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Os homens preferem as loiras. Título do filme dirigido por Howard Hawks em 1953 que marcou a carreira de Marilyn Monroe é mais do que isso. É uma afirmação que perseguiu não só a atriz como diversos ícones femininos da cultura pop recente e das mulheres em geral em um mundo machista em que, como objetos, são treinadas a todo instante a atrair e agradar aos olhos masculinos. 

Mas o que o filme de Andrew Dominik nos mostra é que essa frase está um pouco equivocada. Os homens parecem preferir apenas a si mesmos e seus egos. As mulheres, loiras ou não, são apenas objetos descartáveis do seu prazer imediato. Blonde é, então, uma projeção de quase três horas de tortura e fetichismo que beiram ao sadismo. 

Baseado no livro homônimo de Joyce Carol Oates, não poderíamos dizer que Blonde recria livremente a vida de Norma Jeane Baker. Na verdade, ele recria a vida de Marilyn Monroe, seu nome artístico, já que pouco sabemos da mulher por trás do mito. Ainda que, em muitos momentos, os traumas da pequena Norma estejam em primeiro plano, é um estereótipo, um rascunho construído a partir do que imaginamos daquela mulher. 

A ausência do pai e a busca dele nos homens com os quais se relacionou, a ponto de chamá-los de Dad, pode ter um embasamento psicanalítico, mas parece satisfazer mais à fantasia do homem que da mulher. Fetichismo quase doentio através de muitas cenas dela de topless, frágil, pedindo a proteção daquele homem, sendo subserviente ou simplesmente aguardando o comando para satisfazer seus desejos. A cena com Kennedy, por exemplo, é de extremo mau gosto. 

A relação conturbada com a mãe é outro ponto raso e construído a partir de uma ótica machista. Como se muito do que Marilyn sofreu fosse culpa da criação dessa mãe solo também egoísta que responsabiliza a filha pelo homem que perdeu. A frase dita em frente a um retrato é repetida em diversos momentos da trama, reforçando esse trauma inicial como se buscasse a todo momento esse ponto como justificativa de outras questões à frente. 

Por fim, a culpa da própria Norma em relação à maternidade não concretizada reforça a pressão social de que mulheres devem ser mães, vivem para ser mães, sonham ser mães, são incompletas se não forem mães. Ao escolher a carreira, Marilyn é condenada a ser uma mulher fracassada, isso fora as questões implicadas do ato que nem isso chega a ser aprofundado. Em vez disso, Dominik prefere nos brindar com imagens de um feto em 3D de gosto, no mínimo, duvidoso. 

Se não bastasse tudo isso, a câmera de Dominik não se contenta em testemunhar o sofrimento daquela mulher, ela quer participar dele, explorando o corpo da atriz de maneira invasiva em planos que muitas vezes buscam reforçar a objetificação aparentemente condenada de Hollywood. Mesmo os contrapontos retratando os homens e repórteres que a observam como animais só ajudam a reforçar esse fetichismo, a exemplo da famosa cena do vento do metrô no filme O Pecado Mora ao Lado. 

Ainda assim, temos pontos positivos na obra, como a interpretação visceral de Ana de Armas. A atriz se entrega à persona de Marilyn como se fosse ela própria nos convencendo do seu sofrimento a cada cena. E não é fácil sustentar duas horas e quarenta minutos de sofrimento com pouquíssimos respiros sem soar exagerada ou cansativa. É um destaque que salta aos olhos já sendo uma concorrente a melhor atriz na temporada de premiações. 

A reconstituição de época também é muito bem feita, assim como a proposta estética da obra que ajuda na construção de efeito pretendida. Não por acaso, muitos estão defendendo como uma obra que busca colocar o espectador no lugar da protagonista, sentindo sua angústia. O problema é que ele também nos coloca no lugar do algoz, invadindo e violando corpo e alma daquela mulher, mesmo que involuntariamente.

 

Blonde (2022, EUA)
Direção: Andrew Dominik
Roteiro: Andrew Dominik
Com: Ana das Armas, Adrien Brody, Sara Paxton, Bobby Cannavale, Julianne Nicholson
Duração: 166 min.

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