gabriela Amaral Almeida
Roteiro: Gabriela Amaral Almeida
Com: Murilo Benício, Luciana Paes, Irandhir Santos, Camila Morgado, Jiddu Pinheiro, Ernani Moraes, Humberto Carrão, Diego Avelino, Thais Aguiar
Duração: 96 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
O Animal Cordial
2017-11-23T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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