
Depois de dirigir dois documentários (O Relógio do Meu Avô, Macaco Tião), Alex Levy-Heller faz a sua primeira ficção, flertando com o gênero de horror, mas sem perder muito da marca documental. Christabel, baseado no poema narrativo de Samuel Taylor Coleridge, é uma fábula sobrenatural, mas o seu ritmo traz um olhar contemplativo que constrói uma atmosfera realista na rotina de uma fazenda, onde a protagonista vive com o pai.
Esperando o noivo que foi levar uma boiada para vender, Christabel encontra, caída no meio do mato de sua fazenda, Geraldine, uma mulher misteriosa que diz ter sido sequestrada e violentada por homens que podem voltar a qualquer momento. A jovem a leva para casa e cuida dela, fazendo com que sua rotina e de seu pai se modifique em diversos aspectos.
A direção traz duas abordagens estéticas que se harmonizam de maneira instigante na trama. Uma mais realista nos mostra a rotina de pai e filha, representada, principalmente, pela mesa da cozinha onde fazem suas refeições. Há um ritmo mais lento, contemplativo, quase documental, que funciona com a proposta, mas que em determinado momento acaba por cansar, deixando o filme extenso em excesso com suas quase duas horas de projeção.

Não por acaso, a fotografia da obra é um dos destaques. A construção de efeitos é bem pensada, nessa diferenciação de filtros e planos, ajudando na narrativa. Aproveitam bem também a beleza da passagem natural, para estimular essa proposta contemplativa, com as personagens admirando a natureza em diversos momentos. O filme, inclusive, chama a atenção para isso, quando Geraldine bate palmas para a "obra de Deus".
A fotografia funciona também como metáfora de sentimentos e ações, como quando mostra o pai em um barco pescando e um plongée da a dimensão dele em relação ao rio, demonstrando sua pequenez e fragilidade. Em outra cena, o enquadramento do rio, tendo uma mão segurando um terço em primeiro plano e mostrando esse terço ser largado, traz uma solução visual para explicar mudanças de sentimentos.
A direção de atores também se destaca, fazendo as personagens trazerem verdade para a tela, ainda que muitas situações parecem pouco verossímeis ou mal estruturadas no roteiro. Há ainda incoerências no próprio discurso da obra em relação ao relacionamento de Christabel e Geraldine, que nos traz questões sobre a própria sexualidade, os tabus religiosos e as fantasias sobrenaturais. O mito que se utiliza, no entanto, é bem desenvolvido, sem precisar explicitar demais o que de fato é Geraldine. A maneira sutil como vai se revelando e a parte final, onde não resta mais dúvidas, é bem resolvida.
De qualquer maneira, Christabel traz o poema inglês para o interior do Brasil de uma maneira competente. Diferenciando-se da versão fílmica de 2001, dirigida por James Fotopoulos, trazendo marcas do seu diretor e construindo uma trama envolvente, ainda que cansativa por sua longa extensão. Poderia ser mais sintética, mas ainda assim é uma obra que instiga.
Filme visto no 22º Cine Pe.
Christabel (Christabel, 2018 / Brasil)
Direção: Alex Levy-Heller
Roteiro: Alex Levy-Heller
Com: Mila Fernandez, Julio Adrião, Nill Marcondes, Alexandre Rodrigues.
Duração: 113 min.