Home
critica
documentario
Emily Kassie
Julian Brave NoiseCat
oscar 2025
Sugarcane: Sombras de Um Colégio Interno
Sugarcane: Sombras de Um Colégio Interno
Com a promessa de iluminar um capítulo doloroso da história canadense, Sugarcane: Sombras de um Colégio Interno (2024), surge como um documentário audacioso e verdadeiramente impactante que explora as cicatrizes deixadas por escolas residenciais para indígenas no Canadá. Dirigido por Julian Brave NoiseCat e Emily Kassie, o filme não só retrata a opressão vivida por várias gerações, mas também se transforma em um grito de resistência e de busca por respostas.
Logo nos primeiros momentos do filme, somos confrontados com um tema que muitos tentam evitar: o abuso sistemático causado por instituições supostamente voltadas para a educação e acolhimento. A narrativa gira em torno da St. Joseph’s Mission, onde jovens indígenas eram levados não para receber educação, mas para serem despojados de suas identidades e culturas. A força do relato reside não apenas na evidência dos horrores do passado, mas na empatia com que os diretores abordam os relatos de sobreviventes — muitos dos quais hesitam em relembrar ou simplesmente não conseguem acessar suas memórias.
O documentário respira poesia e dolorosa realidade ao entrelaçar as histórias pessoais dos protagonistas, como o próprio NoiseCat e seu pai, Ed. A relação conturbada entre eles é revelada de forma sensível, permeando o filme com um peso emocional que ecoa com as outras experiências compartilhadas pelos sobreviventes. As entrevistas são poderosas. Foram vidas que, mesmo marcadas pela tragédia, continuam a lutar pela verdade e justiça.
Um aspecto notável é a cinematografia de Christopher LaMarca, que transforma a beleza crua da paisagem canadense em um elo com as histórias contadas. As imagens capturam não apenas a natureza exuberante que é um lar para os indígenas, mas também a sombra das memórias que habitam esse espaço. Apesar do sofrimento evidenciado, há uma beleza intrínseca que transparece, reforçando um tema recorrente: a resiliência da cultura indígena e o amor por sua terra.
Um dos momentos mais marcantes do filme acontece quando Ed NoiseCat relembra a experiência de quase falecimento em sua infância, sendo descartado ao ser colocado em um lixo. Essa cena não apenas ilustra a brutalidade das práticas, é a representação de um trauma vivido por uma geração inteira que foi violentamente despojada de suas identidades. Esse tipo de revelação é o que torna Sugarcane mais do que uma documentação histórica, é um relato visceral que clama por reconhecimento e mudança.
Os diretores, NoiseCat e Kassie, realizaram um trabalho incrível ao dar voz àqueles que muitas vezes são silenciados. Esse filme não é apenas uma janela para o passado, ele também se torna um chamado à ação para a sociedade contemporânea. As dores do passado reverberam no presente e é inegável que Sugarcane nos deixa com mais perguntas do que respostas. O filme, portanto, não só educa, mas provoca reflexão profunda sobre a responsabilidade social e institucional relacionada à cura, justiça e reconciliação.
Sugarcane é uma ode à força e à coragem da comunidade indígena que ainda enfrenta as consequências deste sistema opressivo. Ao abordar essas verdades difíceis, NoiseCat e Kassie não apenas honram aqueles que sofreram, mas também inspiram todos a buscar uma mudança real e necessária. Um filme imprescindível que faz ecoar a necessidade de lembrar para nunca esquecer e, acima de tudo, para permitir que histórias como essas nunca mais se repitam. Um documentário que está destinado a permanecer no coração e na mente de quem se dispuser a assisti-lo.
Sugarcane: Sombras de um Colégio Interno (Sugarcane, 2024 / EUA, Canadá)
Direção: Emily Kassie, Julian Brave NoiseCat
Duração: 107 min.

Ari Cabral
Bacharel em Publicidade e Propaganda, profissional desde 2000, especialista em tratamento de imagem e direção de arte. Com experiência também em redes sociais, edição de vídeo e animação, fez ainda um curso de crítica cinematográfica ministrado por Pablo Villaça. Cinéfilo, aprendeu a ser notívago assistindo TV de madrugada, o único espaço para filmes legendados na TV aberta.
Sugarcane: Sombras de Um Colégio Interno
2025-03-06T08:30:00-03:00
Ari Cabral
critica|documentario|Emily Kassie|Julian Brave NoiseCat|oscar 2025|
Assinar:
Postar comentários (Atom)
cadastre-se
Inscreva seu email aqui e acompanhe
os filmes do cinema com a gente:
os filmes do cinema com a gente:
No Cinema podcast
anteriores deste site
mais lidos do site
-
O período da pandemia do Covid-19 foi mesmo assustador, inclusive para artistas, que ficaram, a maior parte do tempo, impossibilitados de ...
-
O curta-metragem Anuja (2025) é uma dessas obras que nos surpreendem ao tocar em questões profundas com sutileza e sensibilidade. Dirigido ...
-
Filmes de animação com bichos como protagonistas não são novidade. Em especial pets nas situações mais diversas. A relação dos humanos com ...
-
A Baleia (2022), dirigido por Darren Aronofsky , é um filme que se apresenta como um estudo profundo sobre a condição humana, a solidão e ...
-
A cada morte de um papa , o mundo aguarda na praça São Pedro, com olhares ansiosos para a chaminé que lançará uma fumaça preta ou branca ao ...
-
Antes de mais nada, precisamos nos colocar no contexto do terror psicológico e do drama familiar que A Órfã (2009) apresenta. O suspense, ...
-
A arte pode nos salvar. Pode parecer uma frase de efeito, mas é a mais pura verdade. Vide o período da pandemia em que filmes , músicas, liv...
-
Em 1990, Uma Linda Mulher reconfigurou o conto de fadas de Cinderela ao nos apresentar um romance entre uma prostituta e um empresário de ...
-
Wonderland (2024), dirigido por Kim Tae-yong , chegou ao catálogo da Netflix carregado de expectativas. Anunciado anos atrás, seu lançamen...
-
Dogville é uma obra-prima do cineasta dinamarquês Lars von Trier , lançada em 2003, que não só desafia as convenções do cinema tradicional,...