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Pequena Grande Vida
Pequena Grande Vida
Há algo em Pequena Grande Vida que instiga. Como toda obra de Alexander Payne (Nebraska, Os Descendentes), nos faz pensar sobre a natureza humana, suas escolhas e sua relação com a sociedade e planeta. Mas parece que algo se perde no caminho.
Paul Safranek é um terapeuta ocupacional, classe média estadunidense que vê em uma invenção científica a chance de mudar de vida. Preocupados com o impacto ambiental causado pela humanidade, cientistas noruegueses descobrem uma forma de reduzir os seres humanos, criando micro-comunidades. Aqueles que aceitam passar pelo procedimento são vistos como "salvadores do planeta", tendo regalias, alega o programa. Porém, ao aceitar ser reduzido, Paul vai descobrir outras questões que não "venderam" na propaganda.
A estrutura base do roteiro se concentra em Paul e sua jornada, mas ele não é o que tem de mais instigante no universo ficional, talvez isso seja um dos pontos que faz o filme não funcionar tão bem quanto outras obras de Payne. Na verdade, o protagonista é pouco construído, um homem de bom coração, com um talento nato para a medicina, mas que se deixa levar pela vida, ou melhor, pelas mulheres que o cercam. Primeiro sua mãe, depois sua esposa, por fim a simpática Ngoc Lan Tran que conhece na cidade miniatura.
A camada mais interessante da premissa está na ironia da situação. Há camadas críticas que são apenas pinceladas na trama, como a própria ideia de diminuir a humanidade para diminuir o problema. Os cientistas noruegueses tinham a sua intenção nobre de salvar o planeta, o problema é que isso foi deturpado de diversas maneiras. A mais óbvia está na questão econômica. O processo se torna tentador para uma classe média que ganha a promessa de uma "vida de rico" eterna, já que uma pequena poupança pode virar uma fortuna no mundo micro. E o curioso é que os que ficam, tem uma visão de que isso acaba quebrando a economia "dos grandes".
A questão da "propaganda enganosa" e a sedução pelo dinheiro fácil acaba esvaziada com as reviravoltas na vida de Paul. Surgem outras camadas, é verdade, como o abuso de poder sobre grupos menos favorecidos, como veremos a partir da questão vietnamita ou mesmo a desconstrução das causas ecológicas em uma nova visita à Noruega. Ser pequeno ou grande se torna indiferente quando tudo o que passamos a ver é o mundo pequeno, suas dificuldades, desigualdades e até mesmo corrupções. Mas tudo isso acaba se tornando pano de fundo pouco desenvolvido ao focar na relação dele com a engraçada e mandona Ngoc Lan Tran.
Paul não é um protagonista que nos ganha completamente. Matt Damon faz a sua parte, mas não parece mesmo existir elementos suficientes para comprarmos sua ideia. A própria Ngoc Lan Tran, interpretada muito bem por Hong Chau, parece uma personagem mais instigante, ainda que muitas vezes fique apenas na camada do estereótipo. Outro estereótipo é o vizinho Dusan Mirkovic que traz Christoph Waltz mais uma vez no papel do estrangeiro falastrão.
Alexander Payne joga os elementos em tela, mas não os aproveita bem, construindo um arco para o seu protagonista que faz a trama se tornar apenas mais uma comédia romântica com direito a clichês no final. Há momentos incríveis como a apresentação da cidade feita por Neil Patrick Harris e Laura Dern ou a revelação do bairro onde vive Ngoc Lan Tran. Isso sem falar de algumas piadas visuais que brincam com as duas dimensões, como os enfermeiros conversando, a festa da faculdade, a rosa ou a pedra na caverna.
Com uma ótima premissa, Pequena Grande Vida tinha potencial para muito mais. Não deixa de ter seus bons momentos, mas fica uma sensação de frustração no final diante de tudo que seu diretor já nos apresentou.
Pequena Grande Vida (Downsizing, 2018 / EUA)
Direção: Alexander Payne
Roteiro: Alexander Payne, Jim Taylor
Com: Matt Damon, Christoph Waltz, Hong Chau, Kristen Wiig, Rolf Lassgård
Duração: 135 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Pequena Grande Vida
2018-02-19T08:30:00-03:00
Amanda Aouad
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