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Dor e Glória
Dor e Glória
Cineasta espanhol mais conhecido e também mais polêmico, Almodóvar possui uma veia melodramática típica dos latinos. Mesmo quando busca tons mais frios como em Má Educação ou A Pele que Habito, a forma de atingir a emoção do público passa sempre pelo gênero popular. Após dois filmes pouco empolgantes, Dor e Glória parece ter reacendido uma chama do velho cineasta trazendo uma obra pulsante e, claro, repleta de emoções.
Há muito de Almodóvar na obra. Não apenas suas famosas cores, em especial nos objetos de cena, como o sofá e artefatos da casa de Salvador. Há também atores que lhe são caros como Antonio Banderas, que sempre foi seu preferido, tendo participado de diversas fases de sua filmografia. Ou Penélope Cruz ou Julieta Serrano que já trabalharam com ele em cinco filmes cada. E há referências claras a sua própria trajetória, não apenas pelo protagonista ser um famoso cineasta espanhol.
Não chega a se uma auto-biografia, mas a inspiração parece clara. E Antonio Banderas é extremamente sensível ao dar vida a esse homem com todas as suas nuanças, sem construir uma caricatura do diretor. Até mesmo pelo tom do melodrama, há sempre a possibilidade de pesar demais a mão e cair no piegas, mas tanto diretor quanto ator consegue passar uma verdade que não atravessa a linha. Mesmo em momentos difíceis, como em um reencontro inesperado ou quando tem um embate com sua mãe, há uma doçura e leveza que demonstra um amadurecimento de um homem que já vivenciou muita coisa.
Ao intercalar o Salvador atual, convivendo com dores corporais e da alma, com suas lembranças da infância, o roteiro vai construindo um instigante paralelo entre os sonhos do garoto e as frustrações do homem maduro. Por mais que tenha tido realizações em sua vida, Salvador não parece um homem feliz. Aquela ingenuidade do garoto inteligente e talentoso contrasta com o cineasta cansado e cheio de certezas inúteis que não vê mais motivações na vida.
Salvador parece ter conseguido tudo, mas ao mesmo tempo há um vazio nele que o faz buscar o passado. Talvez por isso busque também experimentar novas sensações como as drogas, em um gesto atabalhoado que pode parecer pouco crível, mas que também acaba sendo banal. E é preciso que o passado retorne para que ele perceba isso, construindo novas camadas para sua trajetória.
A influência da figura materna também tem seu peso. A maneira como Almodóvar traz a figura doce e ao mesmo tempo firme de Penélope Cruz rende sequências de impacto, como ela cantando na beira do rio ou quando arruma a caverna onde a família vai morar. Julieta Serrano repete essa força com ar frágil, em especial a cena do hospital, reforçando ainda mais esse fascínio do filho pela mãe.
Ainda que aparente mais dor que glória, Almodóvar consegue reconectar aqui o que fascina em sua filmografia. Um pulsar entre o sofrimento e a celebração que não se via desde Volver. Mesmo com um protagonista masculino, as mulheres continuam sendo fortes e guiando os passos das personagens seja na figura materna ou na amiga empresária que cuida dele. Ainda assim, há também um interessante resgate do masculino há quem também é permitido errar, sofrer e torna-se encantador.
Dor e Glória (Dolor y gloria, 2019 / Espanha)
Direção: Pedro Almodóvar
Roteiro: Pedro Almodóvar
Com: Antonio Banderas, Penélope Cruz, Asier Etxeandia, Nora Navas, Leonardo Sbaraglia, Julieta Serrano
Duração: 113 min.
Amanda Aouad
Crítica afiliada à Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), é doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas (Poscom / UFBA) e especialista em Cinema pela UCSal. Roteirista profissional desde 2005, é co-criadora do projeto A Guardiã, além da equipe do Núcleo Anima Bahia sendo roteirista de séries como "Turma da Harmonia", "Bill, o Touro" e "Tadinha". É ainda professora dos cursos de Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Unifacs e da Uniceusa. Atualmente, faz parte da diretoria da Abraccine como secretária geral.
Dor e Glória
2019-07-26T12:00:00-03:00
Amanda Aouad
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