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Elis e Tom, só tinha de ser com você

Elis e Tom, só tinha de ser com você - filme

Quarenta e cinco anos. Esse é o tempo que separa as imagens filmadas no estúdio em Los Angeles durante a gravação do álbum “Elis e Tom” e a montagem final do documentário dirigido por Roberto de Oliveira. E impressiona o quanto esse distanciamento ajuda na construção de impacto da obra.

Somos transportados para dentro do estúdio como testemunhas oculares de um momento histórico e temos consciência disso. Caso fosse lançado na época seria apenas um olhar curioso de um acontecimento sem dimensões que só o tempo daria. E a maneira como o roteiro vai costurando os depoimentos atuais com aquelas imagens ajuda a ampliar essa percepção.
Elis e Tom, só tinha de ser com você - filme
Talvez o único viés negativo disso seja a insistência em trazer o final trágico de Elis a todo instante. Para chegar à gravação, Roberto de Oliveira faz um retrospecto dos dois nomes da MPB até ali. Nos dá as informações sobre a carreira de Tom e o momento em que se encontra em 1974, não passa adiante demonstrando o que aconteceria depois com o maestro e compositor.

Já com Elis, o roteiro não se limita a traçar a carreira da intérprete até ali. A narrativa ultrapassa o antes, pulando oito anos pra nos mostrar não apenas que ela morre, como longos segundos de um close de seu rosto no caixão. Falar de sua morte em algum momento, como quando fala da pressão pela carreira internacional, era inevitável. Mas ali, naquele instante, não faz sentido. Fora o fato de ser desnecessário mostrar seu corpo sem vida, não acrescenta nada à experiência, fazendo apenas um apelo emocional que poderia ser poupado.

Chama muito mais atenção o fato de que só ali temos a consciência de que, ainda que seja a maior cantora do país, estávamos diante apenas de uma menina de vinte e oito anos. Impressionante como Elis crescia em palco. Como a aura da artista dá a ela uma aparência majestosa e atemporal que não nos permitia perceber o quanto jovem ainda era. As imagens de bastidores, de momentos de ensaio ou de simples intimidade revelavam essa pessoa por trás da artista. Sua expressão corporal e facial mudavam completamente.

Elis e Tom, só tinha de ser com você - filme
O documentário, no entanto, não poupa também a imagem de Tom. Por mais genial e admirado que fosse o compositor, o fato de não ter a direção artística do álbum traz uma personalidade egóica de quem não aceita o novo. A maneira como ele desacredita a capacidade de Cesar Camargo Mariano de assumir os arranjos é constrangedora. As tensões vão se dissipando aos poucos, mas não deixa de ser curioso até pelo fato de o “garoto” que ele está desenhando ser um dos maiores arranjadores que o país já viu e nos dará nos anos seguintes obras-primas como Saudade do Brasil e Falso Brilhante.

O fato é que Elis Regina e Tom Jobim são dois artistas ímpares. E todas aquelas músicas foram alçadas à categoria de obras-primas ao unir canções tão belas com uma interpretação tão intensa, mesmo que em uma roupagem mais intimista do que aquela em que Elis estava acostumada. Dói na alma ouvir músicas como Retrato em Branco e Preto ou Modinha.

Toda a potência desse encontro está sintetizada em Águas de Março, não por acaso abre e fecha o documentário. A maneira como os dois dialogam em cena, a forma como brincam com as palavras e melodia. E ao mesmo tempo como tudo parece também um duelo traduz o encontro. E nos arrebata na emoção das alegrias e das dores da letra que também traduzem um país que está chegando ao fim do caminho, mas mantém promessas de vida em seu coração.


Elis e Tom, só tinha de ser com você (2023 / Brasil)
Direção: Roberto de Oliveira, Jom Tob Azulay
Roteiro: Roberto de Oliveira, Nelson Motta
Duração: 100 min.

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