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Grandes Cenas: Druk - Mais uma Rodada

Grandes Cenas: Druk - Mais uma Rodada - filme

Essa cena é pura vibração dionisíaca, sem efeitos visuais, mas cheia de autenticidade, com Mads Mikkelsen brilhando em sua atuação. Com uma edição técnica afiada e uma trilha sonora otimista, ela fecha o filme Druk - Mais uma Rodada com chave-de-ouro, deixando uma marca emocionante e positiva na mente do espectador. E, é claro, esse texto tem spoilers.

O filme segue a saga de quatro professores, com destaque para Martin, o professor de História, interpretado pelo talentoso Mads Mikkelsen. Todos eles estão numa crise típica dos cinquentões, lidando com problemas conjugais e filhos problemáticos. Então, decidem testar uma teoria maluca que diz que um pouco de álcool no sangue é essencial para manter o bom humor. Ao longo da trama, fica claro que o professor Martin costumava ser um dançarino de primeira, mas teve que parar por causa de dores nas costas.
A cena épica acontece quando, após uma série de altos e baixos emocionais, Martin recebe uma mensagem reconfortante de sua ex-mulher, que o largou por causa de sua depressão, dando-lhe esperança. Com isso, ele decide se entregar à bebida e à dança como um ato de libertação emocional. Essa é a razão pela qual a dança assume um papel tão crucial nessa cena. Os alunos sempre souberam da lenda de que Martin era um dançarino excepcional, e seus amigos o instigavam a mostrar seus passos novamente. E quando finalmente acontece, é simplesmente mágico.

Então, nesta cena de Druk - Mais uma Rodada, somos transportados para a margem do mar durante o dia, onde alunos e professores se reúnem. No centro do grupo, em close, está o professor Martin, vestindo um terno preto e uma camisa preta, enquanto os outros presentes estão vestidos casualmente, todos em tons de branco. Tudo para separar aquele homem do resto das pessoas. Todos estão felizes, menos ele. Ele experimenta uma sensação estranha de ter acabado de carregar o caixão do seu melhor amigo, mas também de quase ter se reconciliado com sua ex-mulher. Algo que ele já julgava impossível. Martin sorri, meio sem graça, meio sem saber se comemora algo ou não, enquanto os alunos comemoram o fim do ano letivo. Para aqueles alunos, então, que passaram nos exames finais e vão para a faculdade, tudo é festa.

Grandes Cenas: Druk - Mais uma Rodada - filme
A cena começa com este close, um plano fechado, no professor enquanto ele dá um gole em um espumante, a câmera está na mão e passeia entre os presentes. Ao longe, fora de foco, alguém chama Martin enquanto ele bebe algo em uma lata, com certeza algo alcóolico, dado ao tema do filme. Martin aponta, sorri e, agora em plano americano, entende a provocação. Seu amigo Peter, que adorava vê-lo dançar quando jovem, pede para que ele mostre um passo de dança. Ao tentar, Peter cai sem jeito no chão. Em plano médio, vemos Martin, que estava em primeiro plano, se aproximando do amigo para ajudá-lo a levantar. Estão bêbados.

Em primeiro e terceiro planos, estão os alunos. É pelas roupas, mas agora também pelo foco, que conseguimos diferenciar os protagonistas da multidão que dança e festeja. A câmera passeia solta entre as pessoas. Em plano americano, Martin mostra como é o passo de dança, mas não vemos seus pés. A curiosidade nos move àquele professor, elogiado durante todo o filme sobre ser um grande dançarino. A câmera então se afasta. Em plano médio vemos Martin e Peter, agora sim vamos poder comprovar sua arte. E é bonito de ver que, agora, a câmera faz um leve contra-plongée. Além de percebermos todas as nuances de seus passos, o professor cresce, é seu momento.

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É um passo perfeito, ele comemora. Abre os braços e caminha até um banco enquanto os garotos, seus ex-alunos, vibram com o inusitado. A câmera passeia entre todos e acompanha Martin. A sensação agridoce volta ao seu semblante. Ele está em uma festa, mas não está completamente ali. Sua mente vagueia para a sua ex-esposa e para seu amigo falecido. Ele aproveita para se sentar e olhar o mar e os barcos, está solitário em meio a tanta gente. A câmera se aproxima dele, acompanha seu divagar, foca o horizonte. Ele respira, como se constatasse quanto a vida é curta e levanta-se do banco onde estava sentado. Mas ele não fica simplesmente em pé, ele sobe no banco e pula sobre ele.

Em seguida, a câmera o enquadra em um plano médio. Martin se dá conta de que não pode mais se conter e a vida sem graça que levava era fruto de sua própria depressão. Onde estava aquele Martin que dançava? Estupefatos e vibrando, os alunos agora estão prestes a conhecer um novo professor. Martin, enfim, se solta, se permite. Enquanto o professor dança ao som da música What a Life da banda Scarlet Pleasure, a câmera se move suavemente ao seu redor, captando seus movimentos e a reação dos presentes.

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O professor gradualmente se entrega ao ritmo e os presentes observam, alguns rindo e outros impressionados. Em um momento de catarse e libertação, Martin bebe o último gole e chuta a lata para longe. Ele não precisa mais de bebida e pode voltar a ser o Martin que se perdeu ao longo do tempo. A câmera, graciosa, acompanha seu ritmo, seus saltos acrobáticos, seus passos de dança cada vez mais extravagantes. Ele salta entre as pessoas, pula no pneu do carro, entre os ferros da carroceria. A montagem só desgruda dele para mostrar a reação dos professores e dos alunos, que vibram e jogam espumante para cima. Martin está finalmente liberto e, não à toa, todos os seus passos tendem ao ar, de braços abertos, como se quisesse voar. E é assim que a cena termina, quando Martin pula em direção ao mar e, tal qual o fim de Thelma & Louise, vemos a imagem estática de um Martin pronto para viver, se entregando à vida com tudo o que ele tem. É uma forma de dar continuidade à cena, de não deixá-la terminar. O resto, fica em nossa imaginação.

Como levantou o professor Pondé, na filosofia de Nietzsche, a dança emerge como uma poderosa metáfora. Nietzsche expressou que só consideraria um Deus digno aquele capaz de dançar. É como se o cosmos executasse uma dança perante o abismo, uma manifestação da vontade de potência. Esta energia que cria e destrói, e somente quando o indivíduo consegue internalizar esse conceito, sem temer, é que se torna capaz de abraçar a vida plenamente. Onde estava a dor nas costas que Martin sentia enquanto ele dançava? É essa a essência desta cena, um momento genuinamente nietzschiano do cinema.

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